Competência tributária e a sua estrutura normativa

AutorTácio Lacerda Gama
Ocupação do AutorMestre e doutor pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo ? PUC-SP
Páginas559-607
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COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA E A SUA
ESTRUTURA NORMATIVA
Tácio Lacerda Gama1
Nas próximas páginas, responderemos à pergunta
sobre se é possível e útil construir uma norma de compe-
tência tributária.2 Após elucidarmos as acepções adotadas
para os termos “norma” e “competência”, ficará claro que
a proposta é oferecer um modelo lógico-sintático de repre-
sentação das normas,3 que prescrevem como outras nor-
mas devam ser feitas. Para definir o que deve estar conti-
do nesta representação, retomaremos algumas premissas
já expostas noutros trabalhos. A primeira delas é a de que
a unidade do signo é dada pela relação entre significan-
te e significado. Com as devidas alterações, a unidade da
1.
Mestre e doutor pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP.
2. Este tema já foi tratado por nós em outras oportunidades, quando sustenta-
mos a possibilidade de reunir, numa única estrutura normativa, todos os ele-
mentos necessários à regulação da conduta de criar uma norma (Cf. GAMA,
Tácio Lacerda. Contribuição de intervenção no domínio econômico. São Paulo:
Quartier Latin, 2003.). Não mudamos de ideia. Pelo contrário, a experiência ad-
quirida nos últimos anos com a intensa utilização deste instrumento nos evi-
denciou a sua utilidade e operacionalidade.
3.
A possibilidade de representação formal da mensagem normativa foi preconiza-
da, no direito tributário brasileiro, por Paulo de Barros Carvalho (Curso de direito
tributário, p. 245-350), com a concepção da regra-matriz de incidência tributária.
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GREGORIO ROBLES E PAULO DE BARROS CARVALHO
norma de competência deve disciplinar, integralmente, a
conduta de criar outras normas. Outra premissa relevante
é a seguinte: os elementos do sistema de direito positivo são
dotados de heterogeneidade semântica e pragmática, mas
de homogeneidade sintática, pois se organizam segundo a
mesma forma.4 Por fim, relacionaremos sete elementos que
precisam ser, direta ou indiretamente, disciplinados pela
norma de competência, sob pena de essa não prescrever o
mínimo e irredutível de manifestação do deôntico.
Fundados nestes pontos de partida, vejamos como
construir uma estrutura lógica para a norma de competên-
cia tributária.
1. Enunciados, proposições, normas em sentido am-
plo, normas em sentido estrito e normas em sen-
tido completo
Enunciados são porções de texto a partir das quais se
constrói um sentido. Como define Paulo de Barros Car-
valho, os “enunciados” aparecem como “um conjunto de
fonemas ou de grafemas que, obedecendo a regras grama-
ticais de determinado idioma, consubstanciam a mensa-
gem expedida pelo sujeito emissor para ser recebida pelo
destinatário, no contexto da comunicação.”5 Enunciados
prescritivos, por sua vez, são fragmentos do direito positi-
vo, a partir dos quais se constrói o sentido das mensagens
normativas.
4. É precisa a lição de Paulo de Barros Carvalho no sentido de que: “Há
homogeneidade, mas homogeneidade sob o ângulo puramente sintático, uma
vez que nos planos semântico e pragmático o que se dá é um forte grau de
heterogeneidade, único meio de que dispõe o legislador para cobrir a imensa e
variável gama de situações sobre que deve incidir a regulação do direito, na
pluralidade extensiva e intensiva do real-social.” O direito positivo como siste-
ma homogêneo de enunciados deônticos, p. 35-36.
5. Direito Tributário – fundamentos jurídicos da incidência, p. 20.
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TEORIA COMUNICACIONAL DO DIREITO
Quando deixamos a objetividade dos textos e passa-
mos à subjetividade do intérprete que constrói a mensa-
gem, transitamos do plano dos enunciados ao das propo-
sições. Se os enunciados eram jurídicos, as proposições
construídas a partir deles serão prescritivas de conduta.
Numa definição: a proposição prescritiva é o sentido cons-
truído a partir dos enunciados prescritivos.6
Nem sempre, porém, podemos equiparar o conceito
de “proposição prescritiva” com o conceito de “norma jurí-
dica”. Isso porque “norma jurídica” é conceito polissêmico,
que, por isso mesmo, pode ser aplicado em diversas cir-
cunstâncias, com diferentes acepções.
Fixemos, para os fins deste trabalho, três acepções
fundamentais: norma em sentido amplo, norma em sentido
estrito e norma em sentido completo.
Norma jurídica em sentido amplo é sinônimo de pro-
posição prescritiva. A simples indicação de uma alíquota, a
qualificação de um sujeito passivo ou ativo, a prescrição de
uma imunidade, de um princípio são, todos elas, exemplos
de proposições ou normas jurídicas em sentido amplo.
Muito embora esteja próxima do senso comum, essa
ideia de “norma” é vaga e, por isso, enseja imprecisão. Ve-
jamos, por exemplo, uma norma em sentido amplo que
estabeleça “a alíquota do tributo é de 10%”. De imediato
se questionaria: que tributo? Deve ser aplicada sobre que
base de cálculo? O que torna o tributo devido? Onde e
quando esse fato pode ocorrer? Quem deve pagar e quem
deve receber? Entre outras questões igualmente possíveis.
Toda essa sorte de dúvidas evidencia a necessidade de um
6.
Já as “proposições” são os conteúdos, as significações, que o contato com os
enunciados provoca no sujeito da comunicação. Como salienta Paulo de Barros
Carvalho, um único enunciado pode provocar a construção de diversas proposi-
ções, da mesma forma que uma proposição pode ser construída a partir de enun-
ciados diversos. Direito Tributário – fundamentos jurídicos da incidência, p. 20.

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