Formação Jurídico-Administrativa-Ética do Perito Médico

AutorRubens Cenci Motta
Páginas85-102
MANUAL DE INICIAÇÃO & CONCEITOS EM PERÍCIAS MÉDICAS 85
Capítulo 7
Capítulo 7
FORMAÇÃO JURÍDICO-ADMINISTRATIVA-
FORMAÇÃO JURÍDICO-ADMINISTRATIVA-
É
É
TICA DO PERITO MÉDICO
TICA DO PERITO MÉDICO
Como vimos, se o sistema judiciário brasileiro adotou a persuasão racional como forma de convencimen-
to, o que se tem como relevante a ser demonstrado aos Magistrados pelo Perito Médico são elementos que
possam evidenciar a tipificação do evento (culpa ou dolo), e não minúcias da técnica médica.
Interessante lembrar os Magistrados, tendo como base no Código Civil Francês, que apresentava ar-
gumentos que consistiam na afirmação de que os juízes não tinham conhecimento suficiente para julgar a
conduta médica, para facilitar memorização não custa aqui repetir a citação de Aguiar Dias (Ministro do Su-
perior Tribunal de Justiça), sobre “O erro de técnica”:
É apreciado com prudente reserva pelos tribunais. Com efeito, o julgador não deve nem pode en-
trar em apreciações de ordem técnica quanto aos métodos científicos que, por sua natureza, sejam
passíveis de dúvidas e discussões.
Na medicina, como em diversos outros setores no mundo contemporâneo, a busca de custos menores e
maior rentabilidade — medicina de grupo e a inevitável medicina de massa — é fator que concorre não apenas
para quebrar o trato digno e pessoal da ideal relação médico-paciente, hoje convertida em prestador-cliente,
mas também para levar a discussão ao judiciário, colocando o médico no banco dos réus, trazendo um novo
ente à relação, o intermediário — convênio médico, e no sistema público, o SUS.
O Perito Médico a isso não está sujeito por exercer atividade personalista e na qual não cabe intermedia-
ção. Todavia, infelizmente veem-se, em algumas varas trabalhistas e juizados federais, nomeações de “peritos”
em massa, sem que se exija melhor qualificação, trabalhando sob precárias condições em gabinetes adminis-
trativos. Afirma-se para justificar ser esta uma justiça com fins céleres, com o que concordamos parcialmente,
porém não concordamos e nem queremos admitir que possa existir uma Justiça que incorre em riscos de ter
prova técnica menos qualificada.
Como se percebe por efeito decorrente de medidas inadequadas em alguns setores de saúde, que
priorizam atender em quantidade e não com qualidade, estamos diante da crise brasileira (mundial) no setor
médico. Precisamos evitar que mais esta “crise” atinja o judiciário. A melhor medida nos parece ser a da boa
formação técnica de Peritos Médicos, com o que as Escolas Judiciais, dos diversos tribunais, podem diretamen-
te influenciar, facilitando, viabilizando e estimulando que mais médicos busquem esta qualificação. Isso feito,
não tenho dúvidas que, logo haverá bons Peritos Médicos para a ideal celeridade processual com qualidade
técnica que o judiciário brasileiro (de alta qualificação) merece.
O Ato Médico ideal, prática da boa relação médico-paciente, sempre será avaliado verificando se o profis-
sional violou ou não o dever de cuidado que o caso impunha e se sua atuação contribuiu aumentando o risco,
além do que as regras técnicas — inclusive as médico-legais. Assim, devemos considerar tanto para o médico
nas suas atribuições do dia a dia, decorrente da relação médico-paciente, aqui incluído o Médico do Trabalho,
mas também para o Perito Médico, quer seja na área judiciária ou administrativa, mesmo que não sujeito a
relação médico-paciente, haverá responsabilidades médico-judiciárias e/ou médico-administrativas.
7.1. PERITO MÉDICO — MÉDICO DO TRABALHO — ASSISTENTE TÉCNICO
O Perito Médico, quando atua na qualidade de Assistente Técnico, ao que se refere à falta de impedi-
mentos para atuação, como já vimos, na qualidade de médico, deve sempre ponderar pela obrigatória forma
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ética da atuação. Se é certo que o médico deve observar, cumprir e responder pelo que determinam os CFM
e Regionais de Medicina (por exemplo, CREMESP — Estado de São Paulo), também os Médicos do Trabalho
e os Peritos Médicos devem cumprir o que se tem determinado nas suas resoluções regionais. Vejamos uma
Resolução do CREMESP — n. 76, de 2 de julho de 1996:
Art. 7º Caberá aos médicos do trabalho (como tal reconhecidos por Lei), especialmente aqueles que atuem na empresa como
contratados, assessores ou consultores em saúde do trabalhador: a) A corresponsabilidade com os outros médicos que atuem
na empresa e que estejam sob sua supervisão, por todos os procedimentos que envolvam a saúde do trabalhador, proteção à
sua saúde. b) A responsabilidade solidária com o empregador, no caso de agravos à saúde desses trabalhadores.
