Multipropriedade (Lei 13.777, de 20 de dezembro de 2018)

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mULTIPROPRIEDADE
(LEI 13.777, DE 20 DE DEZEmBRO
DE 2018)
21.1 NOVOS CONTORNOS DO DIREITO DE PROPRIEDADE
A Ciência do Direito está em constante transformação. Quando o Mundo
e a Sociedade mudam, o Direito precisa se adaptar. O que signica a riqueza nos
dias de hoje? Diminuição da relevância do caráter de dominação (domínio),
iniciando a ter força o caráter da utilidade do bem (compartilhamento). Antes,
a propriedade era absoluta.
Hoje, porque ainda não há o suciente para todos, ela precisa cumprir
suas funções social e econômica. Não se confunde o tema em estudo com o
Condomínio Comum. Nesse instituto, todos titulam propriedade ao mesmo
tempo, mas limitado no aspecto quantitativo. Por outro lado, na Multiproprie-
dade cada titular tem a propriedade do todo, mas apenas no período de tempo
determinado.
A evolução, no caso, é que a Multipropriedade permite o exercício pleno da
propriedade num determinado período de tempo, criando a unidade periódica.
Isso pode representar profundo impacto positivo nos Serviços de Registro de
Imóveis pela dinamização do mercado imobiliário.
O instituto da Multipropriedade pode apresentar como sinônimos: “pro-
priedade temporária” ou “time-sharing”. Em linhas gerais, visa atender a uma
demanda social por esta modalidade de empreendimento imobiliário.
A Europa foi o palco dessa inovação. O sistema de aproveitamento da
propriedade surgiu pela primeira vez na França; chamado, inicialmente, de
multipropriéte, posteriormente, foi conhecido como pluripropriéte, propriéte
spatio-temporelle, copropriété saisonnière e droit de jouissance à temps partagé.
A Itália foi o segundo país a utilizar o sistema, denominando-o de proprietà
spazio-temporale. Em Portugal, como direito real de habitação periódica. Na
Espanha, como multipropriedad. E, nos Estados Unidos, como time sharing, com
PROCEDIMENTO DE DÚVIDA NO REGISTRO DE IMÓVEIS • João Pedro Lamana Paiva
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um caráter diferente do admitido no Brasil (temporário, parecido com o Direito
de Superfície, mais voltado para o Direito Societário).
No Brasil, tem origem no fato social, sendo descrito pela doutrina e res-
paldado pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (Recurso Especial
1.546.165 – SP1), gerando movimentação no Legislativo e culminando com a
publicação da Lei 13.777/2018.
Além disso, no ordenamento jurídico brasileiro, reconhece-se como Direito
Real não só os institutos expressos no art. 1.225 do Código Civil, mas também
os que derivam de leis esparsas, a exemplo da Lei 9.514/1997 e, agora, também
da Lei 13.777/2018. Ou seja, a Multipropriedade, no Brasil, tem sido entendida
como sendo um Direito Real. Consta do Livro próprio do Código Civil.
A Multipropriedade como Direito Real sobre imóveis (destinação urbana,
mesmo que localizado no meio rural). Quando o imóvel não se destina para
agricultura, pecuária ou extrativismo ele estará sujeito ao regramento incidente
sobre imóveis urbanos (controle urbanístico pelo Município – art. 30, VIII da
CF). Pode ser aplicado sobre sítios de recreio também, mas a legislação incidente
1. Ementa: Processual civil e civil. Recurso especial. Embargos de terceiro. Multipropriedade imobiliária
(time-sharing). Natureza jurídica de direito real. Unidades xas de tempo. Uso exclusivo e perpétuo
durante certo período anual. Parte ideal do multiproprietário. Penhora. Insubsistência. Recurso
especial conhecido e provido. 1. O sistema time-sharing ou multipropriedade imobiliária, conforme
ensina Gustavo Tepedino, é uma espécie de condomínio relativo a locais de lazer no qual se divide o
aproveitamento econômico de bem imóvel (casa, chalé, apartamento) entre os cotitulares em unidades
xas de tempo, assegurando-se a cada um o uso exclusivo e perpétuo durante certo período do ano. 2.
Extremamente acobertada por princípios que encerram os direitos reais, a multipropriedade imobi-
liária, nada obstante ter feição obrigacional aferida por muitos, detém forte liame com o instituto da
propriedade, se não for sua própria expressão, como já vem proclamando a doutrina contemporânea,
inclusive num contexto de não se reprimir a autonomia da vontade nem a liberdade contratual diante
da preponderância da tipicidade dos direitos reais e do sistema de numerus clausus. 3. No contexto do
Código Civil de 2002, não há óbice a se dotar o instituto da multipropriedade imobiliária de caráter real,
especialmente sob a ótica da taxatividade e imutabilidade dos direitos reais inscritos no art. 1.225. 4.
O vigente diploma, seguindo os ditames do estatuto civil anterior, não traz nenhuma vedação nem faz
referência à inviabilidade de consagrar novos direitos reais. Além disso, com os atributos dos direitos
reais se harmoniza o novel instituto, que, circunscrito a um vínculo jurídico de aproveitamento eco-
nômico e de imediata aderência ao imóvel, detém as faculdades de uso, gozo e disposição sobre fração
ideal do bem, ainda que objeto de compartilhamento pelos multiproprietários de espaço e turnos xos
de tempo. 5. A multipropriedade imobiliária, mesmo não efetivamente codicada, possui natureza
jurídica de direito real, harmonizando-se, portanto, com os institutos constantes do rol previsto no art.
1.225 do Código Civil; e o multiproprietário, no caso de penhora do imóvel objeto de compartilhamento
espaço-temporal (time-sharing), tem, nos embargos de terceiro, o instrumento judicial protetivo de sua
fração ideal do bem objeto de constrição. 6. É insubsistente a penhora sobre a integralidade do imóvel
submetido ao regime de multipropriedade na hipótese em que a parte embargante é titular de fração
ideal por conta de cessão de direitos em que gurou como cessionária. 7. Recurso especial conhecido
e provido. Superior Tribunal de Justiça. Resp 1546165 / SP 2014/0308206-1. Relator: Ministro Ricardo
Villas Bôas Cueva. Data do Julgamento: 26/04/2016. Disponível em: ttps://www.portaljustica.com.
br/acordao/1910864>. Acesso em: 12 de ago. de 2022.

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