Falência do modelo de perícia médica na previdência social: importância do meio ambiente do trabalho na definição da capacidade laborativa

AutorJoão Baptista Opitz Neto - João Baptista Opitz Junior
Páginas28-37

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João Baptista Opitz Junior13

Este é o cenário da Perícia Médica no Instituto Nacional do Seguro Social (INSS): insatisfação de todos! E esta insatisfação implica numa grande demanda de ações judiciais contra o INSS discutindo os resultados das perícias médicas que são realizadas pela Autarquia.

Inclusive, recentemente, foram realizadas revisões de benefícios previdenciários por incapacidade, sendo divulgado na grande mídia que mais de 70% das revisões resultaram em altas previdenciárias.

Certamente, algo está errado, uma vez que este percentual é muito alto. Apenas duas conclusões são possíveis:

  1. havia muitos segurados em benefício de forma indevida e o sistema é falho em reconhecer esta situação;

  2. muitos segurados tiveram alta mesmo estando incapacitados para o trabalho, o que também é uma falha do sistema atual.

Em qualquer hipótese, a falência do modelo atual de Perícia Médica é inquestionável.

Sempre fica a pergunta: de quem é a culpa?

Neste caso, entendemos que não há um culpado, mas sim um sistema que está calcado em um modelo que não contempla os anseios da sociedade e o conhecimento médico atual.

1. Perícia médica

A Perícia Médica é afeta à Medicina e ao Direito, uma vez que é a utilização dos conhecimentos médicos a serviço do Direito.

Tem por função esclarecer fatos médicos controversos para que o Direito possa ser aplicado no caso concreto.

Quando estamos tratando da Perícia Médica na esfera previdenciária, são diversos benefícios que dependem da interpretação de fatos médicos, em especial aqueles relacionados à capacidade laborativa.

Para que o segurado faça jus ao benefício pretendido, quando previsto em lei, deverá passar em avaliação médica a cargo da Perícia Médica do INSS.

O perito deve montar o seu laudo perícial de forma que o mesmo contenha a completa elucidação dos fatos médicos.

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Um laudo perícial, criado a partir do conhecimento técnico-científico, é capaz de combater o "Achismo Jurídico", promovendo assim o que se conhece como Segurança Jurídica, tirando espaço de perícias frágeis e inexatas, que poderiam prejudicar a aplicação do direito ao caso concreto.

0 INSS possui modelo próprio de Laudo Perícial, porém, este modelo mostra-se insuficiente para que a perícia médica administrativa possibilite uma maior compreensão dos motivos e da fundamentação utilizada pelo perito médico em sua conclusão.

Entendemos que uma melhor fundamentação das conclusões períciais possibilitaria aos segurados entenderem o motivo pelo qual teve parecer contrário ou favorável ao seu pleito na esfera administrativa, além de facilitar o direito garantido ao encaminhamento de recurso contra a decisão perícial.

Não há como se apresentar um recurso eficaz se não se tem ciência exata do motivo pelo qual o benefício foi negado.

Somado a isto, uma correta fundamentação permite que, caso a questão seja judicializada, o magistrado possa fazer uma melhor cognição do caso e as partes exercerem o contraditório.

É justamente esta a função da Perícia Médica, ou seja a elucidação de fatos médicos a leigos na matéria médica.

Neste sentido, o artigo 473 do CPC/15 pode ser utilizado como um norte também para as perícias médicas administrativas, uma vez que impõe ao perito itens obrigatórios que garantem uma maior qualidade para as Perícias Médicas Administrativas, evitando conclusões baseadas em achismo ou opinião pessoal.

Verifica-se no artigo 473 do CPC/15: Art. 473. O laudo perícial deverá conter:

1 - a exposição do objeto da perícia;

II - a análise técnica ou científica realizada pelo perito;

III - a indicação do método utilizado, esclarecendo-o e demonstrando ser predominantemente aceito pelos especialistas da área do conhecimento da qual se originou;

IV - resposta conclusiva a todos os quesitos apresentados pelo juiz, pelas partes e pelo órgão do Ministério Público.

§ 1º No laudo, o perito deve apresentar sua fundamentação em linguagem simples e com coerência lógica, indicando como alcançou suas conclusões.

§ 2º É vedado ao perito ultrapassar os limites de sua designação, bem como emitir opiniões pessoais que excedam o exame técnico ou científico do objeto da perícia.

§ 3º Para o desempenho de sua função, o perito e os assistentes técnicos podem valer-se de todos os meios necessários, ouvindo testemunhas, obtendo informações, solicitando documentos que estejam em poder da parte, de terceiros ou em repartições públicas, bem como instruir o laudo com planilhas, mapas, plantas, desenhos, fotografias ou outros elementos necessários ao esclarecimento do objeto da perícia.(grifos nossos)

Cumpre-nos destacar que o CPC deve ser utilizado supletiva e subsidiariamente no processo administrativo, quando ausentes normas que o regulem, conforme artigo 15 do referido diploma legal.

Portanto, em matéria de Perícia Médica, entendemos ser totalmente aplicáveis as disposições emanadas do artigo 473 do CPC, ante a ausência de regulamentação na legislação previdenciária.

O artigo 473 do CPC estabelece que o perito deve indicar como chegou a sua conclusão, deixando claro qual a metodologia utilizada em seu trabalho.

Trata-se de uma garantia de que a ciência médica está sendo utilizada para o perito médico chegar a sua conclusão, indicando, assim, a imparcialidade do perito.

A ciência se contrapõe ao achismo, tudo o que mais se deve evitar em matéria perícial.

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Para Marioni (2000)14, trata-se de um direito das partes o perito imparcial, devendo o perito judicial ser técnica e moralmente idóneo para que a Administração possa conceder ou não um benefício, e para que o segurado seja atendido em sua verdadeira garantia de justiça de ver o seu pleito atendido com base na legislação e na literatura médica.

Segundo conceito de Fernando Capez (2007), pode-se definir Perícia da seguinte forma:

O termo 'perícia', originário do latim peritia (habilidade especial), é um meio de prova que consiste em um exame elaborado por pessoa, em regra profissional, dotada de formação e conhecimentos técnicos específicos, acerca de fatos necessários ao deslinde da causa.

Trata-se de um juízo de valoração científica, artística, contábil avaliatório ou técnico, exercido por especialista, com o propósito de prestar auxílio ao magistrado em questões fora de sua área de conhecimento profissional.15

A perícia constitui-se numa forma de provar, por meio da qual pessoas especialmente capacitadas, em decorrência dos conhecimentos técnicos e científicos que possuem, a respeito de ocorrência de determinados fatos, bem como do significado dos mesmos.

Na concessão ou não de benefícios por incapacidade pelo INSS, a Perícia Médica tem relevante destaque, uma vez que a comprovação da incapacidade laborativa é um dos pré-re-quisitos para a Administração conceder o benefício pleiteado.

E, partindo do princípio de que a definição da capacidade laborativa passa pela avaliação da doença do segurado, como também de seu meio ambiente de trabalho, a adoção de critérios técnicos claros, como determina o artigo 473 do CPC, traria um grande salto na qualidade das perícias médicas administrativas.

Um critério único e definido de avaliação, com metodologia clara e fundamentada na ciência médica, diminui a chance de que um mesmo caso avaliado por peritos diferentes tenha conclusões distintas.

Não que peritos chegarem a conclusões diferentes esteja errado ou que exista alguma infringência ética ou legal...

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