O direito ao esquecimento na internet

AutorGuilherme Magalhães Martins
Páginas65-96
4
O DIREITO AO ESQUECIMENTO
NA INTERNET
Guilherme Magalhães Martins
Tudo que se passa no onde vivemos é em nós que se passa. Tudo que cessa no que
vemos é em nós que cessa. (Fernando Pessoa)
Sumário: 1 A sociedade da informação e a proteção dos direitos fundamentais. 2 Direito
ao esquecimento, privacidade e autodeterminação informativa. As tecnologias e a memória.
3 Modalidades de exercício do direito ao esquecimento. 4 Aplicação do instituto na juris-
prudência dos Tribunais Superiores. 5 Conclusão. Referências.
1. A SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO E A PROTEÇÃO DOS DIREITOS
FUNDAMENTAIS
Nos últimos anos, o conceito de sociedade da informação adquiriu importância em
escala mundial, fundamentado na crença de que sua consolidação favorece a integração
global nos diferentes aspectos da vida humana: na economia, no conhecimento, na cul-
tura, no comportamento humano e nos valores.
A expressão sociedade da informação1 surgiu na Europa, na conferência internacio-
nal de 1980, onde a Comunidade Econômica Europeia reuniu estudiosos para avaliar
o futuro de uma nova sociedade assim denominada, tendo em vista a regulamentação
da liberdade de circulação de serviços e medidas para a implementação de acesso aos
bens e serviços por parte dos Estados membros. Foi então utilizada pela primeira vez a
expressão TIC – Tecnologias da Informação e Comunicação.
Manuel Castells destaca os aspectos centrais do paradigma da sociedade da infor-
mação, que representam sua base material:
A primeira característica do novo paradigma é que a informação é sua matéria-prima: são tecnologias
para agir sobre a informação, não apenas informação para agir sobre a tecnologia [...]
O segundo aspecto refere-se à penetrabilidade dos efeitos das novas tecnologias. Como a informação é
uma parte integral de toda atividade humana, todos os processos de nossa existência individual e cole-
tiva são diretamente moldados (embora, com certeza, não determinados) pelo novo meio tecnológico.
1. Para José de Oliveira Ascensão, a sociedade da informação abrange elementos relativos a programas de computador,
circuitos integrados, bases de dados eletrônicas e utilização de obras por computador. A base universal de todos esses
fenômenos é a digitalização. É esta que permite o aparecimento de novos bens, como os produtos multimídia. Não se
trata, para o autor, de um conceito técnico, mas de um slogan. Nas suas palavras, “melhor até se falaria em sociedade
da comunicação, e só num sentido muito lato se pode qualif‌icar toda mensagem como informação” (ASCENSÃO,
José de Oliveira. Direito da Internet e da sociedade da informação. Rio de Janeiro: Forense, 2001. p. 67).
EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 65EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 65 31/03/2021 16:10:0031/03/2021 16:10:00
GUILHERME MAGALHÃES MARTINS
66
A terceira característica refere-se à lógica de redes em qualquer sistema ou conjunto de relações,
usando essas novas tecnologias da informação. A morfologia da rede parece estar bem adaptada à
crescente complexidade da interação e aos modelos imprevisíveis do desenvolvimento derivado do
poder criativo dessa interação [...]
Em quarto lugar, referente ao sistema de redes, mas sendo um aspecto claramente distinto, o paradigma
da tecnologia da informação é baseado na exibilidade. Não apenas os processos são reversíveis, mas
organizações e instituições podem ser modicadas, e até mesmo fundamentalmente alteradas, pela
reorganização de seus componentes [...] Torna-se possível inverter as regras sem destruir a organização,
porque a base material da organização pode ser reprogramada e realterada [...]
Então, uma quinta característica dessa revolução tecnológica é a crescente convergência de tecnolo-
gias especícas para um sistema altamente integrado, no qual trajetórias tecnológicas antigas cam
literalmente impossíveis de se distinguir em separado. Assim, a microeletrônica, as telecomunicações,
a optoeletrônica e os computadores são todos integrados nos sistemas de informação.2
A sociedade da informação, portanto, muda e dita comportamentos, regendo as
formas de comunicação, os relacionamentos interpessoais, o consumo e a própria vida
em sociedade.
Trata-se de uma nova fase na especif‌icação dos direitos humanos fundamentais,3
uma nova orientação internacional em busca do direito ao desenvolvimento através da
interação da comunicação, da telemática e das informações em tempo real, com trans-
missão global e assimilação simultânea.
Nessa linha, ainda sob a vigência da revogada Diretiva sobre proteção de dados
pessoais, de 1995, foi anunciada em janeiro de 2012 a proposta da Comissão Europeia no
sentido do estabelecimento de um novo direito fundamental: o direito ao esquecimento.4
Segundo Stefano Rodotà, em artigo publicado no periódico La Repubblica,
trata-se do direito de governar a própria memória, para devolver a cada um a possibilidade de se
reinventar, de construir personalidade e identidade, libertando-se da tirania das jaulas em que uma
2. Nas palavras do autor, “a tecnologia da informação é hoje o que a eletricidade foi na Era Industrial. [...] A Internet
passou a ser a base tecnológica para a forma organizacional da Era da Informação: a rede” (A sociedade em rede.
Tradução de Roneide Venancio Majer. São Paulo: Paz e Terra, 2010. p. 108-109).
3. Norberto Bobbio, ao discorrer sobre a evolução da doutrina dos direitos do homem, denomina de especif‌icação
“a passagem gradual, porém cada vez mais acentuada, para uma ulterior determinação dos sujeitos titulares de
direitos. Ocorreu, com relação aos sujeitos, o que desde início ocorrera com relação à ideia abstrata de liberdade,
que se foi progressivamente determinando em liberdades singulares e concretas (de consciência, de opinião, de
imprensa, de reunião, de associação), numa progressão ininterrupta que prossegue até hoje: basta pensar na tu-
tela da própria imagem diante da invasão dos meios de reprodução e difusão de coisas do mundo exterior, ou na
tutela da privacidade diante do aumento da capacidade dos poderes públicos de memorizar nos próprios arquivos
os dados privados da vida de cada pessoa. Assim, com relação ao abstrato sujeito ‘homem’, que já se encontrava
uma primeira especif‌icação no ‘cidadão’ (no sentido de que podiam ser atribuídos ao cidadão novos direitos com
relação ao homem em geral), faz-se valer a exigência de responder com nova especif‌icação à seguinte questão: que
homem, que cidadão?” (BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Tradução de Carlos Nelson Coutinho. São Paulo:
Campus, 1992. p. 62).
4. O direito ao esquecimento foi mencionado como parte de nova proposta de Diretiva para a proteção de dados
pessoais pela Comissária Europeia para a Justiça, Direitos Fundamentais e Cidadania, Viviane Reding, em janeiro
de 2012. Segundo Jeffrey Rosen, “embora Reding retrate o novo direito como uma modesta expansão dos direi-
tos existentes de privacidade dos dados, na verdade representa uma grande ameaça à liberdade de expressão na
internet na próxima década. O direito ao esquecimento pode fazer com que o Facebook e o Google, por exemplo,
comprometam cerca de 20% do seu rendimento se falharem na remoção da postagem dos usuários que postam suas
próprias fotos e depois se arrependem, mesmo se essas fotos já tenham sido largamente distribuídas” (ROSEN,
Jeffrey. Symposium issue: the right to be forgotten. Stanford Law Review Online. v. 64, p. 88, fev. 2012).
EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 66EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 66 31/03/2021 16:10:0031/03/2021 16:10:00
67
O DIREITO AO ESQUECIMENTO NA INTERNET
memória onipresente e total pretende aprisionar tudo [...] A Internet deve aprender a esquecer,
através do caminho de uma memória social seletiva, ligada ao respeito aos direitos fundamentais da
pessoa (tradução livre)”.5
O debate reaparece ciclicamente: é justo permitir que os usuários apaguem
para sempre seus rastros espalhados na rede? A Internet, em outras palavras, deve
esquecer?6
O esquecimento, na Antiguidade, já foi identif‌icado com a ideia de sanção ou pu-
nição, como no instituto da damnatio memoriae, destinado aos condenados por crimes
graves em Roma ou ainda aos destronados, tidos como “maus imperadores” pela nova
ordem constituída. 7
No entanto, o surgimento da internet no cenário social gerou efeito contrário, no
sentido da difusão e a massif‌icação das memórias, possibilitando a construção de uma
“memória coletiva”. Trata-se, pois, de um ponto de contato que se encontra exatamente
no escopo entre o natural avanço das tecnologias da informação e as transformações
como o direito ao esquecimento passou a ser exercido.
As memórias e visões de mundo passaram a ser compartilhadas socialmente com o
avanço das mídias sociais e não mais podem ser individualmente def‌inidas. Com isso, o
esquecimento não pode mais ser concebido apenas como um aspecto inerente à cognição
humana. A memória, portanto, não se opõe ao esquecimento, como poder-se-ia supor.
A memória, na verdade, pressupõe o esquecimento: qualquer organização da memória
5. RODOTÀ, Stefano. Daí ricordi ai dati l´oblio è un diritto? La Repubblica.it. Disponível em:
it/repubblica/2012/01/30/dai-ricordi-ai-dati-oblio>. Acesso em: 15 jan. 2020.
6. MORAES, Maria Celina Bodin; KONDER, Carlos Nelson. Dilemas de direito civil-constitucional: casos e decisões. Rio
de Janeiro: Renovar, 2012. p. 293. Os autores fazem referência ao Caso Lebach, ocorrido em um pequeno vilarejo
a oeste da República Federal da Alemanha, onde ocorreu “o assassinato brutal de quatro soldados que guardavam
um depósito de munição, tendo um quinto soldado f‌icado gravemente ferido. Foram roubadas do depósito armas
e munições. No ano seguinte, os dois principais acusados foram condenados à prisão perpétua. Um terceiro acu-
sado foi condenado a seis anos de reclusão, por ter ajudado na preparação da ação criminosa. Quatro anos após
o ocorrido, a ZDF (Zweites Deutsches Fernsehen – Segundo Canal Alemão), atenta ao grande interesse da opinião
pública no caso, produziu um documentário sobre todo o ocorrido. No documentário, seriam apresentados o
nome e a foto de todos os acusados. Além disso, haveria uma representação do crime por atores, com detalhes da
relação dos condenados entre si, incluindo suas relações homossexuais. O documentário deveria ser transmitido
em uma sexta-feira à noite, pouco antes da soltura do terceiro acusado, que já havia cumprido boa parte da sua
pena. Este terceiro acusado buscou, em juízo, uma medida liminar para impedir a transmissão do programa, pois
o documentário dif‌icultaria o seu processo de ressocialização. A medida liminar não foi deferida nas instâncias
ordinárias. Em razão disso, ele apresentou uma reclamação constitucional para o Tribunal Constitucional Federal,
invocando a proteção ao seu direito de desenvolvimento da personalidade, previsto na Constituição alemã. No
caso, o TCF, tentando harmonizar os direitos em conf‌lito (direito à informação versus direitos da personalidade),
decidiu que a rede de televisão não poderia transmitir o documentário caso a imagem do reclamante fosse apre-
sentada ou seu nome fosse mencionado”.
7. VARNER, Eric R. Mutilation and transformation: damnation memoriae and Roman imperial portraiture. Brill Leiden:
Boston, 2004. p. 1: “as sanções legais associadas à damnatio memoriae estabeleciam os mecanismos pelos quais
um indivíduo era simultaneamente anulado e condenado. Os próprios romanos perceberam que era possível
alterar a percepção da posteridade em relação ao passado especialmente pelo registro visual e epigráf‌ico. Sanções
aplicadas pelo Senado poderiam determinar a destruição dos monumentos e inscrições comemorando criminosos
capitais como hostes, ou of‌iciais inimigos do Estado romano. Como resultado, o nome e o título dos condenados
eram removidos de todas as listas of‌iciais (fasti ); as imagens(imagnes)representando os falecidos eram banidas da
exibição em funerais aristocráticos; os livros escritos pelos condenados eram conf‌iscados e queimados; (...)sendo
possível, ainda, a proibição do uso contínuo do prenome(praenomen)”
EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 67EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 67 31/03/2021 16:10:0031/03/2021 16:10:00
GUILHERME MAGALHÃES MARTINS
68
é igualmente organização do esquecimento, já que não é possível a memorização sem
uma triagem seletiva. 8
Na teoria, o direito ao esquecimento se direciona a um problema urgente na era
digital: é muito difícil escapar do seu passado na Internet, pois cada foto, atualização de
status e tweet vive para sempre na nuvem.9
O grande dilema consiste no fato de os registros do passado – capazes de serem
armazenados eternamente – poderem gerar consequências posteriormente à data em
que o evento foi esquecido pela mente humana.10
Tal fato é agravado pela circunstância de os usuários da Internet, cujos passos são
sempre reconstruídos pelas técnicas de rastreamento, serem frequentemente privados
da escolha quanto à técnica de obtenção de dados e quanto às informações que serão
colhidas a seu respeito.11
Isso decorre da ideia de uma Internet cada vez mais personalizada, ou, numa lin-
guagem mais enfática, mais vigiada pelas principais empresas que operam no setor, que
disso extraem seus lucros bilionários.12
É precisamente no contexto de uma sociedade de hiperinformação que surge o iné-
dito fenômeno do “não esquecimento” e, com ele, também os riscos e os novos desaf‌ios
que passarão a ser enfrentados pelo direito na resolução de conf‌litos; a sociedade con-
temporânea se relaciona de um modo inédito com a informação que produz, da mesma
forma como seus integrantes acessam esse mesmo conteúdo com uma intensidade e
abrangência sem qualquer precedente. 13
8. OST, François. O tempo do direito. Tradução de Élcio Fernandes. Bauru: EDUSC, 2005. p. 60.
9. ROSEN, Jeffrey. Op. cit. p. 88.
10. COSTA, André Brandão Nery. Direito ao esquecimento na Internet: a scarlet letter digital. In: SCHREIBER, An-
derson (Coord.). Direito e mídia. São Paulo: Atlas, 2013. p. 185. Segundo o mesmo autor, “a popularização da
Internet permitiu que ela deixasse de ser uma rede capaz apenas de receber informações, para se revelar poderoso
instrumento de compartilhamento dos dados. Produzem-se, incessantemente, informações pessoais na rede, seja
diretamente, por meio do fornecimento pelo próprio usuário, seja indiretamente, por meio de terceiros, através
de postagens de fotos, de indicações de amizades, de aposição de tags em fotos que identif‌icam outro usuário e de
fornecimento de dados geográf‌icos de onde se está. Sem mencionar as informações produzidas sem que se saiba, o
que torna ainda mais grave e acentua a dif‌iculdade muitas vezes enfrentada de apagar dados produzidos na rede”.