Art. 14° O médico de empresa, o médico responsável por qualquer Programa de Controle de Saúde Ocupacional de Empresa e
o médico participante do Serviço Especializado em Segurança e Medicina do Trabalho, não podem ser peritos judiciais, securi-
tários ou previdenciários, ou assistentes-técnicos da empresa, em casos que envolvam a firma contratante e/ou seus assistidos
(atuais ou passados).
Embora nos pareça que em tal resolução, notadamente no item b), o CREMESP tenha ultrapassado seus
limites de atuação, entendo que é certo no contexto técnico exigir tal responsabilização e, desta feita, desde
1996 o médico no Estado de São Paulo, para o cumprimento ético da sua atividade no campo pericial e/ou da
assistência técnica, já tinha manifesta pelo seu órgão de classe a determinação, trazendo critérios de impedi-
mentos. Em 1998, o CFM normatiza em nível nacional a questão:
Resolução n. 1.488/98 — Art. 12. O médico de empresa, o médico responsável por qualquer Programa de Controle de Saúde
Ocupacional de Empresas e o médico participante do Serviço Especializado em Segurança e Medicina do Trabalho não podem
ser peritos judiciais, securitários ou previdenciários, nos casos que envolvam a firma contratante e/ou seus assistidos (atuais ou
passados).
Nova manifestação é apresentada pelo CREMESP no ano de 2005, pois embora aos olhos dos órgãos de
classe “Perito Médico” fosse designação genérica que incluía o Perito e o Assistente Técnico, houve dúvidas
que culminaram com nova manifestação na Resolução n. 126, de 31 de outubro de 2005:
Art. 1º Perito médico é a designação genérica de quem atua na área médica legal, realizando exame de natureza médica em
procedimentos administrativos, e processos judiciais, securitários ou previdenciários; atribuindo-se esta designação ao médico
investido por força de cargo/função pública, ou nomeação judicial ou administrativa, ou ainda por contratação como assistente
técnico das partes. Art. 2º As causas de impedimentos e suspeição aplicáveis aos auxiliares da Justiça se aplicam plenamente
aos peritos médicos. § 1º É vedado ao médico do trabalho de empresa/instituição atuar como perito ou assistente técnico em
processo judicial ou procedimento administrativo envolvendo empregado/funcionário ou ex-empregado/funcionário da mesma
empresa. § 3º Constitui infração ética expressa no art. 120 do Código de Ética Médica, Resolução CFM n. 1.246/88, o médico
ser perito ou assistente técnico em processo judicial ou procedimento administrativo, envolvendo seu paciente ou ex-paciente.
Essa manifestação regional — Estado de São Paulo — trouxe a necessidade de uma manifestação em nível
nacional — CFM — que surge em 2006 na Resolução n. 1.810/2006, que altera o art. 12 da Resolução CFM
n. 1.488, de 11 de fevereiro de 1998, publicada em 6 de março de 1998, que normatiza a Perícia Médica e
a atuação do Perito Médico e do Assistente Técnico: Art. 1º O art. 12 da Resolução CFM n. 1.488 de 11 de
fevereiro de 1998, passa a vigorar com a seguinte redação:
Art. 12º O médico de empresa, o médico responsável por qualquer programa de controle de saúde ocupacional de empresa e
o médico participante do serviço especializado em Segurança e Medicina do Trabalho não podem atuar como peritos judiciais,
securitários, previdenciários ou assistentes técnicos, nos casos que envolvam a firma contratante e/ou seus assistidos (atuais ou
passados).
Assim, em 2007, o CREMESP faz reforma na Resolução n. 126/2005 e confirma o que já se determinava
como impedimentos aos Assistentes Técnicos, alterada pela Resolução n. 167, de 25 de setembro de 2007:
RESOLVE: Art. 1º Perito médico é a designação genérica de quem atua na área médica legal, realizando exame de natureza mé-
dica em procedimentos administrativos, e processos judiciais, securitários ou previdenciários; atribuindo-se esta designação ao
médico investido por força de cargo/função pública, ou nomeação judicial ou administrativa, ou ainda por contratação como
assistente técnico das partes. Art. 2º As causas de impedimentos e suspeição aplicáveis aos auxiliares da Justiça se aplicam
plenamente aos peritos médicos. § 1º É vedado ao médico do trabalho de empresa/instituição atuar como perito ou assis-
tente técnico em processo judicial ou procedimento administrativo envolvendo empregado/funcionário ou ex-empregado/
funcionário da mesma empresa. § 3º Constitui infração ética expressa no art. 120 do Código de Ética Médica, Resolução CFM
n. 1.246/88, o médico ser perito ou assistente técnico em processo judicial ou procedimento administrativo, envolvendo seu
paciente ou ex-paciente.
Por ser significativa esta questão para os médicos, o novo Código de Ética Médica, vigente desde abril de
2010, traz de forma expressa esta vedação na Resolução CFM n. 1.931/2009:

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