Valorização dos precedentes e compensação tributária: implicações com o código de processo civil de 2015

AutorRodrigo G. N. Massud
Ocupação do AutorMestre em Direito Tributário pela PUC-SP. Pós-Graduado em Direito Processual Civil e em Direito Tributário pela PUC-SP
Páginas141-178
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VALORIZAÇÃO DOS PRECEDENTES E
COMPENSAÇÃO TRIBUTÁRIA: IMPLICAÇÕES
Rodrigo G. N. Massud1
Sumário: 1. Introdução – 2. A valorização dos precedentes sob
distintas perspectivas – 3. Considerações sobre o sistema stare
decisis e a valorização dos precedentes no CPC/2015: a transub-
jetivização dos julgados – 4. Evolução dos conceitos de liquidez
e certeza – 5. O atual quadro interpretativo da administração
fazendária federal – 6. Implicações dos precedentes em matéria
de compensação para os contribuintes que: (i) não possuem ação
judicial; (ii) possuem ação não transitada em julgado; e (iii) pos-
suem trânsito em julgado desfavorável – 7. Conclusões.
1. Introdução
O tema valorização dos precedentes no CPC/2015 suscita
uma infinidade de pautas teóricas que, desde logo, despertam
variadas provocações, seja no campo dogmático, seja no alti-
plano filosófico, com desdobramentos pragmáticos nos mais
diferentes assuntos.
1. Mestre em Direito Tributário pela PUC-SP. Pós-Graduado em Direito Processual
Civil e em Direito Tributário pela PUC-SP/COGEAE. Professor no IBET e na PUC-
-SP/COGEAE. Advogado.
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PROCESSO TRIBUTÁRIO ANALÍTICO
Nesse sentido, verificamos as atuais discussões em torno
da assim provocativamente chamada “commonlawnização”
do nosso direito e da racionalidade imposta por tal fenômeno,
afetando o estudo de categorias filosóficas e de teoria geral,
como é o caso, por exemplo, da gnosiologia (estudo do conhe-
cimento), dos métodos científicos (dedutivo, indutivo e abdu-
tivo), das fontes do direito e seus modos de produção, modifi-
cação e extinção, da teoria da norma e da validade, vigência e
eficácia, da hierarquia, da análise das relações de coordena-
ção e subordinação, das teorias da interpretação e incidência,
da segurança jurídica por meio da unidade, coerência e com-
pletude do sistema, dentre tantos outros.
Diante dessa potencialidade expansiva do tema valoriza-
ção dos precedentes, não é difícil imaginar as repercussões
que certamente exerce em matéria de compensação tributá-
ria, instituto vocacionado à extinção de uma dupla e recíproca
relação jurídica: (i) a do Fisco em face do contribuinte, que
tem por objeto a obrigação tributária; e (ii) a do contribuinte
em face do Fisco, que tem por objeto o indébito tributário,
numa autêntica inversão entre sujeito pretensor (aquele que
detém o direito subjetivo) e pretendido (aquele que, por sua
vez, detém o dever jurídico estabelecido no consequente da
norma primária dispositiva).
Em termos lógicos, tem-se que o denominado indébi-
to tributário2 é condição necessária, mas não suficiente,3
2.
Cujos contornos, em termos gerais e abstratos, estão qualificados no art. 165 do CTN:
“Art. 165. O sujeito passivo tem direito, independentemente de prévio protesto, à
restituição total ou parcial do tributo, seja qual for a modalidade do seu pagamento,
ressalvado o disposto no § 4º do artigo 162, nos seguintes casos: I – cobrança ou pa-
gamento espontâneo de tributo indevido ou maior que o devido em face da legisla-
ção tributária aplicável, ou da natureza ou circunstâncias materiais do fato gerador
efetivamente ocorrido; II – erro na edificação do sujeito passivo, na determinação
da alíquota aplicável, no cálculo do montante do débito ou na elaboração ou confe-
rência de qualquer documento relativo ao pagamento; III – reforma, anulação, re-
vogação ou rescisão de decisão condenatória.”
3.
“Em outras palavras, uma condição necessária aparece como consequente de um
condicional. [...] uma condição suficiente aparece como o antecedente de um condi-
cional.” (HEGENBERG, Leônidas. Dicionário de lógica. São Paulo, EPU, 1995, p. 39).
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PROCESSO TRIBUTÁRIO ANALÍTICO
da compensação, fato esse refletido nos arts. 170 e 170-A do
CTN,4 os quais impõem limitações e restrições à sua plena
compensabilidade.5
Desse modo, ao mesmo tempo em que a compensação
pressupõe alguma espécie de indébito, não é qualquer indébi-
to que autoriza a compensação, como se percebe na vedação
dos indébitos tributários objeto de acertamento judicial ainda
não transitado em julgado, sob o pressuposto interpretativo
de que não deteriam liquidez e certeza.
Portanto, é com olhos na relação de indébito tributário
e na evolução do conceito de liquidez e certeza que preten-
demos, a partir da valorização dos precedentes e dos efeitos
concretos produzidos pelas alterações do CPC/2105, conduzir
nossas conclusões.
2.
A valorização dos precedentes sob distintas perspectivas
Em recente artigo publicado pela Fiscosoft,6 tratamos
da valorização dos precedentes e dos efeitos dos julgamentos
4. Art. 170. A lei pode, nas condições e sob as garantias que estipular, ou cuja estipu-
lação em cada caso atribuir à autoridade administrativa, autorizar a compensação
de créditos tributários com créditos líquidos e certos, vencidos ou vincendos, do
sujeito passivo contra a Fazenda pública. (Vide Decreto 7.212, de 2010)
Parágrafo único. Sendo vincendo o crédito do sujeito passivo, a lei determinará,
para os efeitos deste artigo, a apuração do seu montante, não podendo, porém, co-
minar redução maior que a correspondente ao juro de 1% (um por cento) ao mês
pelo tempo a decorrer entre a data da compensação e a do vencimento.
Art. 170-A. É vedada a compensação mediante o aproveitamento de tributo, objeto
de contestação judicial pelo sujeito passivo, antes do trânsito em julgado da respec-
tiva decisão judicial. (Incluído pela LC 104, de 2001).
5. Nesse sentido, existem outras compensações não necessariamente fundadas em
indébito tributário, como é (era) o caso das restritas hipóteses de compensação de
ofício com precatórios (hoje já declarada inconstitucional na ADI 4357), ou mesmo
do poder liberatório do pagamento de tributos conferido a determinados precató-
rios, tudo nos termos do artigo 100 da Constituição Federal e art. 78 do ADCT.
6. MASSUD, Rodrigo G. N. “Coisa julgada, Rescisória, Súmula STF 343 e Parecer
PGFN 492/2011: impactos com o Código de Processo Civil de 2015.” In CONRADO,
Paulo Cesar; e ARAUJO, Juliana Furtado Costa (coordenadores), O Novo CPC e seu
impacto no Direito Tributário. São Paulo: Fiscosoft, 2015.

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