Benefício de Prestação Continuada: Uma Análise Dialética sobre Conflitos em Parâmetros Estabelecidos por Decisões Judiciais no Cálculo da Renda Per Capita Familiar

AutorAdriano Mauss - Rodrigo Favero
Páginas121-137

Page 121

Adriano Mavss1

Rodrigo Favero2

1. Conceituação de benefício assistencial ao deficiente e ao idoso

O Benefício de Prestação Continuada ao idoso e ao deficiente tem um histórico normativo recente, sendo que sua criação remonta a década de 1990. Formula-se a partir de agora uma sucinta contextualização histórica que resultou no atual sistema de Seguridade Social vigente no Brasil, calcado nos três pilares de sustentação: assistência, previdência e saúde. Esse apanhado histórico nos permite avaliar as mudanças significativas que ocorreram no transcorrer dos tempos junto ao sistema de seguridade social, especialmente na influência com os benefícios vinculados a Assistência Social.

Embora a normatização protetiva seja recente, sua gênese é antiga, pois segundo Ibrahim (2008, apud DAMASCENO, 2016, p. 1) a proteção social tem seu fundamento na família, instituição social de natureza milenar, que nos primórdios da civilização foi utilizada como forma do ser humano se proteger contra as adversidades da natureza. O autor continua relatando que aos poucos esse sistema social tornou-se frágil e ineficaz para fins protetivos, sendo que o Estado teve que assumir essa função. Surge aí o Estado do Bem-Estar Social no final do século IXX. Segundo o doutrinador:

Somente com o advento do Estado Social que surge o atual sistema de proteção social: a Seguridade Social. Com efeito, a diretriz que rege Welfare State, ou Estado do Bem-estar Social, implica numa atuação estatal em diversas áreas da sociedade, antes imunes a tal interferência, dentre elas o sistema protetivo social, que tinha se mostrado absolutamente insuficiente durante a vigência do Estado Liberal (DAMASCENO, 2016, p. 157).

Nesse sentido nota-se que a preocupação com a "seguridade" do trabalhador ultrapassa os séculos. Com o avanço das civilizações e a organização dos Estados a concepção do "seguro" aos trabalhadores ganhou ênfase, sendo instaurada em diversos países, tais como Alemanha e Inglaterra, avançando e se adequando as características locais pelos continentes do globo terrestre.

A Constituição de 1934 trouxe grandes inovações para a Previdência Social. No que tange a assistência ao trabalhador e a Assistência Social. Essa Carta Política, pós revolução constitucionalista de 1932, teve evolução considerável para os tempos que vivia o país, pois estabeleceu a competência da União para

Page 122

criação de regras para a Assistência Social, bem como dava poderes aos estados-membros para gerirem os serviços de saúde e assistências públicas e fiscalizarem a efetiva aplicação desses direitos para a população. Ainda criou uma rede de proteção social ao trabalhador, que continha a fixação de regras para a assistência médica e sanitária aos trabalhadores e às gestantes.

No final do século IXX inúmeras mudanças nas políticas de proteção social realizadas pelo Estado Brasileiro se sucederam ampliando e melhorando o sistema normativo e administrativo.

Como o foco do presente estudo é analisar a interferência que o Poder Judiciário realiza num trabalho que é atribuição do Poder Executivo, trabalho esse que é pautado por uma legislação elaborada pelo Poder Legislativo, a abordagem histórica do tema será direcionada aos fatos históricos que fundamentam a Seguridade Social Brasileira, em especial a Assistência Social.

Analisando os eventos históricos relevantes sobre o tema, observou-se que a criação de um sistema de Seguridade Social no Brasil é muito recente, remonta ao início da década de 1920 (isso em termos históricos é bastante recente) com a Lei Eloy Chaves. A Constituição de 1934 trouxe grandes inovações para a Previdência Social, tendo importância devido a consolidação de diversas conquistas dos trabalhadores e a forma de controle de todo o sistema.

No que tange a assistência ao trabalhador e a Assistência Social em geral essa Constituição foi bastante importante, pois estabeleceu a competência da União para criação de regras para a Assistência Social, bem como dava poderes aos estados-mem-bros para gerirem os serviços de saúde e assistências públicas, além de estabelecer o poder de fiscalização do reconhecimento desses direitos para a sociedade por meio de órgãos específicos. Também criou uma rede de proteção social ao trabalhador, que continha a fixação de regras para a assistência médica e sanitária aos trabalhadores e às gestantes. Assegurou o direito ao descanso à gestante antes e depois do parto sem prejuízo do salário e emprego. Garantiu manutenção da previdência aos empregados, em favor da velhice, invalidez, maternidade e em casos de acidente de trabalho ou morte (MARTINS, 2002, p. 34).

Com o advento do período do Estado Novo, ou Era Vargas, destaca-se a intensa criação de IAP (Instituto de Aposentadorias e Pensões) para as mais diversas categorias de empregados. Em 1938 era criado o IAPETC, instituto direcionado para os trabalhadores avulsos de carga e descarga, estivadores, conferentes, condutores profissionais de veículos terrestres, dentre outros. Nota-se, porém, que a grande evolução desse período não adveio da Constituição, mas com o Decreto n. 7.526, de 7.5.1945, que criou a ISSB (Instituto de Serviço Social do Brasil), que previa a unificação de todas as caixas de previdência existentes no país, fazendo com que todos os empregados ativos com mais de 14 anos fossem obrigados a filiarem-se a este Instituto. Entretanto tal Instituto acabou não sendo implementado (MARTINS, 2002, p. 35).

No período de redemocratização do Brasil, após a queda da Ditadura Vargas, a Constituição de 1947 passou a dar mais ênfase ao sistema de proteção social. Com ela o Brasil conheceu pela primeira vez, a expressão "Previdência Social" em um texto constitucional, substituindo, por conseguinte, a expressão "Seguro Social" que imperava anteriormente. Esta Constituição manteve a forma de custeio anterior, com tripolaridade de contribuintes (MARTINS, 2002, p. 36).

Na década de 1960 ocorreu um movimento de unificação das legislações sociais que veio no sentido de unificar e padronizar o sistema de Assistência Social existente, sendo instituída a Lei n. 3.807, de 26.8.1960 ficando conhecida como a Lei Orgânica da Previdência Social (LOPS). Observa-se que anterior a ela existiu um intenso movimento legislativo, do qual Martinez (2003, p. 23) elucida:

Igualmente importantes são as leis criadoras dos ex-IAP. Convém não esquecer a Lei Orgânica do Seguro Social do Brasil (Decreto-lei n. 7.526/45 e Decreto n. 35.448/54) o Decreto-lei n. 7.036/44 dá grande impulso à proteção acidentária. O primeiro critério vinculando o salário mínimo é estabelecido pelo Decreto-lei n. 7.835/45. Surge o Departamento Nacional de Previdência Social (Decreto-lei n. 8.742/46). Em 1947 iniciam-se os estudos iniciais com vistas a LOPS. Em 1952 o auxilio-maternidade, no ex-IAPI. Em 1953 todas as CAPls são fundidas na CAPFESP (Decreto n. 32.667/53). Em 1957 é criado o SASSE (Lei n. 3.149/57). [... ] Com a Lei Orgânica da Previdência Social — LOPS (Lei n. 3.807/60) é dado grande passo.

Finalmente, como último grande acontecimento deste período, é criado o Instituto Nacional de Previdência Social (INPS) por meio do Decreto n. 72, de 21.11.1966 que unifica por completo todos os institutos de aposentadorias e pensões existentes no país, não sendo mais permitida a criação de institutos a parte (MARTINS, 2002, p. 36).

A década de 1970 também foi bastante profícua no sentido de evolução do sistema de proteção social. Dentre as legislações que se destacam podem ser enumeradas: criação do amparo previdenciário aos idosos com mais de 70 anos (Lei n. 6.179/74) erealização da primeira consolidação das leis da Previdência Social (Decreto n. 77.077/76) (MARTINS, 2002, p. 38).

Outra ocorrência que merece registro é a publicação da Lei n. 6.439/77 que instituiu o SINPAS (Sistema Nacional de Previdência e Assistência Social), visando a reorganização da Previdência Social, com a integração das gestões administrativa, financeira e patrimonial do Ministério da Previdência, bem como integrar os serviços de assistência médica e social. Tal sistema subdividia-se em várias instituições, que são: o INPS (que tinha como obrigação manter os benefícios e prestações previdenciá-rios); o INAMPS — Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social (responsável pela assistência médica); LBA — Legião Brasileira de Assistência (responsável pela prestação de assistência aos carentes); FUNABEM — Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor (responsável pelo bem-estar do menor); DATA-PREV — Empresa de Processamento de Dados da Previ-

Page 123

dência Social (responsável pela manutenção e processamento dos dados da Previdência); IAPAS — Instituto de Administração Financeira da Previdência Social (responsável pela arrecadação, fiscalização e cobrança das contribuições previdenciárias e assistenciais); e CEME — Central de Medicamentos (responsável pela distribuição de medicamentos gratuitamente ou a baixo preço) (MARTINS, 2002, p. 39).

No ano de 1974 constatamos a criação do Ministério da Previdência e Assistência Social (MPAS), demonstrando a...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT