Teoria da pena

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teoriA dA penA
17.1 DEFINIÇÃO E ASPECTOS GERAIS
Pena é toda sanção imposta pelo Estado, mediante uma ação penal, a quem pratica
uma infração penal (crime ou contravenção), como retribuição ao ato ilícito praticado e
com o fim de evitar novos delitos.
Em nosso ordenamento as penas podem consistir em privação de liberdade, restrição
de direitos, ou ainda numa sanção pecuniária (multa), impostas como decorrência da prá-
tica de uma infração penal (crime ou contravenção).
Pelo princípio da humanidade ou da dignidade da pessoa humana, previsto expres-
samente em nossa Constituição Federal não haverá pena de morte, penas cruéis, castigos
corporais, trabalhos forçados, banimento e nem sanções perpétuas, modalidades de pena
que ofendem Direitos Humanos Fundamentais e atentam contra a dignidade da pessoa
Dentre os princípios fundamentais de Direito Penal, merecem destaque, no que tan-
ge a estrutura, aplicação e execução das penas, os seguintes:
a) Princípio da Legalidade ou da Reserva Legal (Art. 1º CP e Art. 5º Inc. XXXIX
CF): Não há crime sem lei anterior que o defina e nem pena sem prévia cominação
legal.
b) Princípio da Pessoalidade ou da Intranscendência das Penas: As penas jamais
ultrapassam a pessoa do autor, não se comunicam, não se transferem a qualquer tí-
tulo, sendo personalíssimas e inerentes somente a pessoa que cometer o crime. (Art.
5º Inc. XLV CF).
c) Princípio da Individualização das Penas: Ao se aplicar e executar as penas de-
ve-se atender e considerar as características individuais de cada agente, ou seja, as
penas deverão ser individualizadas de acordo com a culpabilidade, personalidade, e
comportamento de cada agente separadamente. (Art. 5º Inc. XLVI CF).
d) Princípio da Humanidade ou da Dignidade da Pessoa Humana: as penas devem
respeitar a dignidade da pessoa humana, e jamais violar direitos humanos funda-
mentais, tanto no que tange a sua previsão e aplicação, quanto a sua forma e condi-
ções de execução. (Art. 5º Inc. XLVII CF)
17.2 FUNÇÕES DA PENA
Há inúmeras teorias delimitadoras das funções a serem desempenhadas pelas pe-
nas no nosso ordenamento jurídico penal, dentre elas, podemos destacar as seguintes:
A) Teoria Absoluta
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MANUAL DE DIREITO PENAL • Cristiano rodrigues
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Para esta vertente teórica as penas têm função exclusivamente retributiva, ou seja,
de compensar o mal causado pelo crime, sendo apenas uma forma de castigo, uma reação
do ordenamento à prática de uma infração penal, portanto, sua duração deve corresponder
fundamentalmente à gravidade do delito realizado e a culpabilidade (reprovabilidade pes-
soal) do autor.
Nas teorias absolutas a aplicação da pena (retributiva) está completamente desvin-
culada de qualquer efeito social futuro ou finalidade prática, e decorre exclusivamente de
uma necessidade ética e de justiça. Por ser uma “negação do delito”, uma resposta do orde-
namento ao crime, a pena se traduz numa simples afirmação do Direito e manifestação
do poder do Estado.
B) Teoria Relativa
Para esta teoria pena se fundamenta exclusivamente na necessidade de evitar a prá-
tica futura de delitos, sendo irrelevante o castigo imposto ao condenado, possuindo assim
apenas a função de prevenção, que pode ser:
– Prevenção Geral:
Dirige-se a toda a sociedade e aos possíveis e potenciais delinquentes, visando assim
evitar a futura prática de crimes, protegendo a sociedade e reduzindo a criminalidade.
Essa prevenção geral pode ser dividida ainda em:
Prevenção Geral Negativa: prevenção por intimidação, faz com que potenciais
criminosos não queiram cometer crimes, traduzindo um conceito de exemplaridade (o
crime não compensa).
Prevenção Geral Positiva: visa a demonstração da inviolabilidade do Direito
(Claus Roxin), ou ainda, a busca pela fidelidade e o respeito às normas vigentes, a afirmação
da estabilidade do Direito, tendo como consequência de sua violação, a sanção penal.
– Prevenção Especial:
Atua diretamente na pessoa do delinquente pela aplicação e execução da pena, visan-
do evitar que este sujeito especificamente volte a cometer crimes.
Essa prevenção especial pode ser:
Prevenção Especial Negativa: neutralização do indivíduo através do cárcere, ao
se tirar o indivíduo da sociedade, impossibilita-se que ele pratique novos crimes (penas
privativas de liberdade).
Prevenção Especial Positiva: visa a ressocialização, ou seja, através da pena fa-
zer com que o condenado não volte a cometer novos crimes, para que, após seu cumpri-
mento, possa voltar a integrar a sociedade normalmente.
C) Teorias unitárias ou ecléticas
Unifica as teorias absolutas e relativas, portanto, concilia a função de retribuição
com os fins de prevenção geral e especial, tendo sido esta a teoria adotada no Brasil (Art. 59
do CP), o que podemos perceber de acordo com as 3 etapas pelas quais passa uma pena:
Prevenção geral negativa: presente na cominação abstrata da pena em cada
Tipo penal.
Prevenção geral positiva e retribuição: presentes na aplicação da pena concreta
através da dosimetria, feita de acordo com a gravidade do fato, e na culpabilidade do agente.
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Prevenção especial positiva e negativa: presentes na etapa de execução, de acor-
do com nosso sistema progressivo de cumprimento das penas.
Modernamente muito se questiona o modelo adotado por nosso Código Penal no
que tange a teoria eclética das penas, principalmente quanto a utilidade da função retri-
butiva por ela abrangida.
Para as teorias funcionalistas desenvolvidas principalmente por Claus Roxin e Gun-
ther Jakobs, a pena teria exclusivamente que atender à função de prevenção, principal-
mente a prevenção geral (positiva e negativa), afastando-se totalmente do caráter retri-
butivo.
Muito tem se falado também na chamada Função Social da Pena, afirmando que
acima de tudo a pena criminal deve atender aos anseios da sociedade quanto a tutela de
bens jurídicos, pacificação das relações sociais, e ressocialização plena dos indivíduos que
violem o ordenamento jurídico.
A função social da pena nada mais é do que uma interpretação sociológica e realista
dos preceitos de prevenção especial (ressocialização) e de sua necessária valorização, bem
como uma crítica à situação atual do nosso sistema prisional que, infelizmente, acaba pri-
vilegiando apenas a inútil função de retribuição das penas.
17.3 PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE (ART. 32, I, DO CP)
As penas privativas de liberdade são a regra geral dentre as sanções penais pela
prática de um crime, e se configuram como a privação da liberdade de locomoção do con-
denado através de sua prisão por determinado período de tempo, de acordo com o Tipo
Penal realizado, sendo que, cada Tipo, como regra, terá valores mínimos e máximos de
pena privativa de liberdade previstos com base na gravidade abstrata da violação do bem
jurídico tutelado.
duas grandes espécies de pena privativa de liberdade previstas abstratamente
nos tipos penais, de acordo com sua maior ou menor gravidade, são elas:
a) Reclusão: prevista para crimes mais graves, sendo que, a pena de reclusão admite
os três regimes iniciais de cumprimento de pena, quais sejam, o regime fechado, se-
miaberto ou aberto.
b) Detenção: prevista para crimes menos graves, sendo que, a pena de detenção não
admite o regime inicial fechado, mas somente se inicia no regime semiaberto ou
aberto.
A única hipótese em que se admite o cumprimento de uma detenção em regime
fechado ocorre quando há a transferência do condenado que estava em regime semiaber-
to ou aberto para regime fechado, em face do descumprimento das regras desses regimes
menos rigorosos (regressão de regime).
Devemos lembrar ainda que em hipótese de concurso material (Art. 69 CP) de cri-
mes, havendo penas de reclusão e detenção previstas para os crimes praticados, cumpre-se
primeiro a pena de reclusão aplicada e depois a pena de detenção, já que somente a reclusão
admite que o agente inicie o cumprimento da pena em regime fechado.
Por fim, a pena de reclusão pode ter como efeito da condenação (Art. 92 Inc. II
CP) a incapacidade para exercício do poder familiar, tutela e curatela, nos crimes dolosos
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