A sociedade da informação e cibercultura

AutorBruno Zampier
Páginas11-45
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A SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO
E CIBERCULTURA
2.1. Considerações Gerais
Uma sociedade na qual não se conhece mais o conceito de fron-
teiras, transmudando-se a noção de liberdade, poder, comunicação e
democracia. Assim se caracteriza a sociedade da informação, impulsio-
nada pela notável revolução tecnodigital operada nas últimas décadas.
Inicialmente, há que se destacar que muitas expressões têm sido
cunhadas a f‌im de se denominar o atual momento social, tais como:
a) “era do virtual” (BAUDRILLARD, 2002);
b) “sociedade midiatizada” (FAUSTO NETO, 2007);
c) “hipermodernidade” (LIPOVETSKY, 2004),
d) “sociedade em rede” (CASTELLS, 2019); apenas para citar algumas.
Entretanto, por detrás dessa diversidade de expressões, é possível
identif‌icar um forte elemento comum: a inf‌luência das novas tecnolo-
gias da comunicação e da informação. Daí a predileção pela expressão
igualmente consagrada; a sociedade da informação.
Vive-se já há alguns anos uma verdadeira cibercultura, para se
valer da expressão cunhada por Pierre Lévy, a partir da imersão coletiva
em um ciberespaço, ou seja, um espaço de comunicação aberto pela
interconexão mundial dos computadores e das memórias destes. São
inúmeros os modos de interação possibilitados por este ciberespaço,
tornando-o atualmente o principal canal de comunicação e suporte
de memória da própria humanidade (LÉVY, 1999a).
Na sociedade da informação, a velocidade de transformação é
uma constante. Os integrantes dessa sociedade são invariavelmente
tomados por uma certa estranheza, sempre que sentem os impac-
tos das mudanças promovidas, especialmente ao tentar entender o
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movimento contemporâneo das técnicas. Não há um sujeito sequer
que não se sinta surpreendido ou ultrapassado rotineiramente, pois
é impossível participar e se inteirar de todas as transformações ope-
radas. É comum ser tomado por uma certa perplexidade diante de
um até então impensado aplicativo para telefones, um novo recurso
desenvolvido para computadores ou um serviço inédito, que vem a
quebrar os rígidos paradigmas existentes.
A cada minuto, novas pessoas se interconectam, outras infor-
mações são inseridas no ciberespaço, dando a este mais e mais um
caráter universal, sem qualquer chance de se fechar em um conteúdo
particularizado. O que é possível ser encontrado neste espaço ciber-
nético que norteia a sociedade da informação? Simplesmente tudo.
Trata-se de um universo indeterminável, em constante expansão, um
verdadeiro labirinto pelo qual navega a informação, o conhecimento,
sem qualquer signif‌icado ou temática principal.
Evidentemente, este conjunto de acontecimentos acaba por im-
pactar a vida social, política e cultural dos povos. Os hábitos, formas
de manifestação do pensamento, de diversão e prazer são modif‌icados
em virtude da digitalização e do veloz compartilhamento das infor-
mações. O ser humano imerso na cibercultura tende, tal como esta,
à universalização, pela interconexão das informações, das máquinas
e do próprio homem.
Resumindo bem este caráter universal, Pierre Lévy (1999a)
assevera que
A cibercultura dá forma a um novo tipo de universal: o universal sem
totalidade. E, repetimos, trata-se ainda de um universal, acompanhado
de todas as ressonâncias possíveis de serem encontradas com a losoa
das luzes, uma vez que possui uma relação profunda com a ideia de hu-
manidade. Assim, o ciberespaço não engendra uma cultura do universal
porque de fato está em toda parte, e sim porque sua forma ou sua ideia
implicam de direito o conjunto dos seres humanos. (LÉVY, 1999a, p. 119).
Esta cultura ligada à tecnologia realmente se aplica e envolve to-
dos os seres humanos, independentemente do local onde o indivíduo
esteja localizado. Seu lugar poderá inf‌luenciar no grau de percepção
destes avanços, mas jamais o tornará um sujeito indiferente às mu-
danças. Este é precisamente o dado universalizante deste momento
social ora vivido.
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A SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO E CIBERCULTURA
Os sistemas de computadores espalhados ao redor do mundo
talvez estejam conseguindo alcançar um sonho antigo da humanida-
de: falar uma mesma língua. Sim, o planeta está caminhando para a
construção de uma unidade de linguagem, algo crucial para a própria
mudança da ordem social e que marcaria, uma vez mais, a criação desta
citada cibercultura. Dissertando sobre este ponto, Marcello Casado
D’Azevedo (1972) relembra que
Toda a cultura engloba e necessita de uma linguagem. Sem a linguagem,
dicilmente progride ou mesmo se estabelece qualquer forma de cul-
tura. Ela é de certa forma o fundamento dos processos culturais, a partir
dos mais simples, até os mais sosticados (D’AZEVEDO, 1972, p. 73).
Além deste caráter universal, que como visto alcançaria até
mesmo a linguagem, a cibercultura tende também à construção de
uma sociedade ainda mais plural, diversif‌icando-se os sentidos a par-
tir das possibilidades de difusão da informação e do conhecimento.
Sem sombra de dúvidas, o novo momento é intensamente aberto à
autonomia individual e à alteridade. Ao alimentar a interconexão de
pessoas e dados, o sujeito está mais propenso à sua autorrealização no
ciberespaço que em outras épocas, quando vivia praticamente como
um prisioneiro da cultura e moral do local em que habitava. Ao mesmo
tempo, amplia-se a percepção do outro, das diferenças que porventura
estejam presentes, reconhecendo-se a partir da existência alheia.
Seguindo o pensamento hegeliano, o ser humano é capaz de ser
consciente de si, direcionando o que ele é e o que ele quer ser, tendo,
ainda, consciência também sobre o outro. A partir desta conjugação,
surgiria a consciência social. O ser se reconhece a partir do outro, no
embate com este alguém que está fora. O reconhecimento seria uma
via de mão dupla (HEGEL, 2011). Nesta linha de entendimento, o
ciberespaço amplia notavelmente a visão sobre o outro, ressalta as
diferenças, cria uma maior percepção da realidade e, portanto, fornece
maiores possibilidades de desenvolvimento da noção de alteridade.
Em seu ensaio sobre a história da sociedade da informação,
Armand Mattelart, ressaltando a velocidade desta nova era, af‌irma
que não há nada que não seja obsoleto, pois o determinismo tecno-
comercial geraria uma modernidade amnésica e que dispensaria o
projeto social. Tal estado de coisas faria com que a lenta acumulação
histórica das sociedades se visse fortemente desaf‌iada. Entretanto,
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