11. ROUTIER, Richard. Traçabilité ou anonymat des conexions? In: PEDROT, Philippe (Org.). Traçabilité et respon-
sabilité. Paris: Economica, 2003. p. 154.
12. Segundo Eli Parisier, presidente do conselho da MoveOn.org, um portal de ativismo on-line, “a tentativa de saber o
máximo possível sobre seus usuários tornou-se a batalha fundamental da nossa era entre gigantes da Internet como
Google, Facebook, Apple e Microsoft [...] Ainda que o Google tenha (até agora) prometido guardar nossos dados
pessoais só para si, outras páginas e aplicativos populares da Internet – do site de passagens aéreas Kayak.com ao
programa de compartilhamento AddThis – não dão essa garantia. Por trás das páginas que visitamos, está crescendo
um enorme mercado de informações sobre o que fazemos na rede, movido por empresas de dados pessoais pouco
conhecidas, mas altamente lucrativas, como a BlueKai e a Acxiom. A Acxiom, por si só, já acumulou em média 1.500
informações sobre cada pessoa em sua base de dados – que inclui 96% da população americana – com dados sobre todo
tipo de coisa, desde a classif‌icação de crédito de um usuário até o fato de ter comprado remédios sobre incontinência.
Usando protocolos ultravelozes, qualquer site – não só os Googles e Facebooks – pode agora participar da brincadeira.
Para os comerciantes do ‘mercado do comportamento’, cada ‘indicador de clique’ que enviamos é uma mercadoria,
e cada movimento que fazemos com o mouse pode ser leiloado em microssegundos a quem f‌izer a melhor oferta.
A fórmula dos gigantes da Internet para essa estratégia de negócios é simples: quanto mais personalizadas forem suas ofertas de
informação, mais anúncios eles conseguirão vender e maior será a chance de que você compre os produtos oferecidos” (g. n.).
13. SARLET, Ingo Wolfgang; FERREIRA NETO, Arthur. O direito ao “esquecimento” na sociedade da informação.
Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2019. p.21-23.
EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 68EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 68 31/03/2021 16:10:0031/03/2021 16:10:00
69
O DIREITO AO ESQUECIMENTO NA INTERNET
O mundo e o espaço digital surgem como um armazenamento contínuo e inesgotável
de dados, numa nova forma de voyeurismo e memória perene que, como alerta Catarina
Santos Botelho, não se adequa à nossa condição humana. A neurologia, na visão da autora
portuguesa, ensina-nos que a principal função do nosso cérebro é esquecer tudo aquilo
que é supérf‌luo e f‌iltrar conteúdos que nos prejudicam emocionalmente. 14
O direito ao esquecimento se apresenta como uma espécie de garantia fundamental
que visa remediar os inconvenientes e prejuízos gerados pela enorme multiplicação de
dados pessoais que passam a alimentar bancos de armazenamento e processamento fora
do controle dos cidadãos, o que, na última instância, supõe uma exigência em face do
Estado social e democrático de Direito, que deve adequar seus pressupostos estruturais
à mudança de modelo signif‌icada pelo Big Data. 15
Embora todos os usuários da Internet contribuam para a geração e armazena-
mento de mais e mais informações acerca das suas ações online, isso não corresponde
necessariamente a um benefício a partir da informação gerada. Embora os grandes
impérios da comunicação anunciem uma navegação cada vez mais personalizada e
ef‌iciente, sobretudo em relação aos motores de busca, os usuários da Internet são
destinados a esquecer suas experiências, enquanto as empresas cuidadosamente
monitoram todas essas informações para oferecer publicidade e para a criação de
perf‌is direcionados ao público. Em outras palavras, as marcas se lembram daquilo
que os usuários esquecem. 16
O termo “direito ao esquecimento” tem sido muito criticado pela sua amplitude e
vagueza semântica, abrangendo desde registros criminais até, na visão de parte da ju-
risprudência, os pedidos de desindexação, que com ele não se confundem, merecendo
tratamento diferenciado, como será visto mais adiante.
Não se trata, de qualquer forma, de um direito absoluto, mas que deve ser objeto
de ponderação, caso a caso, de modo que f‌iguras históricas, como Jesus Cristo, Buda ,
Gandhi, Hitler, dentre outros, e fatos históricos, como guerras, ou então as torturas e
excessos cometidos durante o regime militar brasileiro, improbidades administrativas
cometidas por políticos ou a Operação Lava Jato, a título de exemplif‌icação, não poderão
ser jamais esquecidos ou apagados da memória coletiva. A informação objeto de direito
ao esquecimento deve ser, portanto, de natureza eminentemente privada e sua revelação
deve atingir um direito de personalidade, em especial a privacidade, ou a identidade
pessoal, sem prejuízo da cláusula geral da dignidade da pessoa humana. Trata-se de um
direito excepcional, cuja aplicação não pode ser banalizada.
A discussão quanto à reexibição de dados passados da vida dos indivíduos já foi alvo
de tradicionais debates que marcaram época, como no caso Melvin vs. Reid, enfrentado
14. BOTELHO, Catarina Santos. “Novo ou velho direito”, O Direito ao esquecimento e o princípio da proporcionali-
dade no constitucionalismo global. Ab Instantia. v. 7, 2017, p. 53.
15. LÓPEZ, Marina Sancho. Derecho al olvido y Big Data dos realidades convergentes. Valencia: Tirant lo Blanch,
2020(e-book) p.18-19.
16. SERRALBO, Javier Aranda. Right to oblivion; a way to get to know ourselves and share the knowledge. London,
2012(e-book), p. 182.
EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 69EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 69 31/03/2021 16:10:0031/03/2021 16:10:00
GUILHERME MAGALHÃES MARTINS
70
pelo Tribunal de Apelação da Califórnia, em 1931, reconhecendo, então, o que hoje se
concebe como direito ao esquecimento, sem o uso daquela nomenclatura.17
A pior situação já vivenciada por um prof‌issional em início de carreira pode ser
vinculada com a primeira e mais importante informação a seu respeito, como ocorreu
no caso da professora Stacy Synder, cuja carreira foi arruinada pela postagem, na rede
social My Space, de uma foto sua em uma festa, tirada há muito tempo, segurando uma
bebida e utilizando chapéu de pirata, com a legenda “pirata bêbado”.18
É frequentemente lembrada a decisão do Tribunal Constitucional Federal da Ale-
manha no Caso Lebach, que entrou para a história dos grandes crimes, despertando o
clamor da opinião pública, e foi tema de um documentário produzido pela rede alemã
ZDF (Zweites Deutsches Ferbsehen), cuja exibição foi impedida por aquela Corte.19
No dia 13 de maio de 2014, em decisão inédita, a Grande Seção do Tribunal de
Justiça da União Europeia reconheceu, em face da Google, o direito ao esquecimento na
Internet, determinando a remoção de dados sensíveis dos resultados de busca na Internet.
17. O caso foi enfrentado em 1931 pelo Tribunal de Apelação da Califórnia, envolvendo Gabrielle Darley, jovem que
foi processada por homicídio e, em 1918, considerada inocente, abandonando então a atividade de meretrício
anteriormente exercida. Bernard Melvin, marido de Gabrielle, buscou na justiça a reparação por violação da vida
privada, ao ver produzido pela ré, Dorothy Davenport Reid, o f‌ilme “Red Kimono”, que retratava exatamente a vida
pregressa de sua esposa, anos após ter esta readquirido o prestígio social. O pedido foi provido, tendo em vista a
impossibilidade de que fatos que restaram no passado de uma pessoa assombrem eternamente sua vida, impedindo
o desenvolvimento da sua personalidade: Any person living a life of rectitude has that right to hapinesse which
includes a freedom from unnecessary attacks on his character, social standing, or reputation. Cf. MORAES, Maria
Celina Bodin; KONDER, Carlos Nelson, Dilemas.... Op. cit. p. 289-290.
18. Embora a professora estivesse em horário de folga e sua idade à época da fotograf‌ia permitisse o uso de bebidas
alcoólicas, foi-lhe negado por esse motivo um cargo de ensino em dedicação exclusiva, tendo sido então obrigada
a mudar de carreira. LAGONE, Laura. The right to be forgotten: a comparative analysis. Disponível em:
ssrn.com/abstract=2229361>. Acesso em: 15 jan. 2020.
19. Em lugarejo situado a oeste da República Federal da Alemanha, chamado Lebach, no ano de 1969, quatro soldados
que guardavam um depósito de munições foram brutalmente assassinados, e um quinto restou gravemente ferido,
em latrocínio que envolveu ainda o roubo de armas e munições do exército alemão. Os três suspeitos foram julgados
e presos no ano seguinte, em 1970, tendo sido dois deles condenados a pena perpétua, e o terceiro, que apenas aju-
dou na preparação da ação criminosa, foi condenado a seis anos de reclusão. Tendo em vista o interesse da opinião
pública no caso, a rede alemã ZDF (Zweites Deutsches Ferbsehen) produziu um documentário detalhado, não apenas
trazendo à tona os fatos que levaram à condenação dos criminosos, retratados por atores, como também exibindo
seus nomes e inclusive destacando as relações homossexuais que restaram comprovadas à época dos fatos.
O documentário deveria ser transmitido numa noite de sexta-feira, pouco antes de ser libertado o terceiro inte-
grante da quadrilha, que fora preso em virtude do auxílio à preparação do crime. Visando obstar à exibição do
documentário, sob a alegação de que a veiculação dif‌icultaria sobremaneira a sua ressocialização, além de violar
de forma frontal seus direitos da personalidade, este terceiro integrante buscou em juízo medida liminar para que
o documentário não fosse transmitido.
Todavia, o Tribunal Estadual de Mainz e o Superior Tribunal Estadual de Koblenz julgaram improcedente o pedido
do reclamante, sob o fundamento de que o envolvimento no fato delituoso o tornara um personagem da história
alemã recente, conferindo à divulgação do episódio inegável interesse público, prevalente inclusive sobre a le-
gítima pretensão de ressocialização. Em sede de Reclamação Constitucional, o caso foi levado ao conhecimento
do Tribunal Constitucional Federal alemão, que revogou as decisões anteriores, impedindo que o documentário
da ZDF fosse exibido e dando provimento à reclamação, sob pena de violação aos direitos da personalidade do
interessado, consubstanciados na garantia da ressocialização. No caso, o Tribunal Constitucional Federal ale-
mão afastou qualquer referência ao f‌im da liberdade de expressão, ou mesmo a censura prévia, ao reconhecer o
importante papel da imprensa na divulgação da informação de interesse público. O principal argumento de tal
decisão foi o controle temporal dos dados, sendo que, à época dos fatos, não poderia ser feita qualquer restrição à
veiculação do programa, diferentemente do que ocorreu no caso, pois o documentário seria exibido quatro anos
após, pouco antes do f‌im do cumprimento da pena pelo interessado, obstando à sua ressocialização.
EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 70EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 70 31/03/2021 16:10:0031/03/2021 16:10:00
71
O DIREITO AO ESQUECIMENTO NA INTERNET
O caso teve como origem um litígio entre a Google e um cidadão espanhol, Mario
Costeja González. Ele pretendia excluir seus dados pessoais da ferramenta de busca,
especialmente com relação ao fato de que seu imóvel, nos anos 1990, foi levado a leilão
para pagamento de dívidas com a previdência social da Espanha, sendo que o débito
chegou a ser quitado de modo a evitar a venda judicial. Foi rejeitado o argumento da
Google de que somente exibe conteúdos indexáveis (que estão online e são passíveis de
serem encontrados) e não teria responsabilidade sobre o seu conteúdo.
Neste importante “leading case”, o Tribunal Europeu reconheceu a responsabilidade
das ferramentas de busca pelo processamento de dados pessoais exibidos nos resultados,
devendo o direito ao esquecimento, na hipótese concreta, prevalecer sobre o direito do
público de conhecer e ter fácil acesso à informação. A informação a ser excluída deve
ser interpretada segundo o seu contexto, tendo sido considerada, no caso, ultrapassada
e irrelevante, diante do que não seria necessária a sua preservação.
Os casos mais emblemáticos julgados pelo Judiciário brasileiro acerca do direito ao
esquecimento envolveram a apresentadora infantil Xuxa e o programa televisivo “Linha
Direta Justiça”, sendo ainda relacionado ao tema um episódio ligado a uma suposta frau-
de em um concurso público para a Magistratura.20 Mais recentemente, em fevereiro de
2021, no caso Aida Curi, o Supremo Tribunal Federal aprovou a Tese 786 de Repercussão
Geral, em cujos termos o direito ao esquecimento não é compatível com o ordenamento
constitucional brasileiro.
O direito ao esquecimento se insere em um delicado conf‌lito de interesses. De um
lado, o interesse público aponta no sentido de que fatos passados sejam relembrados,
considerando ainda a liberdade de imprensa e de expressão, bem como o direito da co-
letividade à informação; do outro, há o direito de não ser perseguido por toda a vida por
acontecimento pretérito.21
A tutela do direito ao esquecimento decorre da cláusula geral de tutela da pessoa
humana, cuja dignidade é reconhecida como princípio fundamental da República no
art.1o, IV, da Constituição da República, restando superada a discussão sobre a tipicidade
ou atipicidade dos direitos da personalidade.22
20. A ementa é a seguinte: “Ação de obrigação de fazer com pedido de antecipação de tutela para que os agravantes
instalem ‘f‌iltros’ em seus sites de pesquisa existentes na Internet, a f‌im de evitar a associação do nome da agravada
a notícias que envolvam a suposta fraude no XLI Concurso da Magistratura. Deferimento dos efeitos da tutela.
Agravo de instrumento. 1 – O direito à intimidade e à vida privada, amparado na Carta constitucional(art. 5o,
X), conf‌igura-se como tutela assegurada ao indivíduo para que possa repelir a interferência de terceiros na esfera
de sua vida íntima e ter controle das informações sobre ele divulgadas, desde que tais informações não veiculem
manifesto interesse público. 2 – Na hipótese concreta do conf‌lito entre a garantia à intimidade e a chamada ‘so-
ciedade da informação’, deve prevalecer a primeira, com vistas a evitar que o exercício da livre circulação de fatos
noticiosos por tempo imoderado possa gerar danos à vida privada do indivíduo. 3 – Prevalência, nesta fase, do
direito à imagem, à personalidade e do direito ao esquecimento, garantias fundamentais do ser humano. 4 – Os
elementos trazidos aos autos indicam a possibilidade de dano irreparável à agravada, caracterizando-se a presença
dos requisitos que ensejam o deferimento da antecipação de tutela. Provimento parcial do recurso para ampliar
o prazo para o cumprimento da obrigação e reduzir a multa cominatória” (TJ-RJ Agravo de Instrumento 45786-
53.2009.8.19.0000, relator Desembargador Antonio Saldanha Palheiro, j. 25.5.2010).
21. COSTA, André Brandão Nery. Op. cit. p. 187.
22. MORAES, Maria Celina Bodin. Danos à pessoa humana: uma leitura civil-constitucional dos danos morais. Rio de
Janeiro: Renovar, 2003. p. 117-118: “Leve-se em conta a vulnerabilidade da pessoa humana. A polêmica acerca
dos direitos humanos, ou dos direitos da personalidade, refere-se à necessidade de normatização dos direitos das
EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 71EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 71 31/03/2021 16:10:0031/03/2021 16:10:00
GUILHERME MAGALHÃES MARTINS
72
2. DIREITO AO ESQUECIMENTO, PRIVACIDADE E AUTODETERMINAÇÃO
INFORMATIVA. AS TECNOLOGIAS E A MEMÓRIA
A privacidade, hoje, abandonou a sua concepção clássica, pela qual seria vista como
o “direito a ser deixado em paz” ou o “direito a estar só”,23 passando o seu centro de gravi-
dade à possibilidade de cada um controlar o uso das informações que lhe dizem respeito.
Então, voltam-se as atenções para o controle, por indivíduos e grupos, do exercício dos
poderes fundados na disponibilidade de informações, contribuindo para um equilíbrio
sociopolítico mais adequado.24
Na sociedade da informação, tendem a prevalecer def‌inições funcionais da priva-
cidade, que se referem à possibilidade de um sujeito conhecer, controlar, endereçar ou
interromper o f‌luxo das informações que lhe dizem respeito.25
A necessidade da proteção de dados pessoais faz com que a tutela da privacidade
ganhe um novo eixo. Considerando-se a esfera privada como um conjunto de ações,
comportamentos, preferências, opiniões e comportamentos pessoais sobre os quais o
interessado pretende manter um controle exclusivo, essa tutela deve basear-se num
direito à autodeterminação informativa, a f‌im de que sejam controladas as informações
pessoais em circulação.26
O problema se agrava à medida que mais informações são compartilhadas, sobretudo
nas redes sociais,27 tornando-se acessíveis por milhões de usuários em qualquer parte do
pessoas em prol da concretude do princípio da dignidade da pessoa humana, do modo de melhor tutelá-la, onde
quer que se faça presente essa necessidade. Aqui, e desde logo, toma-se posição acerca da questão da tipicidade ou
atipicidade dos direitos da personalidade. Não há mais, de fato, que se discutir sobre uma enumeração taxativa
ou exemplif‌icativa dos direitos da personalidade, porque se está em presença, a partir do princípio constitucional
da dignidade, de uma cláusula geral de tutela da pessoa humana.”
23. Tal concepção é normalmente identif‌icada com o artigo The right of privacy, de autoria de Samuel Warren e Louis
Brandeis, originalmente publicado no volume 193 da Harvard Law Review (1890), considerado pioneiro ao estabelecer
um marco na doutrina do direito à privacidade, além de ser de certa forma profético ao antecipar a importância que
a matéria viria a assumir com o desenvolvimento das tecnologias da informação que então já começavam a se fazer
sentir. Disponível em: .louisville.edu/library/law/brandeis/privacy.html>. Acesso em: 17 maio 2006. Em con-
traposição a essa visão, sustenta Danilo Doneda que “a proteção da privacidade acompanha a consolidação da própria
teoria dos direitos da personalidade e, em seus mais recentes desenvolvimentos, contribui para afastar uma leitura
pela qual sua utilização em nome de um individualismo exacerbado alimentou o medo de que eles se tornassem o
‘direito dos egoísmos privados’. Algo paradoxalmente, a proteção da privacidade na sociedade da informação, tomada
na sua forma de proteção dos dados pessoais, avança sobre terrenos outrora não proponíveis e induz a pensá-la como
um elemento que, antes de garantir o isolamento ou a tranquilidade, proporcione ao indivíduo os meios necessários
para a construção e consolidação de uma esfera privada própria, dentro de um paradigma de vida em relação e sob o
signo da solidariedade – isto é, tenha um papel positivo na sua própria comunicação e relacionamento com os demais”
(DONEDA, Danilo. Da privacidade à proteção dos dados pessoais. Rio de Janeiro: Renovar, 2006. p. 23). Nesse sentido,
o Enunciado 404, aprovado na IV Jornada de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal: “A tutela da privacidade
da pessoa humana compreende os controles espacial, contextual e temporal dos próprios dados, sendo necessário
seu expresso consentimento para tratamento de informações que versem especialmente sobre o estado de saúde, a
condição sexual, a origem racial ou étnica, as convicções religiosas, f‌ilosóf‌icas e políticas”.
24. Rodotà, Stefano. Tecnologie e diritti. Bologna: Il Mulino, 1995. p. 19-20.
25. Idem, p. 101. MARTINS, Guilherme Magalhães. Responsabilidade civil por acidente de consumo na Internet. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 238-239.
26. Doneda, Danilo. Considerações iniciais sobre os bancos de dados informatizados e o direito à privacidade. In:
TEPEDINO, Gustavo (Coord.). Problemas de direito civil-constitucional. Rio de Janeiro: Renovar, 2000. p. 129.
27. MARTINS, Guilherme Magalhães; LONGHI, João Victor Rozatti. A tutela do consumidor nas redes sociais virtuais;
responsabilidade civil por acidentes de consumo na sociedade da informação. Revista de Direito do Consumidor.
São Paulo, v. 78, abr./jun. 2011.
EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 72EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 72 31/03/2021 16:10:0031/03/2021 16:10:00
73
O DIREITO AO ESQUECIMENTO NA INTERNET
globo, inclusive dados que trazem consigo aspectos intrinsecamente ligados à persona-
lidade dos indivíduos. Nome, sobrenome, endereço, opções religiosas, afetivas e tantas
outras são objeto de uma exposição fomentada e enaltecida social e culturalmente.28
No cerne das redes sociais está o intercâmbio de informações pessoais. Os usuá rios
f‌icam felizes por revelarem detalhes íntimos de suas vidas pessoais, fornecendo informa-
ções precisas, compartilhando fotograf‌ias e vivenciando o fetichismo e exibicionismo
de uma sociedade confessional.29
Deve haver, portanto, um contraponto, através do tratamento de dados pessoais.
Mesmo diante de tal controle, há a dif‌iculdade de se individuar tipos de informações
acerca dos quais o cidadão estaria disposto a renunciar def‌initivamente, visto que até
mesmo os dados mais inócuos podem, se associados a outros, provocar danos à digni-
dade do interessado.30
A nova situação determinada pelo uso de computadores no tratamento de infor-
mações pessoais torna cada vez mais difícil considerar o cidadão como um simples
“fornecedor de dados”, sem que a ele caiba algum poder de controle, ensina Stefano
Rodotà, problema esse que ultrapassa as fronteiras individuais e se dilata na dimensão
coletiva.31
Nesse contexto, o direito ao esquecimento seria o direito de impedir que dados de
outrora sejam revividos na atualidade, de modo descontextualizado, sendo conferido
à pessoa revelar-se tal qual ela é atualmente, em sua realidade existencial, de modo que
28. Para Marcel Leonardi, “a escala e os tipos de informação disponíveis aumentam exponencialmente com a utilização
de tecnologia. É importante recordar que, como a informação é coletada em forma eletrônica, torna-se extrema-
mente simples copiá-la e distribuí-la, podendo ser trocada entre indivíduos, companhias e países ao redor de todo
o mundo.
A distribuição da informação pode ocorrer com ou sem o conhecimento da pessoa a quem pertencem os dados,
e de forma intencional ou não. Há uma distribuição não intencional quando os registros exibidos contêm mais
informações do que as que foram solicitadas ou, ainda, quando tais dados são furtados. Muitas vezes, determinadas
‘f‌ichas cadastrais’ contêm mais dados do que o necessário ou solicitado pelo utilizador.
Como se tudo isto não bastasse, há que se destacar o perigo que representam as informações errôneas. Ser conside-
rado inadimplente quando não se deve nada a ninguém ou ser rejeitado em uma vaga de emprego sem justif‌icativa
aparente são apenas alguns dos exemplos dos danos que dados incorretos, desatualizados ou propositadamente
errados podem causar [...] Os efeitos de um pequeno erro podem ser ampliados de forma assustadora. Quando
a informação é gravada em um computador, há pouco incentivo para se livrar dela, de forma que certos registros
podem permanecer à disposição por um longo período de tempo. Ao contrário da informação mantida em papel,
dados armazenados em um computador ocupam muito pouco espaço e são fáceis de manter e de transferir, e
como tal podem perdurar indef‌inidamente” (LEONARDI, Marcel. Responsabilidade civil pela violação do sigilo
e privacidade na Internet. In: SILVA, Regina Beatriz Tavares da; SANTOS, Manoel J. Pereira dos (Coord.). Respon-
sabilidade civil na Internet e nos demais meios de comunicação. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 339-340).
29. BAUMAN, Zygmunt. Vida para o consumo: a transformação das pessoas em mercadoria. Tradução de Carlos Alberto
Medeiros. Rio de Janeiro: Zahar, 2008. p. 8.
30. RODOTÀ, Stefano. A vida na sociedade da vigilância. Organização de Maria Celina Bodin de Moraes e tradução de
Danilo Doneda e Luciana Cabral Doneda. Rio de Janeiro: Renovar, 2008. p. 36-37: “A obrigação de fornecer dados
não pode ser simplesmente considerada como a contrapartida dos benefícios sociais que, direta ou indiretamente,
o cidadão pode chegar a aproveitar. As informações coletadas não somente tornam as organizações públicas e
privadas capazes de planejar e executar os seus programas, mas permitem o surgimento de novas concentrações
de poder ou o fortalecimento de poderes já existentes: consequentemente, os cidadãos têm o direito de pretender
exercer um controle direto sobre aqueles sujeitos aos quais as informações fornecidas atribuirão um crescente
plus-poder”.
31. Ibidem, p. 36-37.
EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 73EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 73 31/03/2021 16:10:0031/03/2021 16:10:00
GUILHERME MAGALHÃES MARTINS
74
nem todos os rastros que deixamos em nossa vida devem nos seguir implacavelmente
em cada momento da existência.32
O surgimento da Internet no cenário social gerou a difusão e a massif‌icação das
memórias, gerando a construção de uma “memória coletiva”. Trata-se, pois, de um ponto
de contato que se encontra exatamente no escopo entre o natural avanço das tecnologias
da informação e as transformações como o direito ao esquecimento passou a ser exercido.
O progresso tecnológico, ao trazer uma maior capacidade de memorização e ar-
mazenamento de dados, também tem aspectos positivos, seja para as empresas, capazes
de seguir, com mais ef‌iciência, as tendências do mercado, seja para os indivíduos, que
podem lembrar com maior detalhamento momentos importantes das suas vidas.33
As memórias e visões de mundo passaram a ser compartilhadas socialmente com
o avanço das mídias sociais e não mais podem ser individualmente def‌inidas. Com isso,
o esquecimento não pode mais ser concebido apenas como um aspecto inerente à cog-
nição humana.
O desenvolvimento tecnológico alterou radicalmente o equilíbrio entre lembrança
e esquecimento, visto que a regra, hoje, é a recordação dos fatos ocorridos, enquanto
esquecer se tornou a exceção. Para Viktor Mayer, “em virtude das tecnologias digitais, a
habilidade da sociedade de esquecer foi reprimida, sendo permutada pela memória perfeita”.34
As tecnologias implicam, portanto, uma perda na capacidade de controlar a própria
identidade, de realizar escolhas de estilo de vida e mesmo começar de novo e superar os
fatos pregressos, afetando, portanto, a autodeterminação informativa.
O direito ao esquecimento, enquanto garantia da autodeterminação informativa,
insere-se no controle temporal de dados, “que demanda uma proteção das escolhas pes-
soais após certo período de tempo, em que o indivíduo já não mais pretende ser lembrado,
rememorado por dados passados”.35
32. COSTA, André Brandão Nery. Op. cit. p. 197.
33. COSTA, André Brandão Nery. Op. cit. p. 189.
34. MAYER-SCHÖNBERGER. Op. cit. p. 187.
35. BUCAR, Daniel. Controle temporal de dados: o direito ao esquecimento. Civilística. Revista Eletrônica de Direito
Civil, ano 2, no 3, 2003, p. 9. Disponível em: . Acesso em: 15 jan. 2020. Nas palavras do autor,
que se refere às características humanas de memória e esquecimento, “basta lembrar as disposições inseridas nos
acolhem, em certa medida, o controle temporal dos dados pessoais. Enquanto o CDC determina a supressão de
registros pessoais após o transcurso de certo período da situação devedora, o CPP restringe o acesso às informações
sobre o cumprimento de pena pelo condenado, após este já a ter observado.
Em termos mais amplos, o direito ao esquecimento permite que a pessoa, no âmbito da concretização de sua
plena autodeterminação informativa, exerça o controle da circulação de seus dados após determinado período,
mediante supressão ou restrição, ainda que estes tenham por conteúdo informações passadas e verídicas acerca
do interessado.
Contudo [...], há situações em que o controle temporal cede espaço a outros interesses, que permitem o tratamento
atual de dados passados, ainda que haja manifestação de recusa (ou ausência de consentimento) por parte do
indivíduo atingido. São duas, a propósito, as hipóteses que possibilitam o tratamento não desejado: (a) a presença
de valor existencial de igual ou superior relevância ao do interessado e (b) tratamento dos dados com conteúdo
histórico, cuja divulgação encontra-se inserida em uma das vertentes da liberdade de expressão.
Na hipótese de haver, por exemplo, a vida de terceiros em perigo, quer parecer que não há como se concluir de
maneira diversa: poderá ocorrer o tratamento dos dados passíveis de esquecimento, de modo que seja preservada
a vida humana. Exemplo claro nesse sentido é a revelação de dados sanitários de um ascendente da pessoa, sem o
EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 74EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 74 31/03/2021 16:10:0031/03/2021 16:10:00
75
O DIREITO AO ESQUECIMENTO NA INTERNET
O direito europeu, de um lado, e o direito norte-americano, do outro, manifestam
posições diametralmente opostas acerca do problema.
Na Europa, as raízes intelectuais para o direito ao esquecimento podem ser encon-
tradas no direito francês, que reconhece le droit à l’oubli – ou o direito ao esquecimento
–, permitindo que um criminoso condenado que já cumpriu sua pena e está reabilitado
possa se opor à publicação de fatos da sua condenação e encarceramento. Na América,
em contraste, a publicação do histórico criminal das pessoas está protegida pela Primeira
Emenda.36
Os danos provocados pelas novas tecnologias de informação vêm se acumulando,
como no caso da apresentadora Maria das Graças Xuxa Meneghel, julgado pelo Superior
Tribunal de Justiça, que, após anos de disputa judicial contra a Google do Brasil Internet
Ltda. (Resp. 1.316.921-RJ, 3a Turma, Rel. Min. Fátima Nancy Andrighi, DJ 29.6.2012),
isentou de responsabilidade o provedor de pesquisa da ré, não obstante se tratar de caso
de responsabilidade objetiva, regulado pelo art. 12 do Código de Defesa do Consumidor.
Tendo em vista essa problemática, o Conselho da Justiça Federal, na VI Jornada
de Direito Civil, realizada em março de 2013, aprovou o Enunciado 531, cuja proposta
coube a este autor:
Artigo 11: A tutela da imagem e da honra da pessoa humana na Internet pressupõem o direito ao esque-
cimento, tendo em vista o ambiente da rede mundial de computadores, cujos meios de comunicação
potencializam o surgimento de novos danos.
A Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comitê
Econômico e Social Europeu e ao Comitê das Regiões, intitulada Proteção da privacidade
num mundo interligado: um quadro europeu para o século XXI, ao expor os maiores desaf‌ios
atuais para a proteção de dados, refere-se ao seguinte caso, ocorrido com um estudante
austríaco em relação à sua conta na rede social Facebook:
Um estudante europeu, membro de uma rede social em linha, decide solicitar o acesso a todos os
dados pessoais que o referido serviço detém sobre si. Ao fazê-lo, apercebe-se que a rede social recolhe
muito mais dados do que pensava e que alguns dados pessoais que julgou terem sido apagados ainda
estavam conservados.
A reforma das regras da UE no futuro em matéria de proteção de dados garantirá que esta situação não
se volte a repetir no futuro, ao introduzir uma condição explícita que obriga as redes sociais em linha
(e todos os outros responsáveis pelo tratamento de dados) a limitarem ao mínimo o volume de dados
pessoais dos utilizadores que recolhem e tratam; uma obrigação explícita de que os responsáveis pelo
tratamento de dados apaguem os dados pessoais de uma pessoa quando esta o solicitar expressamente
e se não existir qualquer outra razão legítima para os conservar.37
consentimento desta, mantidos em prontuários médicos da rede hospitalar, cujas informações possam efetivamente
auxiliar no tratamento de uma enfermidade que acometa a um descendente. Tal conclusão decorre da opção do
ordenamento jurídico pela dignidade da pessoa humana como seu pilar (art. 1o, III, CR), cuja plena aplicação
requer a existência da pessoa como ser biológico vivo”.
36. ROSEN. Op. cit. p. 88.
37. COMUNICAÇÃO da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comitê Econômico e Social Europeu e
ao Comitê das Regiões: proteção da privacidade num mundo interligado: um quadro europeu de proteção de dados
para o século XXI./COM/2012/09 f‌inal. Disponível em: -lex.europa.eu/LexUriServ>. Acesso em:
15 jan. 2020.
EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 75EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 75 31/03/2021 16:10:0131/03/2021 16:10:01
GUILHERME MAGALHÃES MARTINS
76
3. MODALIDADES DE EXERCÍCIO DO DIREITO AO ESQUECIMENTO
Os reguladores europeus acreditam que todos os cidadãos enfrentam a dif‌iculdade
de escapar de seu passado agora que a Internet guarda tudo e não esquece de nada – uma
dif‌iculdade que costumava ser apenas de criminosos condenados.
Pode ser assim sintetizado o núcleo duro do direito de ser esquecido: se um indivíduo
não deseja mais que seus dados pessoais sejam processados ou salvos por um controle
de dados, e se não tiver nenhuma razão legítima para mantê-los, os dados devem ser
removidos do sistema.
Além disso, a Comissária Europeia para a Justiça, Direitos Fundamentais e Cidada-
nia, Viviane Reding, af‌irma que “é claro que o direito ao esquecimento não pode o direito
de apagar toda a história”. Nessa linha, propõe uma def‌inição mais restrita dos dados que
podem ser removidos, abrangendo apenas aqueles fornecidos pelos próprios titulares.38
O direito ao esquecimento foi delineado no art. 17 do RGPD da seguinte maneira:
1. O titular dos dados tem o direito de obter do responsável pelo tratamento e cancelamento de dados
pessoais que lhe digam respeito a cessação da comunicação ulterior desses dados, especialmente em
relação a dados pessoais que tenham sido disponibilizados pelo titular dos dados quando ainda era
uma criança, sempre que se aplique um dos motivos seguintes:
(a) Os dados deixaram de ser necessários em relação à nalidade que motivou a sua recolha ou tratamento;
(b) O titular dos dados retira o consentimento sobre o qual é baseado o tratamento nos termos do artigo
6o, no 1, alínea a, ou se o período de conservação consentido tiver terminado e não existir outro funda-
mento jurídico para o tratamento dos dados;
(c) O titular dos dados opõe-se ao tratamento de dados pessoais nos termos do artigo 19o;
(d) O tratamento dos dados não respeita o presente regulamento por outros motivos.39
No México, de maneira inovadora, a lei federal de proteção de dados pessoais em
posse de particulares, de 5 de julho de 2010, previu expressamente o direito ao esque-
cimento “quando os dados de caráter pessoal tenham deixado de ser necessários para o
cumprimento das f‌inalidades previstas.40
38. REDING, Vivian. Speech/12/26, The EU Data Protection Reform 2012: Making Europe the Standard Setter For
Modern Data Protection Rules in the Digital Age (speech before Innovation Conference Digital, Life, Design,
Munich, Jan. 22 2012). Disponível em: . Acerca
do tema, em excelente livro, Sergio Branco comenta que “a leitura dos termos de uso do Facebook, por exemplo,
demonstra que, quando alguém decide deixar a rede, não necessariamente terá seus dados deletados. Em primeiro
lugar, porque existe uma diferença entre desativar e excluir a conta. No primeiro caso, existe apenas a suspensão
da prestação de serviços. Assim, o usuário poderá decidir voltar e, nesta hipótese, encontrará seus dados como
os havia deixado. Na eventualidade de optar pela exclusão da conta, o Facebook informa que demora cerca de
30 dias para exclui-la, sendo que algumas das informações permanecem armazenadas por até 90 dias. A bem da
verdade, como algumas das informações se encontram conectadas a contas de terceiros, é praticamente impossível
remover todos os dados do Facebook. Uma vez na rede, os vestígios de sua passagem não podem ser apagados”.
BRANCO, Sergio. Memória e esquecimento na Internet. Porto Alegre: Arquipélago, 2017. p.141.
39. Proposta de Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo à proteção das pessoas singulares no que
diz respeito ao tratamento de dados pessoais e à livre circulação desses dados (regulamento geral sobre a proteção de
dados). Disponível em: .do?uri=COM:2012:0011:FIN:PT:PDF>.
Acesso em: 15 jan. 2020.
40. A lei mexicana chega a prever um prazo para a retirada dos dados de circulação, correspondente ao prazo de
prescrição relativo às pretensões derivadas da relação jurídica em que se fundar o tratamento de dados pessoais
em cada caso concreto.
EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 76EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 76 31/03/2021 16:10:0131/03/2021 16:10:01
77
O DIREITO AO ESQUECIMENTO NA INTERNET
Na França, a lei de 06 de janeiro de 1978, conhecida como “lei da informática de
liberdades”, foi pioneira ao estabelecer que a duração dos dados pessoais não deve ex-
ceder a duração necessária à f‌inalidade perseguida pelos responsáveis pelas respectivas
coleta e tratamento.
No Brasil, o Marco Civil da Internet (Lei 12.965/2014) prevê, no seu artigo 7º, X,
uma modalidade de direito ao esquecimento, decorrente da pós-ef‌icácia das obrigações,
assegurando ao titular dos dados pessoais o direito de solicitar sua exclusão def‌initiva,
ao término da relação entre as partes. Pode ser o caso, por exemplo, da relação entre
usuário e provedor de uma rede social, ao término da conta.
Segundo Bert-Jaap Koops, o direito ao esquecimento pode se manifestar em três
diferentes formas: a) o direito a ter deletada a informação após certo período de tempo;
b) o direito a “recomeçar do zero” (clean state); c)o direito a estar conectado unicamente
com o presente.41
Peter Fleischer, conselheiro da Google sobre questões de privacidade, propõe três
categorias de direito ao esquecimento, cuja discussão considera estar envolvida por uma
cortina de neblina.42
A primeira categoria de direito ao esquecimento proposta por Fleischer se refere aos
dados disponibilizados pelo mesmo sujeito que pretende deletá-los (conteúdos próprios).
É o caso do usuário que, por exemplo, posta uma foto no Facebook e depois decide reti-
rá-la. Tal modalidade é a menos controversa de todas, sendo inclusive reconhecida nas
políticas de diversos provedores de redes sociais, logo o direito ao esquecimento, nesse
caso, assume um conteúdo mais simbólico.
Já a segunda categoria de direito ao esquecimento revela-se mais polêmica, pois
envolve a reprodução de um conteúdo alheio por terceiros. Se alguém postou uma infor-
mação ou imagem e outros usuários a copiaram e repostaram em seus próprios websites,
o autor do conteúdo tem o direito de deletá-las?
Imagine-se a situação de uma adolescente que se arrependa de postar em uma rede
social sua própria foto segurando garrafa de cerveja e, depois de deletá-la, descobre que
muitos de seus amigos virtuais a copiaram e repostaram a sua foto em seu próprio website.
Após pedir, sem sucesso, que seus amigos deletem as fotos, e estes se recusem, ou não
consiga encontrá-los, o Facebook, instado a tanto, deveria ser obrigado a apagar as fotos
sem o consentimento dos titulares dos perf‌is, devido à simples objeção da adolescente?
De acordo com a proposta europeia do direito ao esquecimento, a resposta cer-
tamente seria que sim. De acordo com o regulamento, quando alguém deseja deletar
os seus dados pessoais, o serviço provedor da Internet deve atender à solicitação sem
41. KOOPS, Bert-Jaap. Forgetting footprints, shunning shadows. A critical analysis of the “Right to be Forgotten” in
Big Data practice. 8:3 SCRIPTed 229(2011) g/?p=43. In: https://papers.ssrn.com/sol3/papers.
cfm?abstract_id=1986719>. Acesso em: 08 jun. 2020.
42. FLEISCHER, Peter. Foggy thinking about the right to oblivion. Disponível em:
com.br/2011/03/foggy-thinking-about-right-to-oblivion.html>. Acesso em: 15 jan. 2020. Acerca da mencionada
neblina, entende André Brandão Nery Costa que “se há que se falar em neblina, ela diz respeito a como é tratada a
identidade dos usuários na Internet, que cada vez mais se torna opaca e se distancia da realidade” (COSTA, André
Brandão Nery. Op. cit. p. 205).
EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 77EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 77 31/03/2021 16:10:0131/03/2021 16:10:01
GUILHERME MAGALHÃES MARTINS
78
demora, a não ser que a retenção do dado seja necessária ao exercício do direito à livre
expressão, def‌inido pelos estados membros nas suas próprias leis locais. Em outra seção,
a regulamentação cria uma isenção do direito de remover dados como “dados pessoais
para f‌ins exclusivamente jornalísticos, artísticos ou expressão literária”.
Para uma prévia de quão assustador esse efeito deve ser, considere o fato de que
o direito ao esquecimento não somente pode ser exercido em face de provedores de
conteúdo e hospedagem (como o Facebook e um jornal ou revista) como em face de
provedores de pesquisa como Google e Yahoo.
O direito ao esquecimento se desmembra em duas grandes vertentes: a primeira
(“droit à l´oubli´”) se relaciona com informações que possuíam interesse quando foram
tornadas públicas, mas, em virtude do decurso do tempo, acabaram perdendo essa qua-
lidade, fazendo com que desaparecessem os motivos que justif‌icaram sua divulgação.
