Livros e atos do registro civil das pessoas naturais

AutorAndreia Ruzzante Gagliardi
Páginas43-75
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livros e Atos do registro civil
dAs pessoAs nAturAis
Registro é expressão que pode ser tomada em sentido amplo, como sinônimo
do cartório e todos os seus atos, mas, no trabalho técnico cotidiano, registro tem um
sentido específ‌ico que o distingue dos demais atos praticados em cartório.
Assim, registro é o ato principal, lavrado em livro próprio, que documenta
um ato ou fato, tornando o conhecimento deste ato ou fato perene, público, verda-
deiro. Perene, sempre. Público, salvo exceções relativas à intimidade das pessoas.
Verdadeiro, salvo se desconstituído por provimento jurisdicional em que se com-
prove o contrário. Ressalte-se que essas exceções ocorrem em poucos casos, estão
legalmente previstas e, em regra, prevalece a força e a presunção de veracidade do
registro público.
São atos de registro, no âmbito do registro civil das pessoas naturais, o nascimento,
o casamento e o óbito, além de outros importantes como a emancipação, a interdição
(curatela), a adoção (que é lavrada de maneira semelhante ao nascimento), a união
estável, a ausência, a morte presumida e a opção de nacionalidade.
Ocorre que esses registros não são estáticos. A vida das pessoas é dinâmica, logo
o registro que a espelha também é. Portanto, as alterações do estado das pessoas são
(ou pelo menos devem ser) acompanhadas de alteração nos registros públicos. É
verdade que, como uma das funções do registro é tornar o ato ou fato perene, não se
pode simplesmente descartar o registro já lavrado e fazer um novo. Pelo contrário, é
preciso preservá-los, ainda que alterados, pois ao tempo que foram feitos correspon-
diam à verdade registral e assim produziram efeitos jurídicos. Diz-se, portanto, que
os registros públicos não apenas trazem o estado mais atual da pessoa, mas também
a sua história.
É justamente por meio dos outros atos, as averbações e anotações, que o sistema
de registro civil se mantém atualizado e íntegro. São as averbações e anotações que
tornam o conteúdo do assento completo e atualizado, indicando todos os atos e fatos
jurídicos relevantes referentes àquela pessoa.
Pode-se dizer, então, que a averbação e a anotação são atos acessórios a um ato
de registro, que dão publicidade às alterações pelas quais aquele passou. Ambas são
lavradas à margem direita do registro ao qual se referem, de modo que, ao ver o re-
gistro, já se tem com praticidade, na coluna ao lado da mesma folha, as informações
relevantes sobre suas alterações.
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REGISTRO CIVIL DAS PESSOAS NATURAIS • AndreiA r. GAGliArdi, MArcelo SAlAroli e MArio de c. cAMArGo neto
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Um exemplo pode facilitar muito o entendimento. Imagine-se o registro de nas-
cimento de uma pessoa, posteriormente, essa pessoa contrai casamento, que enseja
outro registro, o qual é anotado à margem do registro de nascimento. Deste modo, ao
ler o registro de nascimento, já se terá a informação acerca do casamento, de forma
organizada e explícita, o que constará das certidões.
Apesar de serem realizadas de maneira semelhante – à margem direita do regis-
tro –, a averbação e a anotação não se confundem, marcando a diferença as seguintes
características.
A anotação é sempre uma referência a um outro ato escriturado no cartório de
registro civil ou a outros dados cadastrais públicos relativos à pessoa natural1. Em ou-
tras palavras, a anotação é a remissão a outro ato ou documento, que pode ser registro
ou averbação, lavrado no mesmo cartório, em qualquer outro cartório de registro ou
ainda emitido por outros órgãos públicos.
A averbação, por sua vez, é escriturada originariamente à margem do registro
civil, não havendo outro ato registrário prévio ao qual se ref‌ira. A averbação, por si
só, promove a alteração jurídica do registro – conteúdo ou efeito – e produz os efeitos
declaratórios do fato a que se refere.
Isso traz uma repercussão para o plano dos efeitos jurídicos, que também dis-
tinguem as averbações e anotações. A distinção é que a averbação produz todos os
efeitos jurídicos relativos ao ato por si só, sem necessidade de ser complementada
com qualquer outro documento. A anotação depende de apresentação também da
certidão do registro ou averbação à qual ela se refere para produzir efeitos plenos, vez
que apenas noticia e indica a existência de outro ato.
