Teoria Geral do Direito do Trabalho

AutorCarlos Roberto Husek
Ocupação do AutorDesembargador da Justiça do Trabalho
Páginas39-61
CURSO BÁSICO DE DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO E PRIVADO DO TRABALHO
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CAPÍTULO IV
TEORIA GERAL DO
DIREITO DO TRABALHO
O Direito do Trabalho é um sistema de regras que também teve na sua ges-
tação inicial a peça do instrumento criado para infligir tortura àquele que labora
(tripalium). Assim, sua conceituação normalmente leva em conta elementos sociais
e psicológicos que não se acomodam bem, dentro de proposições compostas de ele-
mentos estritamente jurídicos. O ramo do Direito do Trabalho é um dos que mais
recebem influências fora daquilo que se considerou, durante muito tempo, a pureza
do Direito (Teoria Pura do Direito, Kelsen). Desse modo, para cumprir tal tarefa (a
da conceituação) precisamos ter em mente, com algum esforço, a exata noção de seu
campo, abrangência e institutos específicos. Há uma antiga regra metodológica que
afirma não ser possível iniciar o estudo de uma disciplina sem antes defini-la. Segui-
mos tal regra em parte, porque preferimos, como se viu, conceituar o Direito, para não
sermos cobrados de elementos mais rígidos, que necessariamente devem compor uma
definição. É o que vamos tentar fazer.
Alguns autores consideram o Direito do Trabalho como o conjunto de normas e
princípios relativos ao empregado e ao empregador, no contrato individual do traba-
lho. Outros acrescentam a essa ideia os interesses coletivos.
Há aqueles que, além de tais interesses, especificam as relações com o Estado
no plano do controle da observância de seu conteúdo de ordem pública, como José
Augusto Rodrigues Pinto, no Curso de Direito Individual do Trabalho (4. ed., LTr).
Amauri Mascaro Nascimento divide as definições em subjetivistas, objetivistas
e mistas. Doutrina o conceituado jurista que as primeiras consideram os sujeitos
das relações jurídicas. As segundas consideram o objeto e não as pessoas, e as mistas
abrangem pessoas e objeto (Curso de Direito do Trabalho, 3. ed., Saraiva).
Os ensinamentos são preciosos e deles não discordamos. Não nos atrevemos a
ampliá-los, ante o objetivo desta obra e a complexidade da tarefa.
Antes de tudo, deixemos bem claro que o Direito do Trabalho não é só um con-
junto de regras, mas, também, de princípios. Princípios dizem respeito à origem das
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CARLOS ROBERTO HUSEK
coisas. Concretizam-se numa espécie de lei, porque têm caráter geral. São, na verdade,
vetores, direcionamentos para o aplicador da norma, e servem também como elemen-
tos que objetivam resolver questões não previstas em lei, como especifica o art. 4o da
Lei de Introdução: “Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a
analogia, os costumes e os princípios gerais do direito”, e o art. 8o da Consolidação das
Leis do Trabalho: “As autoridades administrativas e a Justiça do Trabalho, na falta de
disposições legais ou contratuais, decidirão, conforme o caso, pela jurisprudência, por
analogia, por equidade e outros princípios e normas gerais de direito, principalmente,
do direito do trabalho, e, ainda, de acordo com os usos e costumes, o direito compa-
rado, mas sempre de maneira que nenhum interesse de classe ou particular prevaleça
sobre o interesse público.
Vamos, então, estabelecer a verdadeira dimensão desse ramo do Direito, que se
serve de princípios e normas, próprios do Direito do Trabalho, bem como da ana-
logia e dos costumes, para aclarar a área de incidência das relações jurídicas entre
empregados e empregadores e localizar, dentre as relações jurídicas decorrentes de
um contrato, aquela que podemos denominar contrato de trabalho, individual ou
coletivo, bem como outras relações jurídicas, institutos e figuras, que encontram neste
campo instrumentos férteis de estudos, em consequência da lei.
Aí temos uma noção que busca captar o fenômeno fático-jurídico dentro da ór-
bita desse, ainda, novel ramo do Direito. Observe-se que não se trata de uma definição
que requer termos precisos, delimitando com clareza o campo que se estuda. Não é o
caso. Nem é possível.
Conceituar é mais razoável porque significa dar as características gerais, ilumi-
nando o terreno que envolve toda a matéria. O conceito é uma forma de captar de
maneira generalizada a realidade. Difícil definir, com a obrigação intrínseca de pre-
cisar os limites conotativos e denotativos de um termo ou de uma expressão. Além
do mais, prevalece, em relação às definições, a tese nominalista, que nega que possa
existir uma relação natural entre as palavras e aquilo que elas pretendem significar,
como ensina Luis Alberto Warat. Diz o renomado jurisfilósofo: “As modernas cor-
rentes da teoria geral sustentam que as pretensões de constituição de definições reais,
para os termos de direito, refletem atitudes ideológicas encobertas, porque, encer-
rando intenções retóricas, são formas argumentativas através das quais se pretende
identificar a realidade com nossos ideais valorativos. Dessa forma seriam desqualificados,
por irreais, todos os modelos ideológicos que contrariarem essas definições. Por cer-
to, como as definições reais se constituem baseadas na intuição e não em critérios
contrastáveis intersubjetivamente, cada ideologia pode sustentar o caráter essencial
de seus conceitos, transportando-se, desse modo, a luta ideológica para o plano das
definições. As ideologias rivais teriam, assim, intuições falsas sobre as essências.”(12)
Não podemos escapar dessa cilada, porque vivemos no mundo do Direito, um mundo
de definições, embora nominalistas, como mais razoáveis, que também competem,
(12) WARAT, Luis Alberto. A definição jurídica. Porto Alegre: Atrium, 1977. p. 18.

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