Princípios fundamentais do direito penal
Páginas | 19-34 |
3
princípios FundAmentAis
do direito penAL
Vamos desenvolver o tema princípios a partir de 7 (sete) princípios tidos como basi-
lares ou fundamentais e, através das funções desempenhadas por estes, outros princípios,
não menos fundamentais, irão surgir como princípios decorrentes daqueles, esta forma de
trabalhar o tema foi proposta originariamente pelo Prof. Nilo Batista, em sua obra “Intro-
dução Crítica ao Direito Penal Brasileiro” – Ed. Revan.
Note-se que não há hierarquia quanto aos princípios penais, mas essa separação em
sete fundamentais e oito decorrentes dará ao tema um viés prático, simples e dinâmico,
que irá simplificar demais o seu estudo e o entendimento das funções desempenhadas por
eles em nosso ordenamento.
3.1 PRINCÍPIO DA LEGALIDADE
CP – “Art. 1º. Não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal (Redação
dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984).”
CF – “Art. 5º, inc. XXXIX – não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal.”
O princípio da legalidade, ou reserva legal, afirma que para a existência de um crime
é preciso uma lei que formalmente delimite aquilo que se quer proibir, sendo essa lei ne-
cessariamente anterior ao fato. Sendo assim, podemos separar três grandes funções para o
princípio da legalidade.
3.1.1 Funções e princípios decorrentes da legalidade ou reserva legal
Basicamente, o princípio da legalidade possui as seguintes funções, sendo que dessas
funções se originam outros quatro princípios de Direito Penal:
a) Impedir a retroatividade da lei penal incriminadora
Analisando contrario senso o disposto no Código Penal, se uma lei for posterior ao
fato, ela não poderá alcançar situações já ocorridas para incriminar, pois, se não há crime
sem lei anterior que o defina, proíbe-se a retroatividade das leis penais incriminadoras.
Percebe-se, portanto, que o primeiro princípio decorrente do princípio da legalidade
é o conhecido princípio da irretroatividade da lei penal incriminadora, pois essas leis
jamais poderão alcançar fatos passados para incriminar, já que não há crime sem que a lei
seja anterior ao fato.
Com base na mais básica das regras de hermenêutica, sabemos que “tudo aquilo que
a lei não proíbe é considerado permitido”, percebe-se que, se o legislador não vinculou a
concessão de benefícios ao princípio da legalidade, não impôs a essa concessão que haja
EBOOK MANUAL DIREITO PENAL 3ED.indb 19EBOOK MANUAL DIREITO PENAL 3ED.indb 19 17/05/2022 16:22:1517/05/2022 16:22:15
MANUAL DE DIREITO PENAL • Cristiano rodrigues
20
lei anterior para isso, logo, surge aqui mais um princípio decorrente, qual seja, o da retroa-
tividade da lei penal mais benéfica.
Portanto, junto com a proibição da irretroatividade prevista expressamente no prin-
cípio da reserva legal, nasce contrario senso o princípio da retroatividade da lei penal
mais benéfica, pelo qual, sempre que uma norma penal for benéfica, favorável ao agente
ela terá aplicação plena, alcançando tanto fatos anteriores quanto posteriores a ela.
Além de decorrerem da própria legalidade em si, ambos os princípios se encontram
“Art. 2º. Ninguém pode ser punido por fato que lei posterior deixa de considerar crime, cessando em vir-
tude dela a execução e os efeitos penais da sentença condenatória” (Redação dada pela Lei nº 7.209, de
11.7.1984).
“Parágrafo único. A lei posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se aos fatos anteriores,
ainda que decididos por sentença condenatória transitada em julgado.”
Acerca desses dois princípios, podemos analisar algumas questões polêmicas e que
geram algumas divergências na doutrina e jurisprudência e que são objeto de questões de
concurso:
1. Aplica-se o princípio da retroatividade da lei penal mais benéfica a uma lei
penal em branco?1 Em outras palavras, a alteração benéfica apenas do complemento da
lei penal em branco deve retroagir e atingir fatos pretéritos?
Ex.: o condenado por tráfico de uma substância entorpecente, que depois veio a ser
retirada da portaria do Ministério da Saúde que complementa o art. 33 da Lei de Drogas
(Lei nº 11.343/2006) deve ser beneficiado?
Sobre o tema surgem três posicionamentos:
a) O primeiro posicionamento, que acaba sendo uma tendência na dogmática, e
que é dominante na doutrina e na jurisprudência, defende a aplicação ampla do prin-
cípio da retroatividade da lei mais benéfica. Portanto, essa retroatividade alcança alte-
rações que sejam benéficas nos complementos de leis penais em branco.
Essa corrente entende que o complemento de uma lei penal em branco faz parte da
estrutura do próprio tipo penal incriminador e sem esse complemento não se materializa
a própria tipicidade da conduta, compondo assim o preceito primário do fato típico.
Assim, ao ser alterado o complemento da lei penal em branco, estará sendo alterado
também o próprio tipo incriminador, o que por isso enseja a aplicação da retroatividade
da lei penal mais benéfica.
b) Em contrapartida, a segunda corrente defende que alterações circunstanciais
no complemento de uma lei penal em branco não configuram alteração estrutural de
uma lei penal. Dessa forma, não devem retroagir, prevalecendo o princípio do tempus
regit actum, ou seja, deve vigorar a lei penal vigente ao tempo da prática do fato.
1. Rapidamente pode-se dizer que as normas penais em branco são aquelas que nascem incompletas, dependendo,
portanto, de uma norma que a complemente, não necessariamente uma lei em sentido estrito, mas qualquer espécie
de norma (Ex: portaria). Por exemplo o peculato – art. 312 pois, para saber quem é “funcionário público”, sujeito ativo
deste crime, é preciso considerar o art. 327 que traz essa definição para fins penais.
EBOOK MANUAL DIREITO PENAL 3ED.indb 20EBOOK MANUAL DIREITO PENAL 3ED.indb 20 17/05/2022 16:22:1517/05/2022 16:22:15
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO