A preclusão na produção de provas no âmbito do processo administrativo fiscal federal - uma análise crítica da jurisprudência do carf

AutorCarlos Augusto Daniel Neto e Diego Diniz Ribeiro
Páginas397-428
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A PRECLUSÃO NA PRODUÇÃO DE PROVAS NO
ÂMBITO DO PROCESSO ADMINISTRATIVO
FISCAL FEDERAL – UMA ANÁLISE CRÍTICA DA
JURISPRUDÊNCIA DO CARF
Carlos Augusto Daniel Neto1
Diego Diniz Ribeiro2
Introdução
No âmbito do processo administrativo fiscal federal
(PAF ), inaugurado pela apresentação de impugnações ou
1. Doutor em Direito Tributário pela Universidade de São Paulo; Mestre em Direito
Tributário pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo; Especialista em Di-
reito Tributário pelo IBET/SP; ex-Conselheiro Titular da 1ª Seção do Conselho Ad-
ministrativo de Recursos Fiscais – CARF; ex-Conselheiro da 3ª Seção do CARF;
Advogado; Professor do Centro de Estudos de Direito Econômico e Social (CEDES)
e do Instituto Brasileiro de Direito Tributário (IBDT). E-mail: carlosaugustodaniel-
neto@gmail.com.
2. Doutorando em Processo Civil pela Universidade de São Paulo; Mestre em Direi-
to Tributário pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP. Espe-
cialista em Direito Tributário pelo IBET/SP. ex-Conselheiro titular na 3ª Seção de
Julgamento do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais – CARF. Advogado li-
cenciado. Professor em cursos de graduação e pós-graduação na GV Law, IBET,
IBDT, EPD, ESA/SP, ESPGE e IMESB.
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PROCESSO ADMINISTRATIVO TRIBUTÁRIO
outros meios de recurso administrativo pelo contribuinte3-4, a
temática da produção de provas é objeto de diversos questio-
namentos: discutem-se quais provas podem ser produzidas, a
utilização das provas produzidas em outros processos admi-
nistrativos ou judiciais etc.
Entretanto, nenhuma matéria é objeto de tantas discus-
sões quanto o limite temporal para a apresentação das pro-
vas e as limitações normativas estabelecidas pelo Decreto nº
70.235/72, que regulamenta esse contencioso administrativo
fiscal, na esfera federal. Discute-se, principalmente, até onde
vai a preclusão temporal para a juntada de documentos ou,
indo além, questiona-se a própria existência de limitação nes-
sa espécie de procedimento contencioso.
Sobre essa matéria, a jurisprudência do Conselho Admi-
nistrativo de Recursos Fiscais (CARF)5 tem se direcionado no
sentido de que as limitações temporais à produção de provas
podem ser flexibilizadas, invocando-se, para tanto, diversos
argumentos distintos, como a interpretação sistemática da le-
gislação, o princípio da verdade material, a aplicação direta da
Lei 9.784/99, entre outros que serão oportunamente analisados.
Este artigo tem como escopo realizar uma análise crítica
dos argumentos que têm sido utilizados para a flexibilização
da preclusão temporal, como forma de verificar a consistência
deles, à luz do ordenamento jurídico. Antes disso, entretanto,
é preciso explicitar qual é o regime jurídico da produção de
provas no PAF.
3. Nos termos do art. 14 do Decreto n. 70.235/72, verbis: “Art. 14. A impugnação da
exigência instaura a fase litigiosa do procedimento.
4. Até o advento da insurgência do contribuinte o que se tem é uma fase procedi-
mental. A respeito desta diferença entre procedimento administrativo e processo
administrativo destacam-se: ROCHA, Sérgio André. Processo administrativo fiscal.
São Paulo: Almedina, 2018. MARINS, James. Direito processual tributário brasileiro
– administrativo e judicial. 3ª ed. São Paulo: Dialética., 2003.
5. O CARF é o órgão administrativo que julga, em última instância, os recursos ad-
ministrativos de decisões proferidas pelas Delegacias Regionais de Julgamento da
Receita Federal (DRJs), dentro do processo administrativo fiscal federal.
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NOVOS RUMOS DO PROCESSO TRIBUTÁRIO:
Judicial, Administrativo e Métodos Alternativos de Cobrança do Crédito Tributário
1. A Produção de Provas no Âmbito do PAF
É essencial, posto que trivial, afirmar aqui que a rele-
vância do processo administrativo no ordenamento jurídico
pátrio é ratificada pela presença de elementos do seu regime
jurídico no âmbito da Constituição Federal de 1988 (CF/88),
especialmente no seu art. 5º, incisos LIV e LV6 que impõem,
mesmo no âmbito administrativo, respeito ao devido processo
legal e garantia da ampla defesa e do contraditório, com todos
os meios e recursos a eles inerentes.
Com base na competência delegada por meio do Decre-
to-Lei 822/69, em seu art. 2º7, foi editado o Decreto 70.235/72,
que rege todo o processo administrativo de determinação e
exigência dos créditos tributários da União e o de consulta so-
bre a aplicação da legislação tributária federal. Frise-se que,
apesar do veículo normativo de introdução dessa regulamen-
tação ter sido um Decreto Federal, o mesmo possui natureza
jurídica de Lei Ordinária – excepcionalmente, diga-se de pas-
sagem, em razão do regime vigente na época de sua edição,
que autorizou a edição de decreto com força normativa de lei.
Pois bem. O regime de ampla defesa a que se sujeita o PAF
engloba, naturalmente, o instituto das provas8, entendidos como
quaisquer elementos, autorizados pelo Direito9, que possam
6.
“LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal;
LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são
assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;”
7. “Art. 2º O Poder Executivo regulará o processo administrativo de determinação e
exigência de créditos tributários federais, penalidades, empréstimos compulsórios
e o de consulta.”
8. Em um chamado Estado Democrático de Direito, onde vige a ideia de devido pro-
cesso legal, o instituto da prova no processo não trata apenas da (i) oportunidade
atribuída às partes de requisitarem a produção de uma específica prova. Vai para
além disso para também abarcar os seguintes direitos: (ii) havendo pertinência com
o caso, ter a prova efetivamente produzida em concreto; (iii) ter a possibilidade par-
ticipar da produção da prova; (iv) ser intimado para manifestar-se a respeito das
provas; e, por fim (v) ter a prova produzida efetivamente analisada pelo órgão julga-
dor por intermédio da decisão que resolverá o caso.
9. Veda-se, assim, a admissibilidade de provas ilícitas, conforme determina o art. 5º,
LVI da CF/88.

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