Controle nos contratos administrativos à luz do Decreto-Lei 4.657/1942 - LINDB

AutorCristiane Pereira Correia Rêgo
Páginas143-174
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CONTROLE NOS CONTRATOS ADMINISTRATIVOS À LUZ
DO DECRETO-LEI 4.657/1942 LINDB
Cristiane Pereir a Correia Rêgo1
1. Introdução
O artigo discorre sobre o exercício da atividade de controle da
atividade administrativa contratual sob a égide da Lei 14.133/2018 à luz
dos dez artigos introduzidos pela Lei 13.655/2018 no Decreto-lei
4.657/1942 LINDB.
O objetivo foi traçar e analisar a nova estrutura do exercício das
atividades de controle na Nova Lei de Licitações introduzida pelas
inovações da Lei 13.655/2018 para delinear o campo de incidência do
controle interno e externo das atividades administrativas.
O primeiro tópico trata das inovações trazidas pela Lei
13.655/2018 ao Direito Público Brasileiro tais como a responsabilidade
pessoal do agente nos casos de dolo ou erro grosseiro, a vedação de
decisões fundamentadas em valores jurídicos abstratos, o
consequencialismo e o pragmatismo jurídico, a consensualidade
administrativa, dentre outras. O segundo tópico traz o desenho
constitucional do controle interno e externo da atividade administrativa
bem como uma leitura geral sobre o controle das contratações públicas
na Nova Lei de Licitações, Lei 14.133/2021. No último tópico, o artigo
versa sobre o controle nos contratos administrativos à luz da LINBD
cujo núcleo central é a motivação valorativa introduzida pela Lei
13.655/2018. Por fim, o artigo levanta dúvidas sobre a possibilidade da
diretriz objetiva, controle prévio, concomitante e posterior, interferir na
esfera de discricionariedade administrativa e violar o checks a nd
1 Advogada, especialista em Direito Público e Direito Constitucional Aplicado pela
Faculdade Legale, membro do Centro para Estudos Empírico-Jurídicos (CEEJ/UFF) e do
Grupo de Pesquisa, Ensino e Extensão em Direito Administrativo Contemporâneo (GDAC)
e pesquisadora do GLP Grupo de Pesquisa sobre Licitações e Contratos da UCAM/RJ.
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balances estabelecido na Constituição de 1988.
2. As inovações da Lei 13.655/2018 no Direito Público
Brasileiro
A Lei 13.655/2018 foi promulgada para promover a segurança
jurídica ao inserir a estabilidade, a previsibilidade e a proporcionalidade
em uma lei que tem por objetivo interpretar outras leis do Ordenamento
Jurídico Brasileiro. O propósito do legislador foi oxigenar o problema
de interpretação do século passado em vista da contemporaneidade do
Direito2 diante de um cenário de incertezas e de mudanças permanentes
no Direito Público.
2 [...] Mas seu conteúdo seguiu restrito aos problemas do século passado. O Direito hoje,
porém, é bastante diferente. Três fatores ressaltam. A legalidade contemporânea vai muito
além da lei em sentido estrito. Hoje, convivemos com a pluralidade de fontes normativas
(leis, decretos, resoluções, portarias e com o próprio viés no rmativo que passou a ser
conferido à Constituição), sendo mais correto se falar em um ‘Bloco de Legalidade’, ou no
que se denomina de ‘Juridicidade’”. (MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Curso de
direito administrativo: p arte introdutória, p arte geral e parte especial, p. 85 ap ud
MARQUES NETO, Floriano de Azevedo; FREITAS, Rafael Veras de. Comentários `a Lei
13.665/2018 (Lei de Segurança Naciona l para Inovaçã o Pública). Belo Horizonte: Fórum
2019, p. 7-8). É dizer, se, outrora, predicava-se, tão somente, da análise da observância dos
quadrantes da legalidade simples (que traz limites para as atividades privadas) e da
legalidade qualificada (que guia o atuar da Administração Pública), atualmente, o espectro
de controle da conformidade normativa espraia sua incidência para todo o conjunto
normativo (tendo como diretriz orientadora a Constituição). As normas vinculantes são
muito mais diversas do que a lei estrita.” [...] “Temos normas editadas no âmbito de
subsistemas jurídicos e que ora preenchem de conteúdo molduras definidas por leis-quadro;
(GRAU, Eros. O dir eito posto e o direito pressuposto. 8ª ed. São Paulo: Malheiros, 2011,
p. 247; SUNDFELD, Carlos Ari. Dir eito administrativo para céticos. 2ª ed. São Paulo:
Malheiros, 2014, p. 267 e seguintes apud MARQUES NETO, Floriano de Azevedo;
FREITAS, Rafael Veras de. Comentár ios `a Lei 13.665/2018 (Lei de Segurança Nacional
para Inovação Púb lica) 2ª reimp. Belo Horizonte: Fórum 2019, p. 8) normas editadas no
âmbito do processo de deslegalização (como ocorre, por exemplo, com as agências
reguladoras) ou ainda normas de concretização editadas no âmbito de núcleos de
competência normativa reservada, como ocorre com a Receita Federal. [...] A lei passa não
mais a limitar, a fixar competências e a prescrever m eios para atingir finalidades públicas.
