A Homoafetividade Em Portugal

AutorMaria Berenice Dias/Marianna Chaves
Ocupação do AutorPresidente da Comissão Especial de Diversidade Sexual do Conselho Federal da OAB/Doutoranda em Direito Civil pela Universidade de Coimbra. Mestre em Ciências Jurídicas pela Universidade de Lisboa
Páginas21-37
a HomoafEtividadE Em portugal
Maria Berenice Dias*
Marianna Chaves**
introdução
As uniões de pessoas do mesmo sexo existem desde os tempos mais
remotos, mas a partir do momento em que a Igreja sacralizou o conceito
de família, conferindo-lhe nalidade meramente procriativa, as relações
entre iguais se tornaram alvo do preconceito e do repúdio social. A mais
nefasta consequência da exclusão no âmbito jurídico é a absoluta invisi-
bilidade a que são, muitas vezes, condenados os vínculos afetivos cujo
único diferencial decorre do fato de serem constituídos por pessoas de
igual sexo.
Mas as lutas emancipatórias, o orescer dos direitos humanos e a laici-
zação dos Estados estão forjando a construção de novas sociedades mundo
afora, reconhecendo que as uniões entre pessoas, independente de sua orien-
tação sexual, é uma união de afetos e, como tal, precisam ser identicadas.
Daí a expressão homoafetividade.
Assim, pode-se dizer que o estudo e o reconhecimento das uniões ho-
moafetivas e dos direitos delas decorrentes passaram a constar na agenda
jurídica mundial, em especial no mundo ocidental. Aos poucos, o dito mun-
do civilizado vem acordando, transformando em realidade o que há muito
* Presidente da Comissão Especial de Diversidade Sexual do Conselho Federal da OAB.
Vice-Presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM. Desembargadora
aposentada do TJRS. Mestre em Direito Processual Civil pela PUC – RS. Advogada. Ende-
reço eletrônico: .
** Doutoranda em Direito Civil pela Universidade de Coimbra. Mestre em Ciências Jurídicas
pela Universidade de Lisboa. Vice-Presidente da Comissão de Diversidade Sexual e Direito
Homoafetivo da OAB-PB. Diretora de Relações Internacionais do IBDFAM-PB. Advoga-
da. Endereço eletrônico: .
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22
parte i
ensaios em afetividade no direito das famílias
proclamava a Revolução Francesa: o direito à liberdade e à igualdade, com
a edição de normas asseguradoras dos direitos civis dos indivíduos e casais
homossexuais.
Portugal, acompanhando os passos da Europa Ocidental, vem avan-
çando no âmbito da homoafetividade nos últimos anos. Sua legislação, entre-
tanto, ainda está aquém do esperado em comparação com países próximos,
como Espanha, França e Bélgica – e muitas vezes em contradição ao dis-
posto na Constituição da República Portuguesa. A ideia do presente artigo é
fazer uma breve análise da situação da homoafetividade em Portugal, abor-
dando as questões do casamento civil, das uniões de facto (nome dado em
Portugal às uniões que no Brasil se denominam uniões estáveis), da adoção e
da coadoção e da procriação medicamente assistida, quando estão em causa
pares do mesmo sexo.
1. brEvEs notas sobrE a família Em portugal E na Europa
Nos tempos antigos, a família era uma instituição que possuía, basi-
camente, fundamentos religiosos e políticos, na qual sobressaía a autoric-
tas do chefe familiar, que a representava como um todo componente da
sociedade1.
Atualmente, ela é vislumbrada como o resultado de uma conexão
afetiva, na qual se edicam os sentimentos de solidariedade, lealdade,
respeito, conança e cooperação. É uma entidade além de jurídica, éti-
ca e moral. É concebida como um agrupamento de afeto e entreajuda,
em que o que mais releva é a intensidade das relações pessoais de seus
componentes2.
Compreendida como “núcleo de oxigenação do equilíbrio emocio-
nal dos indivíduos e de socialização das crianças e jovens”3, a família é a
1 PEREIRA, Áurea Pimentel. A nova Constituição e o direito de família. Rio de Janeiro:
Renovar, 1990, p. 25.
2 MUNIZ, Francisco José Ferreira; OLIVEIRA, José Lamartine Corrêa de. Curso de direi-
to de família. 3. ed. Curitiba: Juruá, 1999, p. 13.
3 GOMES, Carla Amado. “Direito das famílias na jurisprudência portuguesa: liação, adop-
ção e protecção de menores”. In: TEIXEIRA, Ana Carolina Brochado; RIBEIRO, Gus-
tavo Pereira Leite; COLTRO, Antônio Carlos Mathias; OLIVEIRA E TELLES, Marília
Campos (Orgs.). Problemas da família no direito. Belo Horizonte: Del Rey, p. 77-102,
2012, p. 78.
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