Interpretação literal em direito tributário

AutorPaulo Caliendo
Ocupação do AutorGraduado em Direito pela UFRGS, Mestre em Direito dos Negócios pela Faculdade de Direito da UFRGS
Páginas1167-1207
1167
ΙΝΤΕΡΠΡΕΤΑ∩℘Ο ΛΙΤΕΡΑΛ ΕΜ
∆ΙΡΕΙΤΟ ΤΡΙΒΥΤℑΡΙΟ
Paulo Caliendo1
Índice: Introdução. 1. Da interpretação jurídica no pensamento con-
ceitual, normativista e sistemático. 1.1. Pensamento Conceitual:
hermenêutica e interpretação. 1.2. Pensamento Normativista: Norma
Jurídico-Tributária (Regra-Matriz de Incidência Tributária). 1.3.
Pensamento Sistemático: valores jurídicos (concretização de direitos
fundamentais). 2. Da interpretação sistemática no Direito Tributário.
3. Considerações Finais.
Resumo
O presente artigo trata utilidade e conveniência do método de inter-
pretação literal em Direito Tributário, sob a ótica dos direitos funda-
mentais, sob a forma de interpretação sistemática.
1. PAULO A. CALIENDO V. DA SILVEIRA é graduado em Direito pela UFRGS,
Mestre em Direito dos Negócios pela Faculdade de Direito da UFRGS. É
Doutor em Direito Tributário pela PUC/SP. Professor Titular na PUC/RS,
onde compõe o corpo permanente do Mestrado e Doutorado, lecionando
na Disciplina de Direito Tributário, e de diversos cursos de Pós-Graduação
no país. Autor do livro finalista do Prêmio Jabuti 2009 “Direito Tributário e
Análise Econômica do Direito”, publicado pela editora Elsevier. Conselheiro
do CARF, vice-presidente da Academia Tributária das Américas, Árbitro da
lista brasileira do Mercosul. Advogado.
1168
TRIBUTAÇÃO: DEMOCRACIA E LIBERDADE
INTRODUÇÃO
A teoria da interpretação é diferente para cada modo de
pensar o jurídico, produzindo diferenças claras nos seus resul-
tados concretos e nas soluções práticas para os dilemas jurídi-
cos. A interpretação sistemática é capaz de dotar o intérprete
de uma gama vasta e sofisticada de instrumentos de análise,
que lhe dão superioridade sobre os modelos anteriores. A pro-
posta do presente artigo é responder ao questionamento sobre
a existência de um posicionamento interpretativo geral, que
oriente a compreensão e construção de sentido das normas
tributárias e particularmente o uso do método de interpretação
literal.
1. DA INTERPRETAÇÃO JURÍDICA NO PENSAMENTO
CONCEITUAL, NORMATIVISTA E SISTEMÁTICO
O problema da interpretação jurídica aparece igualmen-
te de modo diverso em cada modo de pensar o jurídico.
O pensamento conceitualista adota um modelo silogístico
de interpretação, dominado pelo formalismo jurídico e pela
concepção de que a tarefa interpretativa se caracteriza como
sendo uma tarefa lógico-dedutiva. O modelo de solução decor-
re da compreensão fechada do sistema e de um tipo de coerên-
cia material rígida do raciocínio jurídico, de tal forma que não
existem lacunas ou casos difíceis no Direito. O próprio sistema
jurídico contém todas as respostas aos problemas do sistema,
de tal modo que um problema sem solução dedutível não pode
ser considerado um problema jurídico. Neste caso o juiz está
submetido ao conjunto de axiomas e conceitos gerais da ciên-
cia do Direito.
Trata-se de um modelo de coerência judicial necessária
(“necessary”), no sentido que as decisões judiciais estão inse-
ridas no quadro geral de um sistema fechado e de coerência
1169
TRIBUTAÇÃO: DEMOCRACIA E LIBERDADE
material rígida e, portanto, a coerência das decisões judiciais
é absolutamente necessária com o sentido material do sistema
de conceitos jurídicos. Segundo tal entendimento deve exis-
tir uma necessária vinculação judicial ao acervo jurídico vi-
gente (“pre-existing law”) e sobre o processo de evolução
legal ou normativa.
Para o pensamento normativista existe uma forte dis-
cricionariedade judicial em que ao juiz é autorizado preen-
cher de sentido a norma jurídica, nos limites de sua moldu-
ra normativa. Assim, permite-se ao juiz solucionar o caso
concreto com as suas preferências pessoais de natureza
ética, política ou ideológica, desde que tais escolhas estejam
inseridas no interior da moldura normativa. Os casos difíceis
são sempre solucionados pelos juízes com base na discricio-
nariedade judicial.
Para este entendimento a exigência de uma coerência
judicial com o sistema jurídico somente é necessária do ponto
de vista formal e desejável no seu sentido material, mas nada
impede que o sistema produza posições contraditórias mate-
rialmente, porém legítimas pelo resultado da ação de compe-
tências tributárias diversas. Assim, trata-se de uma coerência
desejável (“desirable”), ou seja, um dos requisitos que deverá
ser tomado em conta, mas que poderá ser afastado por valores
diversos na aplicação judicial;
Por sua vez no pensamento sistemático os requisitos de
coerência necessária e suficiente (“sufficient”), ou seja, são
essenciais na interpretação e aplicação do Direito. Segundo
Dworkin2, o Direito deve ser entendido como uma voz organizada
2. Misabel Derzi ao tratar da obra do Ministro Carlos Velloso refletiu sobre o
dilema entre a justiça e os direitos fundamentais e a democracia, tendo por
referência os estudos de Dworkin. Segundo a autora: “portanto, a questão da
atuação da Suprema Corte nas democracias tem merecido a atenção dos mais
interessantes filósofos e constitucionalistas. Se os juízes não são eleitos, como
explicar que possam, criativamente, controlar a constitucionalidade das leis?

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT