Desafios na Gestão Ambiental de Empreendimentos Lineares de Transporte: Atribuição ao Licenciamento, Interferência de Entes Municipais e Gestão de Passivos Históricos

AutorLuciana Gil Ferreira e Patrícia Mendanha Dias
Ocupação do AutorGraduada pela Universidade Presbiteriana Mackenzie/Mestranda pelo programa de Mestrado
Páginas249-282
Desafios na Gestão Ambiental de
Empreendimentos Lineares de Transporte:
Atribuição ao Licenciamento,
Interferência de Entes Municipais
e Gestão de Passivos Históricos
Luciana Gil Ferreira1
Patrícia Mendanha Dias2
1 Graduada pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, especialista em Di-
reito Ambiental pela PUC-SP, colaboradora da Comissão de Meio Ambien-
te da OAB/RJ e membro da diretoria da União Brasileira de Advocacia
Ambiental (UBAA). Acumula experiência na área ambiental prestando
consultoria jurídica especializada nos diversos segmentos de infraestrutura
em geral, além de atender empresas dos mais diversos segmentos em todo
o Brasil. Coautora das obras Getting the Deal Through: Environment in 22
jurisdictions worldwide, 2013, Aspectos jurídicos dos contratos de seguro ano II
e III: (im)previsibilidade do risco ambiental, 2013, e O pool de cosseguro no
âmbito dos riscos ambientais: advertências e vantagens, 2015, Direito ambiental
e os 30 anos da Constituição de 1988, 2018, e autora de diversos artigos publi-
cados na imprensa brasileira.
2 Mestranda pelo programa de Mestrado Profissional em Engenharia Am-
biental e Urbanística da PUC-Rio. Especialista em Direito Processual
pelo programa de pós-graduação lato sensu da Pontifícia Universidade
Católica de Minas Gerais. Aperfeiçoamento em Direito Minerário e em
Direito Ambiental pelo Centro de Direito Internacional (CEDIN). Coau-
tora das obras Direito ambiental e os 30 anos da Constituição de 1988, 2018,
Direito da mineração: questões ambientais, minerárias e tributárias, 2017, e
autora de diversos artigos na área de Direito Ambiental e Processual.
Advogada no Departamento de Direito Ambiental no escritório Bichara
Advogados.
Prática do Direito Ambiental na Defesa dos Interesses de Empresas Privadas250
1. Introdução
Os empreendimentos lineares de transporte no Brasil, em espe-
cial ferrovias e rodovias, na sua maioria, foram inaugurados e desen-
volvidos por obras e gestão estatal há muitos anos e, acompanhando o
crescimento econômico do país, foram posteriormente concedidos para
gestão privada. Os sistemas lineares de transportes compreendem ma-
lhas de longa extensão, conectando polos ou estações, que podem atra-
vessar diferentes estados e dezenas ou centenas de municípios, com
suas respectivas particularidades e implicações econômicas, ambien-
tais e sociais.
Por tudo isso, esses empreendimentos envolvem um alto nível
de exposição, tanto do ponto de vista físico, em razão de sua extensão,
risco e impacto, quanto normativo, em razão da diversidade de ór-
gãos reguladores e exigências que se sobrepõem em todos os níveis,
em especial municipal – tornando a sua gestão ambiental de extrema
complexidade.
Além da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT)3,
no campo de atuação ambiental, são diversos entes que podem intervir
nas atividades, o órgão licenciador em si e demais intervenientes e in-
terventores que tenham relação com o empreendimento. Só em âmbito
federal, cite-se: os gestores de áreas protegidas (Unidades de Conserva-
ção – ICMBio), de bens históricos ou culturais acautelados (IPHAN),
além de FUNAI, Fundação Palmares, entre outros federais, estaduais e
municipais aplicáveis, a depender da zona de interferência do sistema.
Vale dizer ainda que, sendo concessões públicas, passam a ser
herdeiros das atividades exercidas pelo Estado, assumindo a “herança”
dos passivos ambientais gerados pelas gestões anteriores.
3 É o que ocorre, por exemplo, no âmbito da regulação de transportes aqua-
viários e terrestres, em que a Lei n. 10.233/2011, que reestruturou essas
modalidades de transporte no Brasil e criou ANTT, dispõe sobre as atri-
buições da Agência e lhe concede poder de regular, supervisionar e editar
normas técnicas complementares aplicáveis às atividades ferroviárias e
rodoviárias.
251Desafios na Gestão Ambiental de Empreendimentos Lineares de Transporte
Nesse contexto, objetiva-se demonstrar, com maiores detalhes e
à luz dos entendimentos jurisprudenciais mais recentes sobre o tema,
como decorrem os conflitos e discussões ambientais na condução des-
ses empreendimentos, diante dos diversos entes federativos envolvi-
dos, bem como das sobreposições de ordenamentos jurídicos nas dife-
rentes esferas que muitas vezes se contrapõem, com obrigações
divergentes e conflitantes.
2. Competência de licenciamento ambiental de
empreendimentos lineares
A competência para o licenciamento ambiental foi conferida pela
Constituição da República de 1988 (CR/88) para todos os entes federa-
tivos, União, Estados, Distrito Federal e Municípios4 (competência co-
mum), a ser exercida por meio dos órgãos de controle integrantes do
Sistema Nacional do Meio Ambiente (SISNAMA), sendo que Lei Com-
plementar estabeleceria normas para a cooperação entre eles5.
Transcorridos mais de 13 anos da promulgação constitucional, ad-
veio6 a Lei Complementar n. 140/2011 (LC n. 140) com objetivo de esta-
belecer atribuições e limites de atuação dos entes federativos no exercí-
cio da competência comum à fiscalização e ao licenciamento ambiental.
4 A Constituição da República (CR) prevê no art. 23, VI e V, que compete à
União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios a proteção do
meio ambiente, combate à poluição em qualquer de suas formas e a pre-
servação das florestas, fauna e flora. Trata-se da competência comum para
o exercício da fiscalização de atividades potencialmente poluidoras ou
utilizadoras de recursos naturais e, consequentemente, da promoção do
licenciamento ambiental.
5 Art. 23, VI e parágrafo único, da CR/88. É competência comum da União,
dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios: (...) VI – proteger o meio
ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas; (...) Parágrafo
único. Leis complementares fixarão normas para a cooperação entre a
União e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, tendo em vista o
equilíbrio do desenvolvimento e do bem-estar em âmbito nacional.”
6 Nesse período o processo de licenciamento e competências foi regido pela
Resolução CONAMA 237/1997.

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