As relações afetivas na era digital

AutorCarlos José Cordeiro/Josiane Araújo Gomes
Páginas315-320

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Seu celular está sempre tocando, mensagens em um grupo no aplicativo WhatsApp, notificação de uma curtida no Facebook, alguém retwittou uma mensagem sua, gostou de uma foto no Instagram, ou ocasionalmente até uma ligação.

A sociedade pós-moderna alcançou a onipresença virtual com a disponibilização de acesso à rede mundial de computadores em praticamente todos os lugares. Com os gadgets adequados, é possível a completa libertação em relação ao lugar.

Consequentemente, não há mais distinção entre algo física e espiritualmente distante. A proximidade não exige mais contiguidade física, e a contiguidade física não determina mais a proximidade.

No epicentro tecnológico em que vivemos não importa onde você está, quem são as pessoas à sua volta ou o que você está fazendo ali. A diferença entre um lugar e outro, entre um grupo de pessoas ao alcance de sua visão ou de seu toque foi suprimida.

O homem pós-moderno permanece conectado, seus dedos estão sempre ocupados, mas seus olhos se tornaram paredes em branco, evitando o contato face--a-face. Mas culpar as “engenhocas eletrônicas” pela tendência da substituição de proximidade contínua, pessoal e direta pela proximidade virtual é simplista.

Inquestionável que vivemos em uma sociedade de informações, em que a troca de dados tem rapidez sufocante. Necessitamos de constante atualização para acompanhar as novidades, já que as inúmeras mídias de comunicação em massa

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disponibilizam praticamente tudo o que acontece, em qualquer lugar do mundo. O intercâmbio de informações é cada vez mais intenso, e o volume aumenta exponencialmente.

Devido à incapacidade de lidar com frustrações e contrariedades, do medo de enfrentar as consequências do desfazimento de um vínculo mais profundo, a sociedade pós-moderna se tornou líquida3. Tal liquidez se deve a seu constante e frenético movimento, sua enorme flexibilidade e relatividade, que impedem a solidificação dos laços humanos e, consequentemente, torna as relações frágeis e inseguras.

Esse pânico de sofrimento nos levaa buscar somente o que possa nos trazer recompensas imediatas, sem perigo de consequências negativas. Em decorrência dessa liquidez, a sociedade se infantilizou, perdeu autonomia para exercer auto-ridade e impor limites. É necessário fluidez para acompanhar os dias hodiernos, supostamente incompatíveis com vínculos mais profundos e sólidos.

Nesse contexto, o ser humano se torna impaciente e ansioso. O “eu” tornou-se o eixo mais provável de duração e continuidade, já que tudo é passageiro, não sendo aceitável a incerteza causada na espera pelo outro.

Evidentemente, nesse contexto em que os laços humanos podem ser desfeitos a qualquer momento, ao bel-prazer de seus interlocutores, a confiança dificilmente finca raízes e floresce, e contra ela o mundo parece conspirar.

De todos os impulsos “naturais” dos seres humanos, o sexual é o mais óbvio, indubitável e incontestável. O ser humano anseia por convívio. Ele se estende na direção de outro e – ainda que realizado e, sob todos os outros aspectos, autossuficiente – se torna incompleto e insatisfeito, a menos que esteja unido4.

Por isso, quando as frustrações dizem respeito ao campo afetivo, a falta de diá-logo e consequentemente de confiança da sociedade líquida é ainda mais evidente, como exposto pelas esdrúxulas e banais demandas submetidas ao Judiciário5.

Desejo e amor se encontram em...

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