Desafios à proteção de dados dos consumidores no cenário transfronteiriço interamericano

AutorCíntia Rosa Pereira de Lima, Newton De Lucca e Claudia Lima Marques
Páginas49-68
DESAFIOS À PROTEÇÃO DE DADOS
DOS CONSUMIDORES NO CENÁRIO
TRANSFRONTEIRIÇO INTERAMERICANO
Cíntia Rosa Pereira de Lima
Newton De Lucca
Claudia Lima Marques
Resumo: Na sociedade informacional, o tratamento de dados dos consumidores é marcado pelo
uso de tecnologias disruptivas que utilizam informações as quais circulam sem barreiras geograca-
mente denidas. Portanto, a preocupação de se garantir a efetiva proteção dos consumidores nesse
cenário é característica marcante em todos os sistemas de proteção de dados pessoais. A proteção da
pessoa natural consumidora, em relação ao processamento de dados pessoais, é direto fundamental
reconhecido em muitos países da América. Neste artigo, busca-se salientar a necessidade de uma
Convenção Interamericana de Proteção de Dados Pessoais a m de se alcançar a desejada uniformi-
zação sobre o tema e a garantia de direitos fundamentais na transferência interamericana de dados.
Palavras-chave: Direito fundamental à proteção de dados – Lei Geral de Proteção de Dados –
Consumidor – Direito Internacional Privado – Organização dos Estados Americanos (OEA).
Sumário: 1. Introdução – 2. Os princípios de proteção de dados da OEA: e a oportunidade de uma
convenção interamericana sobre proteção de dados pessoais – 3. Análise das regras sobre transfe-
rência internacional de dados pessoais consoante à defesa do consumidor – 4. O papel da ANPD para
atingir a harmonização das leis de proteção de dados pessoais – Considerações nais – Referências.
1. INTRODUÇÃO
Diante das características da sociedade informacional, sintetizadas de manei-
ra impecável por Manuel Castells,1 a saber: informacional, porque a produtividade
e competitividade depende da capacidade de gerar, processar e aplicar de maneira
eciente as informações baseadas no conhecimento cientíco e tecnológico; global,
porque a produção, a distribuição e o consumo são organizados em nível global e
1. CASTELLS, Manuel. e rise of the network society. 2 ed. Oxford: Blackwell, 2000. p. 147. v. I.
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com a interligação entre vários agentes da economia; interconectada (“networked”,
na expressão de Manuel Castells), porque as novas condições socioeconômicas
impõem a interconexão em redes entre as empresas.
Em outras palavras, quanto mais sólida for tal network, mais competitiva a
produção desses agentes econômicos será. Uma preocupação constante é assegurar a
ecácia das leis de proteção de dados pessoais, uma vez que tais informações são, quase
sempre, tratadas por controladores e operadores sediados em diferentes países, sendo
os dados pessoais armazenados em servidores cujo local nem sempre é conhecido.
É neste cenário de incertezas que as transferências de dados oriundas do
comércio eletrônico internacional de consumo2 e do comércio3 aumentam a
cada dia e a reação das cortes e países é alçar a direito fundamental a proteção
de dados pessoais e autodeterminação informativa dos consumidores, como na
decisão das ADIs 6.837, 6388, 6389, 6390 e 6393 do Supremo Tribunal Federal.4
Para criar maior conança,5 às Leis de proteção dos consumidores se unem leis
nacionais de proteção de dados pessoais, mas a coleta de dados com as novas
tecnologias de blockchain,6 smart7 contracts e predictive contracting8 desaam
estas leis, assim como sua rápida transferência internacional. 9
2. Veja, no Brasil, por todos, MARTINS, Guilherme Magalhães. Contratos eletrônicos de consumo, São
Paulo: Ed. Atlas, 2016, p. 42 e seg e, no cenário internacional, KOSYRA, Lea; DOMURATH, Irina.
Datenschutz und Rechtsdurchsetzung, in MICKLITZ, Hans et al (Hrsg.) Verbraucherrecht 2.0 – Ver-
braucher in der digitaler Welt. Baden-Baden: Nomos, 2017, p. 135- 172, p. 164.
3. Veja VIOLA, Mário. Transferência de dados entre Europa e Brasil: Análise da Adequação da Legislação
Brasileira, Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio, Acessível in Transferência de dados entre Europa
e Brasil: Análise da Adequação da Legislação Brasileira (itsrio.org) (15.11.2021).
4. MENKE, Fabiano. As origens alemãs e o signicado da autodeterminação informativa. In: MENKE,
Fabiano; VALLE DRESH, Rafael de Freitas. Lei Geral de Proteção de dados – Aspectos relevantes. In-
daiatuba: Ed. Foco, 2021, p. 13 e s.
5. Veja MARQUES, Claudia Lima. Conança no comércio eletrônico e o direito do consumidor: um estudo
dos negócios jurídicos de consumo no comercio eletrônico. São Paulo: Ed. RT, 2004, p. 31 e s.
6. Veja NALIN, Paulo; NOGOROLI, Rafaella. Inteligência articial, blockchain e smart contracts: breves
reexões sobre o novo desenho jurídico do contrato na sociedade da informação. In: BARBOSA,
Mafalda Miranda et al (Coord.). Direito digital e inteligência articial: diálogos entre Brasil e Europa.
Indaiatuba: Foco, 2021. p. 753 e s.
7. Veja FINCK, Michèle. Smart Contracts as a Form of Solely Automated Processing under the GDPR,
Max Planck Institute for Innovation and Competition Research Paper Series nr. 10-01, 8 jan. 2019,
Acessível in https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=3311370 (16.11.2021) e SKLAROFF,
Jeremy M. Smart Contracts and the Cost of Inexibility. University of Pennsylvania Law Review, Pen-
nsylvania, v. 166, p. 263-303, 2017. Acessível in: https://scholarship.law.upenn.edu/cgi/viewcontent.
cgi?article=1009&context=prize_papers. (16.11.2021). E no Brasil, MARTINS, Guilherme Magalhães;
FALEIROS JUNIOR, José Luiz de Moura. Reexões sobre contratos inteligentes (Smart contracts) e seus
principais reexos jurídicos. In: EHRDARDT JUNIOR, Marcos; CATALAN, Marcos; MALHEIROS,
Pablo (Coord.). Direito civil e tecnologia. Belo Horizonte: Fórum, 2020. p. 189-208.
8. Veja WILLIAMS, Spencer. Predictive Contracting, in Columbia Business Law Review, v. 2019, p. 621-695.
9. Veja sobre o tema da circulação transfronteiriça de dados, LIMA, Cíntia Rosa Pereira de. Autoridade
nacional de proteção de dados e a efetividade da Lei Geral de Proteção dos Dados. Coimbra: Almedina,
2020, p. 272 e s.
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