É o caso dos indivíduos que não mais pretendem ser relacionados aos fatos do passado,
cabendo a ponderação entre o direito da coletividade de acesso à informação e o direito
do titular de impedir aquela divulgação.
Já para uma segunda vertente, que se manifesta de maneira mais expressiva na
Internet, trata-se do poder do próprio titular dos dados de exigir que a informação seja
apagada, na hipótese em que os dados são coletados e processados por terceiros (“right
to erasure”). A diferença básica entre ambas as vertentes é a seguinte: enquanto o droit à
l´oubli normalmente colide com outros direitos fundamentais, em especial a liberdade de
expressão e o direito à informação, o “right to erasure” se manifesta na simples remoção
de dados pessoais fornecidos para fornecimento automático.
Em caso concreto envolvendo o “right to erasure”, em junho de 2013, a Agência
Espanhola de Proteção de Dados ingressou com procedimento sancionatório em face
da Google, tendo em vista a nova política de privacidade daquela empresa.43 O objetivo
da medida é esclarecer, entre outros aspectos, se a combinação de dados procedentes
de diversos serviços cumpre as garantias de informação aos usuários, se as f‌inalidades
e a proporcionalidade no uso da informação legitimam o tratamento de dados e se os
períodos de conservação e as opções para que os usuários exerçam seus direitos de
acesso, retif‌icação, cancelamento e oposição observam a Lei Espanhola de Proteção de
Dados. O procedimento sancionatório foi produto de cooperação com as Agências de
Dados da Alemanha, Holanda, Reino Unido, França e Itália, que igualmente agiram no
mesmo sentido.
No dia 13 de maio de 2014, o Tribunal de Justiça da União Europeia reconheceu
o direito ao esquecimento no caso acima, tendo como partes a Agência Espanhola de
Proteção de Dados e a Google, de um lado, e, do outro, o cidadão espanhol Mario Cos-
teja González, em relação ao fato de, nos idos de 1990, o imóvel de propriedade deste
ter sido levado a leilão para pagamento de dívidas com a previdência social da Espanha,
não obstante o pagamento do débito tivesse posteriormente obstado a venda judicial.
43. La AEPD abre un procedimiento sancionador a Google por su política de privacidad. Disponível em:
www.agpd.es/portalwebAGPD/revista_prensa/revista_prensa/2013/notas_prensa/common/junio/130620_NP_
PS_GOOGLE.pdf>. Acesso em: 15 jan. 2020.
EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 78EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 78 31/03/2021 16:10:0131/03/2021 16:10:01
79
O DIREITO AO ESQUECIMENTO NA INTERNET
Embora satisfeito o débito, as dívidas e a referência ao leilão continuaram apare-
cendo nas buscas pelo nome do interessado no site da Google, de maneira ofensiva à
sua dignidade, não obstante se tratasse de informação pretérita e sem relevância social.
O Tribunal de Justiça Europeu considerou que o operador de um motor de busca sofre
a incidência do artigo 2o, d, da Diretiva 95/46 da Comunidade Econômica Europeia,
que def‌ine o responsável pelo tratamento de dados pessoais como “a pessoa singular ou
coletiva, a autoridade pública, o serviço ou qualquer outro organismo que, individual-
mente ou em conjunto com outrem, determine as f‌inalidades e os meios de tratamento
dos dados pessoais”.44
No entanto, o Tribunal de Justiça da Corte Europeia, na parte f‌inal da decisão, res-
saltou que solução diversa poderia ser dada ao caso concreto por razões especiais, como
o papel desempenhado pelo interessado na vida pública, caso em que “a ingerência nos
seus direitos fundamentais é justif‌icada pelo interesse preponderante do referido público
em ter acesso à informação em questão, em virtude dessa inclusão.
Finalmente, deve ser mencionada uma terceira categoria de direito ao esquecimento,
que abrange os conteúdos disponibilizados por terceiros: “Se alguém postar algo sobre
mim, eu tenho o direito de deletar tal informação?” Essa, com certeza, é a maior preocupa-
ção da ideia de livre expressão.
A recente decisão da Corte Infraconstitucional Alemã, Bundesgerichtshof (BGH),
de 27 de julho de 2020, estabeleceu que o direito ao apagamento e, por conseguinte, o
direito à desindexação, não é absoluto. Para a Corte, o Art. 17, parágrafo 1, do RGPD
não se aplica como um todo se o processamento de dados for necessário para o exercício
do direito à liberdade de expressão. Esta circunstância é a expressão de que o direito
à proteção de dados pessoais não é um direito irrestrito. Como af‌irma o quarto consi-
derando do RGPD, no que diz respeito à sua função social e mantendo o princípio da
44. Segue um trecho da fundamentação do acórdão do Tribunal de Justiça da Corte Europeia: “Ora, é o operador do
motor de busca que determina as f‌inalidades e os meios dessa atividade e, deste modo, do tratamento de dados
pessoais que ele próprio efetua no contexto dessa atividade e que deve, consequentemente, ser considerado “res-
ponsável “ por esse tratamento por força do referido artigo 2o, alínea d. Por outro lado, importa declarar que seria
contrário não só à redação clara desta disposição mas também ao seu objetivo, que consiste em assegurar, através de
uma def‌inição ampla do conceito de ‘responsável’, uma proteção ef‌icaz e completa das pessoas em causa, excluir dela o
operador de um motor de busca pelo fato de não exercer controle sobre os dados pessoais publicados nas páginas web de
terceiros. A esse respeito, deve-se salientar que o tratamento de dados pessoais efetuado no contexto da atividade
de um motor de busca se distingue do efetuado pelos editores dos sítios web, que consiste em fazer f‌igurar esses
dados numa página web, e acresce ao mesmo. Além disso, é pacíf‌ico que essa atividade dos motores de busca tem um
papel decisivo na difusão global dos referidos dados, na medida em que os torna acessíveis a qualquer internauta que
efetue uma pesquisa a partir do nome da pessoa em causa, incluindo os internautas que, de outra forma, não teriam
encontrado a página web onde esses mesmos dados estão publicados. Além disso, a organização e a agregação das
informações publicadas na Internet, efetuadas pelos motores de busca com o objetivo de facilitar aos seus utilizadores
o acesso às mesmas, podem conduzir, quando a pesquisa destes utilizadores é feita a partir do nome de uma pessoa
singular, que estes obtenham, com a lista de resultados, uma visão global mais estruturada das informações sobre esta
pessoa, que se podem encontrar na Internet, que lhes permita estabelecer um perf‌il mais ou menos detalhado da pessoa
em causa. Por conseguinte, na medida em que a atividade de um motor de busca é suscetível de afetar, signif‌icativamente
e por acréscimo à dos editores de sítios web, os direitos fundamentais à vida privada e à proteção dos dados pessoais, o
operador desse motor, como pessoa que determina as f‌inalidades e os meios dessa atividade, deve assegurar, no âmbito
das suas responsabilidades, das suas competências e das suas possibilidades, que essa atividade satisfaça as exigências
da Diretiva 95/46, para que as garantias nesta previstas possam produzir pleno efeito e possa efetivamente realizar-se
uma proteção ef‌icaz e completa das pessoas em causa, designadamente no seu direito ao respeito pela sua vida privada
(g.n.)”.
EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 79EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 79 31/03/2021 16:10:0131/03/2021 16:10:01
GUILHERME MAGALHÃES MARTINS
80
proporcionalidade contra outros direitos fundamentais, devem ser ponderados e, esta
ponderação dos direitos fundamentais, é baseada em todas as circunstâncias relevantes
do caso individual. Deve-se também, levar em consideração, a gravidade da interferência
com os direitos fundamentais da pessoa em causa.45
No contexto da avaliação, deve-se levar em consideração que a Internet não seria
utilizável por indivíduos sem a ajuda de um mecanismo de busca, devido à inundação de
dados não mais gerenciáveis. Em última análise, a utilização da Internet como um todo
está dependente da existência e disponibilidade de motores de pesquisa, cujo modelo
de negócio foi, portanto, aprovado pelo ordenamento jurídico e socialmente desejável.
Isso pode levar ao fato de os usuários do mecanismo de pesquisa com a lista de resultados
receberem uma visão geral estruturada das informações sobre a pessoa em questão na In-
ternet, com base na qual eles podem criar um perf‌il mais ou menos detalhado da pessoa.46
Neste contexto, o peso dos interesses econômicos do gerente do mecanismo de
pesquisa por si só geralmente não é suf‌icientemente pesado para limitar os direitos das
pessoas afetadas. Em contrapartida, tem maior peso o interesse do público pela informa-
ção e, sobretudo, os direitos fundamentais de terceiros a aqui incluídos. Portanto, não há
presunção de prioridade da proteção dos direitos pessoais, mas os direitos fundamentais
opostos devem ser avaliados em pé de igualdade. Assim como os indivíduos não podem
determinar unilateralmente, em relação aos meios de comunicação, quais informações
são divulgadas sobre eles no contexto da comunicação pública, eles não têm esse poder
de determinação em relação aos operadores de mecanismo de pesquisa.47
Ou seja, o Bundesgerichtshof, mesmo que no processo tenha negado o direito à desin-
dexação ao autor, colocando como princípio o interesse geral e a não possibilidade de desvin-
cular os acontecimentos ao autor, a Corte foi bem clara em colocar a existência do direito ao
esquecimento como um direito fundamental e que deve ser julgado em cada caso particular,
ao confronto de dois ou mais direitos fundamentais.
A Suprema Corte dos Estados Unidos def‌iniu que os Estados não podem promulgar
leis que restrinjam a liberdade de imprensa, salvo em casos de informações embaraço-
sas – como no caso das vítimas de estupro –, a não ser que a informação seja adquirida
legalmente.
É possível que, apesar de a proposta de regulação europeia def‌inir o direito ao es-
quecimento como algo muito abrangente, o instituto seja aplicado de forma mais restrita.
Os europeus têm uma longa tradição de declarar direito de privacidade abstratos
na teoria, mas que fracassam na prática. A regulamentação deve ser aperfeiçoada, em
virtude dos esforços envidados pelo Parlamento Europeu e pelo Conselho dos Ministros.
Mas, ao anunciar a regulamentação, Viviane Reding disse pretender uma solução mais
aberta, apta a abranger as novas tecnologias do futuro: “Essa regulamentação precisa
permanecer por 30 anos – precisa ser muito clara, mas ao mesmo tempo imprecisa o
45. Bundesgerichtshof. VI ZR 405/18, Verkündet am: 27. Juli 2020, OLG Frankfurt am Main.
46. Bundesgerichtshof. VI ZR 405/18, Verkündet am: 27. Juli 2020, OLG Frankfurt am Main.
47. Bundesgerichtshof. VI ZR 405/18, Verkündet am: 27. Juli 2020, OLG Frankfurt am Main.
EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 80EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 80 31/03/2021 16:10:0131/03/2021 16:10:01
81
O DIREITO AO ESQUECIMENTO NA INTERNET
suf‌iciente para que as mudanças do mercado ou da opinião pública sejam manobradas
pela regulamentação”.
É difícil imaginar que a Internet dos próximos anos será tão livre e aberta como é
hoje em dia.
Dentre os principais argumentos contrários ao acolhimento do direito do esque-
cimento, especialmente nos casos levados ao Superior Tribunal de Justiça, a seguir
examinados, a doutrina destaca os seguintes:48
• a violação à liberdade de expressão;
• a possibilidade de perda da história;
• a privacidade como censura dos tempos atuais;
• o privilégio da memória individual em detrimento daquela da sociedade;
• a ausência de registro sobre crimes perversos;
• a inexistência de ilicitude do ato;
• a preservação do interesse coletivo;
• a extinção de programas policiais.
A especif‌icidade do direito ao esquecimento na Internet não se restringe à forma de
tutela. O próprio conceito de esquecimento sofre profundas transformações, na medida
em que não se trata apenas de limitar a divulgação de informações pessoais destituídas
de interesse social ou informativo por terceiros, como também de se reapropriar do
controle dos dados muitas vezes fornecidos pelo próprio interessado, como condição
para o exercício de determinado serviço. Trata-se, portanto, da pretensão de apagar uma
informação muitas vezes voluntariamente tornada pública.
Viktor Mayer-Schönberger chega a propor a reintrodução da ideia de esquecimen-
to no ambiente virtual através do estabelecimento pelos próprios usuários de datas de
expiração para as informações disponibilizadas.49 Tal critério, no entanto, não poderia
se sobrepor ao interesse público no sentido da divulgação das informações, da memória
social e da história, sob pena de gerar insegurança.
Em qualquer caso, deve haver uma ponderação de interesses entre o direito ao es-
quecimento e a liberdade de imprensa, somente podendo ocorrer o seu reconhecimento
caso se trate de ofensa suf‌icientemente grave à pessoa humana, de modo a restringir a
disseminação de determinada informação.
A utilidade informativa da divulgação da notícia, portanto, deve ser sopesada com
os riscos trazidos pela recordação do fato à pessoa envolvida.50
48. BUCAR, Daniel. Op. cit. p. 5.
49. MAYER-SCHÖNBERGER, Viktor. Delete. Op. cit. p. 50. Nas palavras do autor, “One possible way we can mimic
forgeting in the digital realm is by associating information we store in digital memory with expiration dates
that users set. Our digital storage devices would be made to automatically delete information that has reached
or exceded its expiry date”. Tradução livre: “Uma maneira possível para que possamos imitar o esquecimento
humano no mundo digital é através da associação de informações que armazenamos em memória digital e datas
de vencimento que os usuários def‌inam. Nossos dispositivos de armazenamento digital seriam programados para
excluir automaticamente as informações que atingiram ou ultrapassaram o seu prazo de validade”.
50. SCHREIBER, Anderson. Direitos da personalidade. São Paulo: Atlas, 2011. p. 166.
EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 81EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 81 31/03/2021 16:10:0131/03/2021 16:10:01
GUILHERME MAGALHÃES MARTINS
82
Consoante o art. 4o, III, da Lei no 8.078/90, que se aplica aos provedores de redes sociais,
considerando a remuneração indireta dos respectivos serviços (art. 3o, § 2o do Código de
Defesa do Consumidor), constitui princípio da Política Nacional das Relações de Consumo a
“harmonização dos interesses dos participantes da relação de consumo e a compatibilização da
proteção do consumidor com a necessidade de desenvolvimento econômico e tecnológico”.
Mas a principal consequência do exercício do direito ao esquecimento, tendo em
vista o princípio da precaução, deve ser a imposição de obrigações de fazer e não fazer,
consagrando o “direito de não ser vítima de danos”, tendo em vista, após a ponderação
dos interesses envolvidos, a retirada do material ofensivo.
A reparação de danos somente ocorrerá excepcionalmente, caso se trate de ofensa
consumada a situação jurídica existencial, não passível de remédio por meio da execução
específ‌ica.51
O Marco Civil da Internet, no seu artigo 7º., X, prevê como direito básico do usuário
a “exclusão def‌initiva dos dados pessoais que tiver fornecido a determinada aplicação
de Internet, a seu requerimento, ao término da relação entre as partes, ressalvadas as
hipóteses de guarda obrigatória de registros previstas nesta lei”. Trata-se, a nosso ver,
de uma modalidade específ‌ica de direito ao esquecimento, baseada nos deveres laterais,
anexos ou instrumentais de conduta decorrentes do princípio da boa-fé objetiva, embora
não tenha sido essa a orientação prevalente no Supremo Tribunal Federal, por ocasião
da apreciação do Tema 786 de Repercussão Geral.
A Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais, Lei 13.709/18, também faz referência
nos seus artigos 5º., III e XI e 18, à anonimização, bloqueio ou eliminação de dados. 52
4 APLICAÇÃO DO INSTITUTO NA JURISPRUDÊNCIA DOS TRIBUNAIS
SUPERIORES
O Superior Tribunal de Justiça teve a oportunidade de enfrentar o direito ao esque-
cimento pela primeira vez ao julgar o caso Xuxa vs. Google.
Em 1992, a atriz e apresentadora Xuxa Meneghel impediu judicialmente o lança-
mento em videocassete do vídeo “Amor, estranho amor”, por recear que sua imagem junto
ao público infantil f‌icasse def‌initivamente deturpada.53
51. Como já tivemos a oportunidade de escrever, o princípio da precaução volta-se à “eliminação prévia (anterior à produção
do dano) dos riscos da lesão, paralelamente ao espaço já ocupado pela reparação dos danos já ocorridos, cujo mono-
pólio deixa de existir” (MARTINS, Guilherme Magalhães. Risco, solidariedade e responsabilidade civil. In: MARTINS,
Guilherme Magalhães. (Coord.). Temas de responsabilidade civil. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2012. p. xiii).
52. Artigo 5º Para os efeitos desta lei, considera-se:
III – dado anonimizado: dado relativo a titular que não possa ser identif‌icado, considerando a utilização de meios
técnicos e razoáveis e disponíveis na ocasião de seu tratamento;
XI – anonimização: utilização de meios técnicos razoáveis e disponíveis no momento do tratamento, por meio
dos quais um dado perde a possibilidade de associação, direta ou indireta, a um indivíduo;
Artigo 18 – O titular dos dados pessoais tem direito a obter do controlador, em relação aos dados do titular por ele
tratados, a qualquer momento e mediante requisição:
IV- anonimização, bloqueio ou eliminação de dados desnecessários, excessivos ou tratados em desconformidade
com o disposto nesta lei.
53. MORAES, Maria Celina Bodin; KONDER, Carlos Nelson. Op. cit. p. 288-289.
EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 82EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 82 31/03/2021 16:10:0131/03/2021 16:10:01
83
O DIREITO AO ESQUECIMENTO NA INTERNET
O caso foi julgado pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, tendo sido a
pretensão da apresentadora reconhecida em voto do Desembargador Thiago Ribas Filho:
Após o lançamento da ta (no cinema), ocorrido em 1982, Xuxa se projetou, nacional e internacional-
mente, com programas infantis na televisão, criando uma imagem que muito justamente não quer ver
atingida, cuja vulgarização atingiria não só ela própria como as crianças que são o seu público, ao qual
se apresenta como símbolo de liberdade infantil, de bons hábitos e costumes, e da responsabilidade
das pessoas.54
Em 2012, ante o ressurgimento das imagens do mencionado f‌ilme na Internet, a
apresentadora ingressou com ação de rito ordinário objetivando que fossem removidos
do site de pesquisas da ré denominado Google Search os resultados relativos à busca
pela expressão Xuxa pedóf‌ila ou qualquer outra que associasse o nome da autora, inde-
pendentemente da graf‌ia, se correta ou equivocada, a uma prática criminosa qualquer.
O pedido de antecipação de tutela foi deferido pelo Juízo de primeiro grau, deter-
minando que a Google se abstivesse de disponibilizar aos seus usuários, no seu site de
buscas, os mencionados resultados, sob pena cominatória. Em sede de agravo de ins-
trumento, o Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro manteve em parte a decisão
recorrida, restringindo a liminar apenas às imagens referidas na inicial, relativas ao f‌ilme
em questão, mas sem exclusão dos links na apresentação dos resultados de pesquisas.
A questão chegou ao Superior Tribunal de Justiça no Agravo em Recurso Especial
103.125-RJ, tendo o voto da Ministra Fátima Nancy Andrighi rechaçado o pedido da
atriz e apresentadora de f‌iltragem do conteúdo das pesquisas de cada usuário, por con-
siderar que:
3. O provedor de pesquisa é uma espécie do gênero provedor de conteúdo, pois não inclui, hospeda,
organiza ou de qualquer outra forma gerencia as páginas virtuais indicadas nos resultados disponibi-
lizados, se limitando a indicar links onde podem ser encontrados os termos ou expressões de busca
fornecidos pelo próprio usuário.
4. A ltragem de conteúdo das pesquisas feitas por cada usuário não constitui atividade intrínseca ao
serviço prestado pelos provedores de pesquisa, de modo que não se pode reputar defeituoso, nos termos
do art. 14 do CDC, o site que não exerce esse controle sobre os resultados das buscas.
5. Os provedores de pesquisa realizam suas buscas dentro de um universo virtual, cujo acesso é público
e irrestrito, ou seja, seu papel se restringe à identicação de páginas na web onde determinado dado
ou informação, ainda que ilícito, estão sendo livremente veiculados. Dessa forma, ainda que seus
mecanismos de busca facilitem o acesso e a consequente divulgação de páginas cujo conteúdo seja
potencialmente ilegal, fato é que essas páginas são públicas e compõem a rede mundial de computa-
dores e, por isso, aparecem no resultado dos sites de pesquisa.
6. Os provedores de pesquisa não podem ser obrigados a eliminar do seu sistema os resultados que
apontem para uma foto ou texto especíco, independentemente da indicação da URL da página onde
este estiver inserido.
7. Não se pode, sob o pretexto de dicultar a propagação de conteúdo ilícito ou ofensivo na web, reprimir
o direito da coletividade à informação. Sopesados os direitos envolvidos e o risco potencial de violação
de cada um deles, o el da balança deve pender para a garantia da liberdade de informação assegurada
pelo art. 220, parágrafo primeiro da CF/88, sobretudo considerando que a Internet representa, hoje,
importante veículo de comunicação social de massa.
54. TJRJ, 2a CC, Ap. cív. 1991.001.03819, Des. Thiago Ribas Filho, j. 27.2.1992.
EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 83EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 83 31/03/2021 16:10:0131/03/2021 16:10:01
GUILHERME MAGALHÃES MARTINS
84
8. Preenchidos os requisitos indispensáveis à exclusão, da web, de uma determinada página virtual, sob
alegação de veicular conteúdo ilícito ou ofensivo – notadamente a identicação da URL dessa página
– a vítima carecerá de interesse de agir contra o provedor de pesquisa, por absoluta falta de utilidade
de jurisdição. Se a vítima identicou, via URL, o autor do ato ilícito, não tem motivo para demandar
contra aquele que apenas facilita o acesso a esse ato que, até então, se encontra parcialmente disponível
na rede para divulgação.55
55. STJ, REsp 1.316.921-RJ, rel. Min. Nancy Andrighi, j. 26.6.2012. Em decisão mais recente, de 11 de dezembro de
2013, ao julgar a Reclamação no 5.072/AC, que teve como relator o Ministro Marco Buzzi, a Segunda Seção do
Superior Tribunal de Justiça manteve a mesma orientação acima, relativamente à responsabilidade dos provedo-
res de busca, sem referência específ‌ica ao direito ao esquecimento. Segundo este último julgado, a Google Brasil
Internet Ltda. restou isenta de arcar com multa cominatória (“astreinte”) por descumprir decisão judicial que a
obrigava a suprimir de seu site de pesquisa qualquer resultado que vinculasse o nome de um juiz à pedof‌ilia. Por
maioria, seguindo o voto-vista da ministra Nancy Andrighi, aquele colegiado considerou a obrigação “impossível
de ser efetivada”. Consoante o mesmo voto, “a liminar que determinava a exclusão dos resultados de busca não
fez referência explícita à retirada do conteúdo em cache, ainda que isso constasse do pedido formulado pelo autor
da ação. A permanência em cache do conteúdo ofensivo pode ter feito com que o resultado indesejado ainda
aparecesse na busca, mesmo após a retirada do ar da página original. O cache é uma espécie de memória tempo-
rária que armazena uma cópia do conteúdo da página original indicada no resultado da pesquisa, para agilizar os
resultados de busca. O cache possibilita acesso rápido às páginas buscadas e retém temporariamente os dados, que
são periodicamente substituídos por outras versões mais recentes, de modo a haver constante atualização. Não há
como precisar por quanto tempo cada página f‌ica na memória cache, variando caso a caso com base em diversos
fatores, como a quantidade de acessos à página, a taxa de atualização do site, sua estabilidade e a largura da banda”.
No entanto, o voto-vista da Ministra Nancy Andrighi reconhece que a manutenção em cache “prolonga os efeitos
danosos à honra e à imagem da vítima”. Assim, estando uma cópia do texto ofensivo em cache, deve o provedor
de pesquisa, uma vez ciente do fato, providenciar a exclusão preventiva, desde que seja oferecido o URL da página
original, bem como comprovado que esta já foi removida da Internet. Para tanto, deve haver não só um pedido
individualizado da parte, mas um comando judicial determinado e expresso no sentido de que a cópia em cache
seja removida. Nancy Andrighi considera isso essencial, sob pena de se prejudicar o direito à informação. “No caso
dos provedores de pesquisa virtual, a imposição de deveres subjetivos ou implícitos implicará, potencialmente,
restrição dos resultados de busca, o que viria em detrimento de todos os usuários, que dependem desse serviço para
conhecer todo o diversif‌icado conteúdo das incontáveis páginas que formam a web”, ponderou. A questão teve
origem com a publicação, em 22 de novembro de 2009, de uma matéria na revista Istoé relacionando magistrados
à pedof‌ilia. O nome de um juiz era citado. Tratando diretamente com a revista, ele conseguiu a retirada da matéria
digital do site da Istoé. No entanto, ao fazer busca com seu nome e o termo pedof‌ilia, o site da Google ainda trazia
a versão completa da reportagem. Em 3 de dezembro de 2009, o juiz ingressou com ação no juizado especial, pe-
dindo que a Google retirasse de seus registros públicos a página original da reportagem, ainda que em cache, bem
como de todas as reproduções, ainda que albergadas em outros sites. Pediu também que o Google impedisse em
seus mecanismos de busca a associação do seu nome com a matéria ou seu tema. No dia 4 de dezembro de 2009, o
juiz obteve uma liminar obrigando a Google, em 24 horas, a retirar das páginas de resultado da pesquisa qualquer
referência ao magistrado autor da ação, sob pena de multa diária de R$ 500. No dia 24 de fevereiro de 2010, a multa
foi aumentada para R$ 5.000/dia. A Google ingressou com reclamação perante a Segunda Seção, sustentando que a
liminar era teratológica, pois determinava uma ordem impossível de cumprir. Pediu a exclusão da multa total ou sua
redução. Segundo cálculo do relator no STJ, ministro Marco Buzzi, a astreinte alcançaria, quando do ajuizamento
da reclamação pela Google, a quantia de R$ 1,4 milhão. O ministro entendeu que o valor da multa era exorbitante e
deveria ser reduzido para 40 salários-mínimos, teto para as ações no juizado especial. Mas ele manteve a incidência
da multa, por considerar que era possível à Google o controle do conteúdo disponibilizado aos usuários. “A Google
possui ferramentas aptas a remover informações de conteúdo no resultado de busca”, af‌irmou. “Pode ser uma ação
de difícil cumprimento, mas não de impossível cumprimento, como alega”, acrescentou. Divergindo do relator, a
ministra Andrighi votou no sentido de afastar por completo a multa. Ela entendeu que a obrigação imposta à Google
na condição de site de pesquisa se mostra impossível de ser efetivada, daí decorrendo a teratologia da decisão. Ela
chamou a atenção para a diferença entre provedores de conteúdo (que têm controle editorial) e provedores de
pesquisa (que não o têm). A ministra explicou que os provedores de conteúdo têm facilidade para excluir material
a pedido dos usuários, mas os provedores de pesquisa, não. É preciso a indicação do URL para que este possa elimi-
nar o aparecimento de resultado indesejado em pesquisa. Com o URL, identif‌ica-se o site, e daí o IP, que localiza o
computador de onde saiu o conteúdo. Assim, é possível agir diretamente contra o autor. Os ministros João Otávio de
Noronha, Sidnei Beneti, Paulo de Tarso Sanseverino e Villas Bôas Cueva acompanharam esse entendimento. Em seu
voto-vista, a ministra Isabel Gallotti ressaltou que concordava com a posição da ministra Andrighi, no sentido de
que os provedores de pesquisa não podem ser obrigados a eliminar do resultado de busca palavras ou combinações
EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 84EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 84 31/03/2021 16:10:0131/03/2021 16:10:01
85
O DIREITO AO ESQUECIMENTO NA INTERNET
Os principais argumentos do voto em questão foram três: 1 – a impossibilidade
do cumprimento da obrigação em decorrência do estado da técnica atual; 2 – A incons-
titucionalidade do pleito em razão da imposição de censura prévia de conteúdo; 3 – A
relevância do serviço prestado pela Google, do qual dependeria o cotidiano de milhares
de pessoas.56
A solução deve passar pela ponderação, no caso concreto, dos interesses em conf‌lito
e do potencial verdadeiramente lesivo do que é postado nos sites de busca,57 levando em
conta os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana (art. 1o, III, CR) e
da solidariedade social (art. 3o, I, CR).
Mais recentemente, em maio de 2013, o Superior Tribunal de Justiça, no julga-
mento dos Recursos Especiais 1.334.097-RJ e 1.335.153-RJ, teve a oportunidade de
apreciar o direito ao esquecimento, ambos fazendo referência em sua fundamentação
ao Enunciado 531 do Conselho da Justiça Federal, aprovado na VI Jornada de Direito
Civil (março de 2013).
No Recurso Especial 1.334.097-RJ (STJ, 4a Turma, j. 28.5.2013),58 o autor obteve a
condenação da Rede Globo de Televisão por danos morais por ter seu nome vinculado
de palavras, fotos ou textos, sem que tenha sido especif‌icado pelo lesado o URL da página em questão. A ordem
judicial, na extensão em que foi dada no caso, não foi corretamente dirigida ao responsável pelo dano, af‌irmou a
ministra Gallotti: “A Google, apesar de ser uma gigante do setor, não é a dona da internet. O que se poderia exigir
era retirar do resultado da pesquisa aquela página”. Se, após a retirada da página pelo site responsável pelo conte-
údo, ele ainda continuar aparecendo no resultado da busca, é cabível voltar-se contra a Google, disse. A ministra
repeliu a argumentação da Google de que a liminar pediria uma ação impossível. Conforme os autos, no dia 21 de
janeiro de 2010 já não havia mais referência na busca do Google nem mesmo à página em cache. Assim, a ministra
entende que a astreinte no valor de R$ 500 deve ser calculada de 5 de dezembro de 2009 (data em que terminou
o prazo de 24 horas concedido pela decisão liminar) até aquela data.
56. BARBOSA, Fernanda Nunes. Internet e consumo: o paradigma da solidariedade e seus ref‌lexos na responsabilidade
do provedor de pesquisa. RT, São Paulo: Revista dos Tribunais. v. 924, p. 555, out. 2012.
57. Idem. Para a autora, “falar-se, portanto, de neutralidade, inviabilidade técnica e censura prévia apartados de uma
ponderação com os direitos existenciais da pessoa humana e da distribuição dos riscos sociais a partir de um
viés solidarista não se af‌igura a melhor maneira de se decidirem os casos difíceis que se apresentam para solução
do intérprete [...]. No julgamento em comentário, a Corte decidiu pela liberdade de informação, deixando de
considerar, no entanto, que no caso concreto a informação é inverídica e extremamente desabonadora. Da mes-
ma forma, deixou de reconhecer que o f‌iel da balança deve ser o valor da dignidade da pessoa humana e que, na
sociedade de consumo pós-moderna em que se vive, a atribuição dos ônus deve dar-se conforme um paradigma
de solidariedade”.
58. Segundo um trecho da ementa do voto, que enfrenta o tema de maneira lapidar: “2 – Nos presentes autos, o cerne
da controvérsia passa pela ausência de contemporaneidade da notícia de fatos passados, que reabriu antigas feridas
já superadas pelo autor e reacendeu a desconf‌iança da sociedade quanto à sua índole. O autor busca a proclamação
do seu direito ao esquecimento, um direito de não ser lembrado contra sua vontade, especif‌icamente no tocante
a fatos desabonadores, de natureza criminal, nos quais se envolveu, mas que, posteriormente, fora inocentado
[...] 6 – Não obstante o cenário de perseguição e tolhimento pelo qual passou a imprensa brasileira em décadas
pretéritas, e a par de sua inegável virtude histórica, a mídia do século XXI deve f‌incar a legitimação de sua liberdade
em valores atuais, próprios e decorrentes diretamente da importância e nobreza da atividade. Os antigos fantasmas
da liberdade de imprensa, embora deles não se possa esquecer jamais, atualmente, não autorizam a atuação informativa
desprendida de regras e princípios a todos impostos. 7 – Assim, a liberdade de imprensa há de ser analisada a partir de
dois paradigmas jurídicos bem distantes um do outro. O primeiro, de completo menosprezo tanto da dignidade da
pessoa humana quanto da liberdade de imprensa; e o segundo, o atual, de dupla tutela constitucional de ambos os
valores [...] 15 – Ao crime, por si só, subjaz um natural interesse público, caso contrário nem seria crime, e eventuais
violações de direito resolver-se-iam nos domínios da responsabilidade civil. E esse interesse público, que é, em
alguma medida, satisfeito pela publicidade do processo penal, f‌inca raízes essencialmente na f‌iscalização social
da resposta estatal que será dada ao fato. Se é assim, o interesse público que orbita o fenômeno criminal tende a
desaparecer na medida em que também se esgota a resposta penal conferida ao fato criminoso, a qual, certamente,
EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 85EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 85 31/03/2021 16:10:0131/03/2021 16:10:01
GUILHERME MAGALHÃES MARTINS
86
no programa Linha Direta-Justiça, relativo ao episódio conhecido como “Chacina da
Candelária”, não obstante ter sido absolvido criminalmente por negativa de autoria por
unanimidade dos membros do Conselho de Sentença.
O autor chegou a recusar convite para uma entrevista a ser veiculada naquele pro-
grama, que terminou por divulgar seu nome e sua imagem novamente em rede nacional,
contra a sua vontade. Embora o episódio tenha mencionado a absolvição, a menção ao
autor, 13 anos após o evento, ensejou sua condenação a compensar os danos morais
sofridos, arbitrados em R$ 50.000,00, pela 16a Câmara Cível do Tribunal de Justiça do
Estado do Rio de Janeiro.
Tal decisão foi alvo de embargos infringentes, que foram rejeitados, tendo o Su-
perior Tribunal de Justiça, no mencionado julgamento, mantido, por unanimidade, o
pleito indenizatório.59 O Ministro Gilson Dipp, vice-presidente do Superior Tribunal de
Justiça, em decisão monocrática de 25 de outubro de 2013, inadmitiu recurso extraordi-
nário interposto pela Rede Globo, tendo em vista a ausência de prequestionamento dos
arts. 220 e 221 da Constituição da República, bem como a ausência de violação direta à
Constituição da República. No dia 10 de dezembro de 2013, foi protocolado no Supremo
Tribunal Federal o Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 789.246, ainda pendente
de julgamento por ocasião da publicação deste livro, onde o Supremo Tribunal decidirá
pela primeira vez sobre o cabimento do direito ao esquecimento em face do ordenamento
civil-constitucional brasileiro.
Merece ser criticada, nos últimos dois acórdãos acima, a tutela diferenciada do
esquecimento nas mídias televisivas, onde sua aplicabilidade foi reconhecida, e na
Internet, ao argumento de que a questão seria muito mais complexa, descabendo a sua
encontra seu último suspiro, com a extinção da pena ou com a absolvição, ambas consumadas irreversivelmente.
E é nesse interregno temporal que se perfaz também a vida útil da informação criminal, ou seja, enquanto durar a
causa que a legitimava. Após essa vida útil da informação seu uso só pode ambicionar, ou um interesse histórico,
ou uma pretensão subalterna, estigmatizante, tendente a perpetuar no tempo as misérias humanas.16 – Com efeito,
o reconhecimento do direito ao esquecimento dos condenados que cumpriram integralmente a pena e, sobretudo,
dos que foram absolvidos em processo criminal, além de sinalizar uma evolução cultural da sociedade, confere
concretude a um ordenamento jurídico que, entre a memória – que é a conexão do presente com o passado – e a
esperança – que é o vínculo do futuro com o presente – faz clara opção pela segunda. E é por essa ótica que o direito
ao esquecimento revela sua maior nobreza, pois af‌irma-se, na verdade, como um direito à esperança, em absoluta sintonia
com a presunção legal e constitucional de regenerabilidade da pessoa humana. 17 – Ressalvam-se do direito ao esque-
cimento os fatos genuinamente históricos – historicidade essa que deve ser analisada em concreto – cujo interesse
público e social deve sobreviver à passagem do tempo, desde que a narrativa desvinculada dos envolvidos se f‌izer
impraticável. 18 – No caso concreto, a despeito de a Chacina da Candelária ter se tornado – com muita razão – um
fato histórico, que expôs as chagas do País ao mundo, tornando-se símbolo da precária proteção estatal conferida
aos direitos humanos da criança e do adolescente em situação de risco, o certo é que a fatídica história seria bem
contada e de forma f‌idedigna sem que para isso a imagem e o nome do autor precisassem ser expostos em rede
nacional. Nem a liberdade de imprensa seria tolhida, nem a honra do autor seria maculada, caso se ocultassem o
nome e a f‌isionomia do recorrido, ponderação de valores que, no caso, seria a melhor solução ao conf‌lito” (g. n.).
59. Em decisão monocrática do dia 25 de outubro de 2013, o vice-presidente do Superior Tribunal de Justiça, Ministro
Gilson Dipp, não admitiu recurso extraordinário interposto em face daquele acórdão da 4a Turma, tendo em vista
a ausência de prequestionamento dos dispositivos constitucionais apontados como violados, em especial os arts.
220 e 221 da Constituição da República. Concluiu ainda o vice-presidente que “no que diz respeito ao art. 5o, X,
da Constituição Federal, o Supremo Tribunal Federal tem entendido que a verif‌icação da indenização por danos
morais depende da análise da legislação infraconstitucional, caracterizando-se como possibilidade de ofensa
meramente indireta à Constituição da República”, conforme entendimento consolidado naquele Tribunal.
EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 86EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 86 31/03/2021 16:10:0131/03/2021 16:10:01
87
O DIREITO AO ESQUECIMENTO NA INTERNET
incidência no ambiente virtual, levando a um indesejável tratamento fracionado e, por
que não dizer, discriminatório de tão relevante direito fundamental.
O argumento da impossibilidade de se aplicar o direito ao esquecimento à Internet,
em virtude de supostas barreiras técnicas, enfraquece a cláusula geral de proteção à dig-
nidade da pessoa humana, levando à conclusão de que o espaço virtual estaria imune a
quaisquer limites.
Apartar a mídia televisiva de outros meios de comunicação signif‌ica dar à infor-
mação tratamento fragmentado, desconsiderando que, afora as técnicas específ‌icas de
cada mídia, deve haver uma disciplina unitária, independentemente do veículo, não se
justif‌icando a exclusão do direito de arrependimento na Internet.
Mais recentemente, atendendo ao critério do interesse histórico, o Superior Tribunal
de Justiça, por maioria, afastou o direito ao esquecimento no Recurso Especial 1.434.498,
interposto por Carlos Alberto Brilhante Ustra, em face de decisão do Tribunal de Justiça
de São Paulo que declarou a existência de danos morais e ofensa à integridade física dos
autores, que teriam sido vítimas de tortura em 1972, tendo sido o réu, na condição de
comandante do DOI-CODI, considerado responsável por tais atos.
A ação foi movida por Maria Amélia Teles, seu marido, Carlos Teles, e sua irmã,
Criméia de Almeida, que foram presos e submetidos a tortura no DOI-CODI durante a
ditadura militar, tendo sido afastadas as alegações de prescrição e de violação da regra
do art. 1º. da Lei de Anistia (Lei 6.683/79).
Em recente precedente, julgado no dia 08 de maio de 2018, a 3ª turma do Superior
Tribunal de Justiça, por maioria, reconheceu, com grande acerto, a incidência do direi-
to ao esquecimento no Recurso Especial 1.660.668, que teve como relator o Ministro
Marco Aurélio Bellizze, determinando que a Google Brasil , Yahoo! Do Brasil e Microsoft
Informática Ltda. eliminem dos seus resultados de busca o nome de uma promotora de
Justiça do Estado do Rio de Janeiro em relação a uma suposta fraude no concurso para a
magistratura ocorrida dez anos antes. Segundo um trecho do voto do relator, não se trata
de efetivamente apagar o passado, mas de permitir que a pessoa envolvida siga sua vida
com razoável anonimato, não sendo o fato desabonador corriqueiramente rememorado
e perenizado por sistemas automatizados de busca. Em ação ajuizada em 2009, a autora
ingressou com ação requerendo fossem apagadas informações, divulgadas em sites de
notícias e até mesmo nas páginas do Supremo Tribunal Federal e do Conselho Nacional
de Justiça, reportando que a promotora teria reproduzido integralmente o gabarito da
prova de Direito Tributário na fase escrita do certame. No entanto, dez anos após o ocor-
rido, já desempenhando suas funções como promotora de Justiça do Ministério Público
do Estado do Rio de Janeiro, a autora persistiu sendo atingida em sua dignidade devido
à mencionada referência nos sites de busca.60
60. A seguir, é reproduzido um trecho da fundamentação do acórdão: “(...) atualmente, o fato referido já conta com mais
de uma década, e ainda hoje os resultados de busca apontam como mais relevantes as notícias a ele relacionadas,
como se, ao longo desta década, não houvesse nenhum desdobramento da notícia, nem fatos novos relacionados
ao nome da recorrida. Note-se que não se trata de impugnar o resultado em pesquisas que pretendessem resgatar
notícias vinculadas a fraudes em concurso nem os resultados decorrentes da busca que associasse o nome da
recorrida a outro critério que aludisse a concursos públicos ou fraudes. A insurgência é restrita ao apontamento
EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 87EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 87 31/03/2021 16:10:0131/03/2021 16:10:01
GUILHERME MAGALHÃES MARTINS
88
Note-se que, apesar de se tratar de pessoa pública, o fato em questão não guarda
qualquer conexão com as funções de promotora de Justiça, atualmente exercidas pela
autora, considerando ainda que o procedimento apuratório envolvendo a alegada fraude
foi inclusive arquivado pelo Conselho Nacional de Justiça. Trata-se de um precedente a
ser comemorado na defesa do direito a não ser vítima de danos, a ser perseguido mediante
obrigações específ‌icas de fazer ou não fazer.
