Intepretação constitucional e controvérsias tributárias

AutorMarco Aurélio Mello
Ocupação do AutorMinistro do Supremo Tribunal Federal. Presidente do Supremo Tribunal Federal (maio de 2001 a maio de 2003) e do Tribunal Superior Eleitoral (maio de 1996 a junho de 1997, maio de 2006 a maio de 2008 e a partir de novembro de 2013)
Páginas1135-1165
1135
ΙΝΤΕΡΠΡΕΤΑ∩℘Ο ΧΟΝΣΤΙΤΥΧΙΟΝΑΛ
Ε ΧΟΝΤΡΟς⊃ΡΣΙΑΣ ΤΡΙΒΥΤℑΡΙΑΣ
Marco Aurélio Mello1
1. INTRODUÇÃO
O Estado não prescinde dos recursos tributários, obtidos
de pessoas naturais e jurídicas, para satisfazer as necessidades
públicas assim como alcançar fins sociopolíticos. Segundo
Aliomar Baleeiro, revela-se “o traço da economia coativa” – os
tributos são “meios ordinários e normais de manutenção do
Estado e de seu sistema de serviços públicos” e podem servir
de “instrumento de intervenção ou regulação pública”.2 A tri-
butação, além de mostrar-se inerente ao funcionamento estatal
típico, custeando atividades básicas, é mecanismo de transfor-
mação social e econômica voltada à redistribuição de bens e
oportunidades. O tributo se faz onipresente.
1. Ministro do Supremo Tribunal Federal. Presidente do Supremo Tribunal Fede-
ral (maio de 2001 a maio de 2003) e do Tribunal Superior Eleitoral (maio de 1996
a junho de 1997, maio de 2006 a maio de 2008 e a partir de novembro de 2013).
Presidente do Supremo Tribunal Federal no exercício do cargo da Presidência da
República do Brasil de maio a setembro de 2002, em quatro períodos intercalados.
2. BALEEIRO, Aliomar. Uma Introdução à Ciência das Finanças. 15ª ed.
Rio de Janeiro: Forense, 2001, p. 157 e 190.
1136
TRIBUTAÇÃO: DEMOCRACIA E LIBERDADE
Mesmo imprescindíveis e irrenunciáveis, os tributos não
podem, na atual quadra evolutiva do constitucionalismo de-
mocrático, ser livre e indiscriminadamente criados e exigidos.
No Estado Constitucional e Democrático de Direito, o poder
estatal – em destaque, o tributário – sofre limitações em favor
do autoconsentimento e da liberdade geral dos cidadãos/con-
tribuintes. Este é o ponto de encontro – e de tensão – entre
“Tributação, Democracia e Liberdade”, eixo temático sobre o
qual versa a presente coletânea, homenagem póstuma à mi-
nistra Denise Martins Arruda, do Superior Tribunal de Justiça,
magistrada exemplar e dedicada ao ofício judicante. O tributo
é uma necessidade sim. Porém, deve ser consentido pelos obri-
gados e observar direitos e garantias fundamentais destes, sob
pena de revelar-se insanavelmente ilegítimo.
Cumpre, em última oportunidade, ao juiz constitucional
o relevante papel de assegurar que as exigências tributárias
estejam em consonância com o princípio democrático e os di-
reitos fundamentais. O objetivo deste artigo é demonstrar,
considerados alguns julgamentos importantes do Supremo,
como o Tribunal vem decidindo e como penso deva decidir
para prevalecer uma tributação democrática, com observância
das liberdades. Abordarei a interpretação constitucional como
instrumento de solução de controvérsias envolvendo os ele-
mentos que compõem o Sistema Constitucional Tributário:
regras de competência tributária, princípios constitucionais
tributários e imunidades tributárias. Consoante será argumen-
tado, o equilíbrio entre “Tributação, Democracia e Liberdade”
requer sejam variados e harmonizados os métodos de inter-
pretação conforme a natureza desses elementos e conflitos.
O texto terá a estrutura a seguir delineada: nos tópicos 2
e 3, desenvolverei alguns aspectos teóricos da interpretação
constitucional aplicada ao Sistema Constitucional Tributário.
Depois, descreverei decisões do Supremo Tribunal Federal
sobre (4) competências tributárias, (5) princípios constitucio-
nais tributários e (6) imunidades tributárias. Cabe ressaltar

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT