Reforma contra a constituição

AutorMarco Aurélio Pereira da Silva
Ocupação do AutorAdvogado
Páginas44-49
44
Reforma contra a Constituição
Marco Aurélio Pereira da Silva
Advogado, graduado pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) em
1992. Foi membro da Comissão Especial da Terra da OAB/RS (1988), Coordenador
da Assessoria Jurídica (1999/2000) e Diretor-Geral (2001/2002) da Secretaria
de Estado da Justiça e Segurança/RS.
1. Sobre a força normativa da Constituição
Em 1862, Ferdinand Lassalle proferiu, em Berlim, a célebre conferência sobre a essência
da Constituição, em que apresentou sua tese fundamental de que questões constitucionais não
são questões jurídicas, apenas questões políticas. Haveria, portanto, duas Constituições: uma
formal e outra real. A Constituição “real” seria a resultante dos fatores reais de poder (que,
no contexto da Prússia do último quarto do século XIX, eram a monarquia, a aristocracia, a
grande burguesia, os banqueiros, a pequena burguesia e a classe operária). Aquele documento
que conhecemos como Constituição não passaria de um pedaço de papel.
Quase um século depois, em 1959, Konrad Hesse publica sua obra “A Força Normativa
da Constituição”, em que, dialogando com a posição de Lassalle, reconhece a necessidade de
a Constituição refletir o movimento real da sociedade, ao mesmo tempo em que aponta a
existência de uma força normativa imanente à Constituição, “uma força própria, motivadora
e ordenadora da vida do Estado”(1).
Sob um ambiente democrático, seria natural reconhecer que a posição de Hesse é a que
melhor explica e qualifica a relação dialética entre infraestrutura e superestrutura jurídica
em uma sociedade complexa e que a posição de Lassalle, que reduz a Constituição a uma
abstração política, encontra-se historicamente superada.
No entanto, no deteriorado quadro institucional do Brasil atual, que o leitor do futuro
terá talvez dificuldade de entender e que nos aproxima da anomia constitucional(2) — “donde
(1) HESSE, Konrad. A força normativa da Constituição, p. 11 .
(2) “Anomia constitucional” é a expressão cunhada pelo jurista Rafael Escudero Alday, no artigo “La anomia
constitucional (o cómo la realidad ha acabado por desmontar el constitucionalismo)”, a partir de estudos do jusfilósofo

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