Medidas excepcionais nas relações concorrenciais
Autor | Guilherme Calmon Nogueira da Gama/Thiago Ferreira Cardoso Neves |
Páginas | 177-188 |
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MEDIDAS EXCEPCIONAIS
NAS RELAÇÕES CONCORRENCIAIS
A pandemia do COVID-19, a par das graves consequências que vêm causando na
vida, saúde e integridade físico-psíquica das pessoas naturais, tem impactado duramente
as atividades econômicas em vários setores da indústria, do comércio e da prestação
de serviços. Associadas ao combate à disseminação da doença com altos índices de
contaminação e de graves consequências à saúde das pessoas, as medidas ordenadas
ou sugeridas pelas autoridades públicas, no contexto do estado de calamidade pública
provocado pela pandemia (inclusive previstas na Lei n°13.979/20, entre outras), vêm
se refletindo diretamente na iniciativa privada, inclusive no campo concorrencial.
A Lei n° 14.010/2020 prevê três regras emergenciais e transitórias para tratar das
questões envolvendo a concorrência empresarial no Direito brasileiro: a) a suspensão da
eficácia das normas que proíbem a venda de mercadoria ou prestação de serviço abaixo
do preço de custo; b) a regra de interpretação favorável ao empresário ou à sociedade
empresária nos casos previstos como possível infração à ordem econômica no período
da pandemia; c) a suspensão da eficácia das normas que tratam de limites aos atos de
concentração, quando se tratar de contrato associativo, consórcio ou joint venture entre
2 (duas) ou mais empresas.
Deve-se atentar para a advertência de Plauto Faraco de Azevedo no sentido do
processo hermenêutico funcionar como sistema aberto: “É do cotejo da singularidade
da situação sub judice com os dados legais – as normas jurídicas e a ordem jurídica a
que pertencem – que pode o juiz, antecipando e valorizando os efeitos sociais de sua
decisão, retirar a convicção da razoabilidade da escolha metodológica realizada”1. No
contexto contemporâneo – decorrente da calamidade pública provocada pela pandemia
e dos consequentes reflexos dos atos das autoridades públicas em vários segmentos da
atividade econômica –, por óbvio que o processo de interpretação das normas jurídicas
recebe o influxo das situações extraordinárias nas quais a população em geral, o empre-
sariado em particular e o Estado se inserem.
Atualmente reconhece-se a necessidade de se apreender um novo tipo de conexão
e de comunicação entre o econômico e o jurídico-político no Estado e, consequente-
mente, na própria sociedade civil. Na dicção da doutrina, a efetividade da Constituição
econômica pressupõe a implementação de uma ordem justa da economia que possibilite
1. AZEVEDO, Plauto Faraco de. Aplicação do direito e contexto social. 2. ed. São Paulo: Ed. RT, 1998, p. 133.
DIREITO PRIVADO EMERGENCIAL.indb 177DIREITO PRIVADO EMERGENCIAL.indb 177 15/07/2020 15:24:0515/07/2020 15:24:05
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