Estado democrático de direito

AutorPedro H. C. Fonseca
Páginas7-30
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ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO
A Constituição da República, no título I, “princípios fundamentais”, art. 1º,
prescreve que a República Federativa do Brasil é formada pela união indissolúvel dos
Estados, Municípios e do Distrito Federal, constituindo-se em Estado Democrático de
Direito, além de determinar que todo o poder emana do povo. O paradigma do Estado
Constitucional ou Estado Democrático de Direito se faz presente diante da submissão do
próprio Estado às regras constitucionais, devendo estas serem respeitadas pelo Estado
e pelo povo. A Constituição da República encontra-se no centro do sistema legal, como
norma determinante e que ilumina toda a organização estatal.
O termo “paradigma” faz referência a um modelo estrutural de um tempo e lugar,
em que há consenso quanto a teorias e modelos de compreensão de algo. O paradigma no
Direito leva ao entendimento de como que a comunidade jurídica se identif‌ica e de quais
regras e princípios estruturais de uma ordem jurídica são entendidos como adequados.
Importa apontar a observação do Estado1 como estrutura de poder organizado,
estabilizando uma identidade politicamente enquadrada de acordo com específ‌ica
concepção social. A partir daí, é possível idealizar a necessidade do Estado na condição
de poder de organização para a devida implementação dos direitos necessários e vitais
de uma sociedade.
O Estado2 representa um molde histórico de estrutura jurídica de poder com
qualidades específ‌icas para atender aos integrantes de determinado território. Além
de o Estado servir para a construção da organização social, é considerado estrutura de
formação jurídica, em relação à qual, no Estado Democrático de Direito, vigora a sub-
missão às regras legais e constitucionais.
Diante da análise do paradigma3 pré-moderno, na Antiguidade e na Idade Média,
o Direito era baseado em regras religiosas, com profunda atenção à moral e aos costu-
mes, além de ser dirigido a um pequeno grupo ou mesmo a apenas um indivíduo, sem
caráter de generalidade.
Diante do paradigma4 do Estado Liberal, verif‌ica-se, dentre outras características,
uma intervenção mais distante e menor do Estado no âmbito das relações privadas,
1. HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade. Trad. Flávio Beno Siebeneichler. Rio de
Janeiro: Tempo Brasileiro, 1997. p. 169. v.1-2.
2. CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da Constituição. 3. ed. Coimbra: Almedina,
1999. p. 168;170.
3. CARVALHO NETTO, Menelick de. Requisitos paradigmáticos da interpretação jurídica sob o paradigma do
Estado Democrático de Direito. Revista de Direito Comparado, Belo Horizonte, v. 3, p. 473;486,1999.
4. BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. São Paulo: Malheiros, 2001. p. 524-525.
DIREITO PENAL & AÇÃO SIGNIFICATIVA • PEDRO H. C. FONSECA
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signif‌icando que o indivíduo pertencente a um corpo social poderia agir livremente,
desde que não violasse a legislação vigente. Além da atenção aos direitos fundamentais
individuais limitadores da atuação do Estado, importa frisar a separação dos poderes,
de modo que um poder passou a limitar o poder do outro.
Diante da menor intervenção possível do Estado Liberal, havendo, por consequ-
ência, acumulação de riqueza para poucos indivíduos, veio surgir o Estado Social, para
atender às demandas sociais, como direito à saúde, educação, trabalho e outros que
se identif‌icam com a massa humana. Diante disso, o Estado deixou de ser neutro para
se tornar interventivo, com o dever transformador social e promovente do bem-estar
econômico, garantindo serviços públicos a todas as pessoas. Ocorre a busca da transfor-
mação da realidade social, reforçando e def‌inindo os direitos individuais identif‌icados
no Estado Liberal e atendendo a uma nova linha de direitos, os sociais e coletivos de
segunda geração. O Estado Social foi importante para servir de apoio para o Estado
Democrático de Direito.
No Estado de Direito, ocorre a conformação do exercício do poder a uma ordem
jurídica pré-estabelecida. Existe uma ordem jurídica relativamente centralizada que
coloca a jurisdição e a administração vinculadas às normas estabelecidas por represen-
tantes do povo, após adoção da regra de que o Estado está vinculado ao ordenamento
jurídico constitucional. Diante de uma estrutura constitucional, o Estado deve obedecer
e atuar nos moldes das leis aprovadas pelos representantes do povo. Vigora, no Estado
de Direito, o império da lei, por meio do qual, o povo e o próprio Estado f‌icam adstritos
aos limites impostos pelas regras legais, criadas pelos agentes políticos constitucional-
mente constituídos para tal f‌im.
A comunidade política do Estado é integrada por pessoas dotadas de direitos
prescritos nas leis e na Constituição da República, sendo que esses direitos podem ser
invocados em face de outras pessoas ou em face do próprio Estado, devendo prevalecer
o que for determinado pela norma. Havendo violação do pacto normativo, poderão, os
indivíduos que compõem a comunidade jurídica, recorrer ao poder julgador para fazer
prevalecer o conteúdo da norma violada, em favor daquele que teve o seu direito violado.
É importante considerar que a democracia signif‌ica mais do que uma forma de
Estado, representando um princípio constitucional que gera legitimação do exercício
do poder com origem no povo. O Estado Democrático de Direito é conf‌igurado pelo
resultado da conexão entre o princípio da democracia e o Estado de Direito, de modo
que dá relevância à inserção da regra constitucional à comunidade jurídica e todos
aqueles inseridos nela. Havendo a agregação do princípio democrático com o Estado de
Direito, considerando que este determina submissão de todos à norma jurídica, diante
da Constituição da República, há determinação para conformar as atividades do Estado
à regra constitucional, e por consequência, ocorre limitação do seu poder.
A idealização do Estado Democrático de Direito é centralizada em dois pontos
fundamentais, no sentido de que o Estado é limitado pelo Direito, e o poder político é
legitimado pelo povo. A democracia tem relação com a fonte de legitimação do poder,
originado constitucionalmente do povo, formando o lado democrático do Estado de

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