Veja-se um exemplo sobre isso. O casamento poderá acabar pelo divórcio ou pela
morte. O divórcio, que chegará ao cartório por meio de escritura pública ou título
judicial, será AVERBADO diretamente à margem do registro do casamento. Já o óbito
será primeiramente lavrado em livro próprio, o livro “C”, para depois ser ANOTADO
à margem do registro de casamento. Assim, para uma pessoa provar que é divorciada,
bastará apresentar a certidão de casamento em que constará a averbação do divórcio.
Para provar que é viúva, não bastará a apresentação da certidão de casamento com
a anotação do óbito, será necessário exibir também a certidão de óbito do cônjuge.
Isso porque a anotação do óbito, à margem do nascimento ou casamento, é um início
de publicidade do falecimento, mas não faz prova plena dele, o que só ocorrerá com
a respectiva certidão de óbito. Já a averbação, por si só, torna o fato ou ato averbado
perene, público e verdadeiro.
1. O Provimento n. 63/2017 da CN-CNJ tornou expresso, no artigo 6º, §2º a anotação do RG, título de eleitor
e outros dados cadastrais públicos relativos à pessoa natural, quanto ao CPF, o Provimento usou a expressão
averbação, no entanto, nos parece que a natureza correta do ato, conforme os conceitos aqui expostos, é de
anotação.
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5 • lIvRoS E AtoS do REgIStRo CIvIl dAS PESSoAS nAtuRAIS
Podem-se diferenciar os atos do registro civil da seguinte maneira:
REGISTRO AVERBAÇÃO ANOTAÇÃO
ESCRITURAÇÃO na coluna central do livro
próprio
à margem direita do registro,
se ndo o espaço, no livro/re-
gistro de transporte
à margem direita do registro, se
ndo o espaço, no livro/registro de
transporte
NATUREZA ato principal ato acessório de um registro,
o qual modica ou extingue
remissão (referência) a outro ato ou
documento público
FORÇA faz prova plena e tem fé pública faz prova plena e tem fé pública
início de prova que só se completa
com a certidão do ato ao qual faz
referência ou apresentação do do-
cumento original
OBJETO os atos e fatos jurídicos previs-
tos em lei
os atos e fatos jurídicos que
alteram o conteúdo do registro
sempre um outro ato (registro ou
averbação) ou documento relativo
à pessoa natural
Consequência prática relevante e frequente dessa distinção se refere aos mandados
judiciais de interdição (curatela). Erro comum é supor que a interdição é objeto de aver-
bação a ser feita à margem do registro de nascimento da pessoa interditada. No entanto,
a interdição é objeto de registro no livro “E” do cartório onde domiciliado o interdito.
O cartório responsável pelo registro da interdição fará a comunicação/anotação para o
registro de nascimento e, se houver, de casamento da pessoa (fundamento legal: arts.
89, 92 e 106 da LRP). Ou seja, não se faz averbação de interdição, mas apenas registro
e anotação.
Expostas as diferenças entre registro, averbação e anotação, serão analisados cada
um dos atos de registro civil separadamente.
5.1 REGISTROS E SEUS LIVROS
Os atos de registro propriamente dito são os atos principais do Registro Civil das
Pessoas Naturais, representando os atos centrais de cada um de seus livros, com os
quais guardam perfeito paralelismo. Trata-se dos atos que comandam a inscrição e a
publicidade dos fatos e atos levados a registro.
Tradicionalmente, defende-se que os registros propriamente ditos são numerus
clausus, devendo estar previstos expressamente em lei.
Todavia, Daniel Nilson Ribeiro2, ao comentar o artigo 29 da Lei 6.015/73, sustenta
que “trata-se de um rol enunciativo” e argumenta que as “relações sociais e pessoais não
são estáticas, elas evoluem e se modif‌icam, sendo certo que qualquer alteração ou criação
legislativa que discipline tais relações ref‌lete diretamente no registro civil”.
Neste sentido, reconhecem-se os registros da tomada de decisão apoiada e da tutela,
que foram incluídos por normativas administrativas nacionais e estaduais, embora não
2. RIBEIRO, Daniel Nilson. In. Lei de Registros Públicos Comentada. ARRUDA ALVIM NETO, José Manuel; CLÁPIS,
Alexandre Laizo; CAMBLER, Everaldo Augusto (Coord.). Rio de Janeiro: Forense, 2014. p. 156.
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