Ela passa a ir um pouco mais além, a incorporar bases, normas gerais, normas objetivas,
dentro da ordem jurídica entendida não apenas como legislação ordinária, mas também
como base constitucional. [...] é pontuada por termos técnicos e em grande medida
impregnada de conceitos indeterminados, de forte conotação axiológica. [...] O terceir o
fator é a multiplicaçã o de polos legitimados para aplicar o Direito. MARQUES NETO,
Floriano de Azevedo; FREITAS, Rafael Veras de. Comentários `a Lei 13.665/2018 (Lei de
Segurança Naciona l para Inovação Pública). Belo Horizonte: Fórum 2019, p. 11.
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A proporcionalidade foi consagrada nos arts. 20, 21 e 22,
enquanto a estabilidade e a previsibilidade foram normatizadas nos arts.
23, 24 e 30 da Lei 13.655/2018. A estabilidade e a previsibilidade
obrigam as autoridades públicas o dever: (1) de prever regime de
transição ao estabelecer interpretação ou orientação nova sobre norma
de conteúdo indeterminado3; (2) de não aplicar nova interpretação ou
orientação a atos jurídicos perfeitos, princípio da irretroatividade4; e (3)
de editar precedentes administrativos vinculantes.5 a
3 “Três ordens de qualificantes estão contidas no preceito: (i) a decisão deve inovar
entendimento; (ii) deve se tratar de decisão que interpreta outra norma de conteúdo
indeterminado; e (iii) qu e ao dar esta hermenêutica inaugura uma nova obrigação ou
condicionamento.” Mais adiante, Floriano de Azevedo prevê que o art. 23 impõe um dever-
poder de previsão de um regime de transição quando (i) modula temporalmente a eficácia
da nova interpretação; e (ii) distribui os ônus e consequências dela derivados dentro de
critérios de proporcionalidade.” Sendo indispensável “que a nova interpretação nova
garanta aos destinatários que seus efeitos recaiam de modo (i) proporcional; (ii) equânime;
e (iii) que não comprometa os interesses gerais perseguidos pelo decisor.” MARQUES
NETO, Floriano de Azevedo. Art. 23 da LINDB O equilíbr io entre mudança e
previsibilidade na hermenêutica jurídica. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro,
Edição Especial: Direito Público na Lei de Introdução às Normas de Direito Brasileiro
LINDB (Lei nº 13.655/2018), p. 103-107, nov. 2018.
4 “A regra, em suma, impede que seja decretada a invalidade de deliberação administrativo
que tenha sido tomada com base na interpretação geral vigente à época da produção do ato.
A nova lei determinou que o entendimento sobre a correta interpretação do Direito vigente
pode mudar, mas eventual nova leitura não poderá ser usada como referência para anular
decisões administrativas já consolidadas.” CÂMARA, Jacinto Arruda. Art. 24 da LINDB
Irretr oatividade de nova or ientação gera l para anular deliberações ad ministrativas.
Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, Edição Especial: Direito Público na Lei
de Introdução às Normas de Direito Brasileiro LINDB (Lei nº 13.655/2018), p. 116, nov.
2018.
5 “Ao tratar do dever de instauração e autovinculação administrativa quanto a regulamentos,
súmulas administrativas e respostas a consulta, o art. 30 da LINDB traz dois
desdobramentos. Primeiro é a institucionalização do efetivo respeito a tais decisões, seja na
dimensão horizontal (o próprio órgão ou entidade) quanto na vertical (todos aqueles que se
encontram abaixo n a estrutura hierárquica), técnica que tem por objetivo afastar
interferências externas no tratamento de casos semelhantes, de modo a tratar todas as
pessoas de forma igualitária perante o Direito, com a formação e desenvolvimento de uma
ordem jurídica estável e previsível. O segundo diz respeito à estabilização das decisões. Isso
porque a aceitabilidade e o efetivo cumprimento das decisões de Direito Público por
terceiros dependem muito da reputação (interna e externa), sejam elas advindas do Poder
Judiciário, das Cortes de Contas ou a própria Administração Pública.” MOREIRA, Egon
Bockmann; PEREIRA, Paula Pessoa. Art. 30 da LINDB O dever público de incr ementar
a segur ança jurídica . Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, Edição Especial:
Direito Público na Lei de Introdução às Normas de Direito Brasileiro LINDB (Lei nº
13.655/2018), p. 247, nov. 2018.

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