O Supremo Tribunal Federal, por maioria, seguiu o voto do Ministro Dias Tóffoli,
no julgamento do Recurso Extraordinário 1.010.606/RJ, lavrado no dia 04 de fevereiro
de 2021. O voto, após estabelecer um preciso e técnico histórico da matéria, juntamente
com as controvérsias que a cercam, considerou, ao apreciar o caso Aida Curi, a seguinte
proposta de tema de repercussão geral: “ Tema 786 – É incompatível com a Constituição a
ideia de um direito ao esquecimento, assim entendido como o poder de obstar, em razão
da passagem do tempo, a divulgação de fatos ou dados verídicos e licitamente obtidos e
publicados em meios de comunicação social analógicos ou digitais. Eventuais excessos
ou abusos no exercício da liberdade de expressão e de informação devem ser analisados
caso a caso, a partir dos parâmetros constitucionais – especialmente os relativos à pro-
teção da honra, da imagem, da privacidade e da personalidade em geral – e as expressas
e específ‌icas previsões legais nos âmbitos penal e cível”. Tal decisão vinculará todo o
Poder Judiciário nacional, por força da repercussão geral.
Tal decisão, cujo efeito vinculante não se discute mas, pelo contrário, se impõe,
vai de encontro a uma outra decisão histórica do próprio Supremo Tribunal Federal,
que considerou o direito à proteção de dados pessoais como um direito fundamental
autônomo, envolvendo a Medida Provisória 954/2020, que previa o compartilhamento
obrigatório de dados de empresas de telefonia com o IBGE(ações diretas de inconstitu-
cionalidade 6.387, 6.388, 6389, 6.393 e 6.390). A mencionada decisão, que consolidou
o dado pessoal como merecedor de tutela constitucional, reconheceu que não há dados
pessoais neutros ou insignif‌icantes no atual contexto, tendo em vista a formação de perf‌is
informacionais de grande valia para o mercado e para o Estado, inexistindo, portanto,
dados insignif‌icantes, consoante o voto da Ministra Carmen Lúcia.61
O direito à proteção de dados apresenta-se essencialmente como um direito de
garantias de um conjunto de valores fundamentais individuais de que se destacam a
privacidade e a liberdade, em poucas palavras, a autodeterminação individual.62
Baseou-se o voto do relator na prevalência apriorística das liberdades de expressão
e de informação sobre a dignidade da pessoa humana, bem como na analogia com o
precedente das biograf‌ias não autorizadas(ADIN 4.815), havendo ainda referência ao
de seu nome como critério exclusivo, desvinculado de qualquer outro termo, e a exibição de fato desabonador
divulgado há mais de dez anos entre as notícias mais relevantes”.
61. MENDES, Laura Schertel. Decisão histórica do STF reconhece direito fundamental à proteção de dados pessoais.
Jota. Disponível em: .jota.info/opiniao-e-analise/artigos/
decisao-historica-do-stf-reconhece-direito-fundamental-a-protecao-de-dados-pessoais-10052020>. Acesso em:
11 fev. 2021.
62. MARTINS, Guilherme Magalhães; GUIMARÃES, João Alexandre. Direito ao esquecimento no STF: a dignidade
da pessoa humana em risco. Consultor Jurídico. São Paulo, 10 de fevereiro de 2021, p.03. Disponível em:
www.conjur.com.br/2021-fev-10/martins-guimaraes-direito-esquecimento-stf?imprimir=1>. Acesso em: 12 fev.
2021.
EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 88EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 88 31/03/2021 16:10:0131/03/2021 16:10:01
89
O DIREITO AO ESQUECIMENTO NA INTERNET
argumento econômico, no sentido da preservação das empresas que operam no setor,
à liberdade de circulação de informações, bem como à ausência de norma específ‌ica no
direito brasileiro, ao contrário do que teria ocorrido no artigo 17 do RGPD europeu.
José Joaquim Gomes Canotilho, Jónatas E. M. Machado e Antônio Pereira Gaio
Júnior assim def‌inem as biograf‌ias não autorizadas: “a obra que, como o nome indica,
abrange textos onde se pretende narrar, total ou parcialmente, com um grau razoável
de sistematicidade e completude, a vida de uma pessoa, ou aspectos específ‌icos da mes-
ma, do ponto de vista espacial ou temporal. Diz-se não autorizada a biograf‌ia que não
conta com a autorização expressa ou tácita do visado, prescindindo da sua colaboração
e pretendendo subtrair-se aos pedidos ou ditames. De um modo geral, estas biograf‌ias
incidem sobre f‌iguras públicas, tendo por isso interesse público e suscitando o interesse
do público. No entanto(...) não está excluída a possibilidade de versarem mesmo sobre
f‌iguras privadas”63
O direito ao esquecimento possui abrangência diversa, pois envolve fatos que, pelo
decurso do tempo, perderam relevância histórica, de modo que sua divulgação se torna
abusiva, por causar mais prejuízos aos particulares do que benefícios à sociedade. O di-
reito ao esquecimento, é verdade, é um direito excepcional, não podendo ser banalizado,
mas sua exclusão, em sede de repercussão geral, pode implicar um grave retrocesso em
face do princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1º., III, CR), consideradas ainda
a privacidade e a identidade pessoal, que o compõem em sua estrutura. A exigência de
norma específ‌ica, a depender da vontade legislativa, é um incentivo à inação, semelhante-
mente ao entendimento do próprio Supremo Tribunal Federal, que no passado sepultou
a garantia fundamental do mandado de injunção.
O direito ao esquecimento visa apagar traços ou dados deixados pelo seu titular, não
tendo o traço uniforme de uma escrita, como nas biograf‌ias não autorizadas; ademais, a
prevalência apriorística da liberdade de expressão e de informação, ao ensejo de evitar
eventual censura, iria de encontro a outros valores igualmente caros à Constituição da
República, ligados ao livre desenvolvimento da pessoa humana.
Para Menezes Cordeiro, a natureza jurídica do direito ao esquecimento suscita dú-
vidas. Seguindo a letra do preceito, o direito ao esquecimento não consiste num direito a
exigir, do público em geral, o apagamento de determinados dados pessoais, mas somente
no direito a exigir ao responsável pelo tratamento que informe os demais responsáveis
de que o titular dos dados lhes solicitou o apagamento das ligações para esses dados
pessoais, bem como o apagamento de eventuais cópias ou reproduções.64
O Caso Aida Curi, 65 envolvendo um feminicídio ocorrido em Copacabana, Rio de
Janeiro, em 1958, tornou-se nacionalmente famoso, havendo inúmeros livros e reporta-
gens a seu respeito. No dia 29 de abril de 2004, quase meio século após seu falecimento,
63. CANOTILHO, José Joaquim Gomes; MACHADO, Jónatas E. M.; GAIO JÚNIOR, Antônio Pereira. Biograf‌ia não
autorizada versus liberdade de expressão. 3.ed. Curitiba: Juruá, 2017. p.35-36.
64. CORDEIRO, A. Barreto Menezes. Direito da Proteção de Dados: À Luz do RGPD e da Lei 58/2019. Coimbra:
Almedina, 2016. Página 275.
65. SILVA, Roberto Baptista Dias da; PASSOS, Ana Beatriz Guimarães. Entre lembrança e olvido: uma análise das de-
cisões do STJ sobre direito ao esquecimento. Revista Jurídica da Presidência. Brasília, v. 16, n. 109, jun./set. 2014.
p. 410.
EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 89EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 89 31/03/2021 16:10:0131/03/2021 16:10:01
GUILHERME MAGALHÃES MARTINS
90
o Programa Linha Direta Justiça dedicou um episódio à morte da jovem, fato que mo-
tivou a interposição de ação de reparação por danos morais, materiais e à imagem por
seus quatro irmãos – Nelson, Roberto, Waldir e Maurício Curi, em face da TV Globo
Ltda. Sustentam os autores que o crime havia sido esquecido com o passar dos anos e
sua exibição reabrira feridas antigas na vida da família, pois rememorava a vida, a morte
e a pós-morte de sua irmã, inclusive com uso de sua imagem. Alegam, ainda, que a ex-
ploração do caso pela rede de televisão foi ilícita, uma vez que ela fora notif‌icada pelos
autores para não fazê-lo.66
No caso, portanto, os irmãos de Aida Curi, postularam a reparação dos danos morais
e materiais em face da Rede Globo, tendo em vista a lembrança do trágico episódio no
mesmo programa Linha Direta-Justiça. Quanto ao dano moral, o fundamento do pedido
foi o fato de se reviver o passado; já em relação ao dano material, a postulação reparatória
foi a exploração da imagem da falecida irmã com objetivo comercial e econômico.
Em primeira e segunda instâncias, os pedidos dos autores foram julgados improce-
dentes, sob o fundamento de que o homicídio de Aida Curi foi amplamente divulgado pela
imprensa no passado e ainda é discutido e noticiado nos presentes dias, tendo entrado
para o domínio público. Em seguida, sobrevieram os Recursos Especial e Extraordinário,
este último não admitido pelo Supremo Tribunal Federal. 67
Foi negado provimento ao Recurso Especial, tendo a Quarta Turma, por maioria de
votos(três votos a dois), acompanhado o relator, Ministro Luis Felipe Salomão.
Segundo um trecho da ementa do julgado no Superior Tribunal de Justiça: “A re-
portagem contra a qual se insurgiram os autores foi ao ar 50 (cinquenta) anos depois da
morte de Aida Curi, circunstância da qual se conclui não ter havido abalo moral apto a
gerar responsabilidade civil. Nesse particular, fazendo-se indispensável a ponderação
de valores, o acolhimento do direito ao esquecimento, no caso, com a consequente in-
denização, consubstancia desproporcional corte à liberdade de imprensa, se comparado
ao desconforto gerado pela lembrança”.
O voto vencedor, do Ministro Luis Felipe Salomão, considerou que, no caso, a
liberdade de imprensa (art. 220, Constituição da República) deveria preponderar sobre
a inviolabilidade da intimidade, vida privada, honra e imagem das pessoas(art. 5o., X e
220, parágrafo primeiro da Constituição da República), vez que, além de a matéria não
estar incrementada de artif‌iciosidade, os fatos revelaram notícia histórica de repercussão
nacional. Af‌irmou-se, na conclusão, que a divulgação da foto da vítima, mesmo sem o
consentimento da família, não conf‌iguraria dano indenizável.
Concluíram os Ministros, por maioria, que “o direito ao esquecimento, que ora
se reconhece para todos, ofensor e ofendidos, não alcança o caso dos autos, em que se
reviveu, décadas depois do crime, acontecimento que entrou para o domínio público, de
modo que se tornaria impraticável a atividade da imprensa para o desiderato de retratar
o caso Aida Curi, sem Aida Curi”.
66. SILVA, Roberto Baptista Dias da; PASSOS, Ana Beatriz Guimarães. Entre lembrança e olvido, op. cit., p. 410.
67. SILVA, Roberto Baptista Dias da; PASSOS, Ana Beatriz Guimarães. Entre lembrança e olvido, op. cit., p. 410.
EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 90EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 90 31/03/2021 16:10:0131/03/2021 16:10:01
91
O DIREITO AO ESQUECIMENTO NA INTERNET
O caso Aida Curi chegou ao Supremo Tribunal Federal, tendo prevalecido, por
maioria, o voto do Ministro Dias Tóffoli, no julgamento do Recurso Extraordinário
1.010.606/RJ, nos dias 04, 05, 11 e 12 de fevereiro de 2021.
O voto do relator, após estabelecer, na sua parte inicial, um preciso e técnico his-
tórico da matéria, juntamente com as controvérsias que a cercam, considerou, após a
apreciação do caso Aida Curi, a seguinte proposta de tese de repercussão geral, aprovada
por maioria de nove votos a um : “ Tema 786 – É incompatível com a Constituição a ideia
de um direito ao esquecimento, assim entendido como o poder de obstar, em razão da
passagem do tempo, a divulgação de fatos ou dados verídicos e licitamente obtidos e
publicados em meios de comunicação social analógicos ou digitais. Eventuais excessos
ou abusos no exercício da liberdade de expressão e de informação devem ser analisados
caso a caso, a partir dos parâmetros constitucionais – especialmente os relativos à pro-
teção da honra, da imagem, da privacidade e da personalidade em geral – e as expressas
e específ‌icas previsões legais nos âmbitos penal e cível”.
O voto do relator analisa o direito ao esquecimento em função dos elementos que
compõem o seu conceito, segundo a doutrina, a saber, a licitude ou veracidade da in-
formação e do decurso do tempo, propulsor de degradação da informação do passado.
Em outra oportunidade, já nos manifestamos sobre a(in)utilidade de um tema de
repercussão geral, tendo em vista a natureza caleidoscópica do direito ao esquecimento,
comprometendo a aplicação de uma tese para outros casos “análogos”, que dif‌icilmente
existirão, considerando as peculiaridades da hipótese e a amplitude da nomenclatura
“direito ao esquecimento”,68 objeto de críticas, muitas fundadas, pela doutrina. Há de
ser considerado o disposto no artigo 926, parágrafo segundo do Código de Processo
Civil, que determina que, ao editar enunciados de súmula, os tribunais devem ater-se às
circunstâncias fáticas dos precedentes que motivaram sua criação. O conteúdo dinâmico
do direito ao esquecimento dif‌iculta a aplicação de um precedente em outros casos, que
apresentam suporte fático distinto.
O Caso da Chacina da Candelária, apreciado pelo Superior Tribunal de Justiça no
julgamento do Recurso Especial 1.334.097, teve suporte fático completamente diver-
so, onde se justif‌icaria a anonimização do envolvido na reportagem jornalística, o que
obstaria à efetividade da tese.
Alguns efeitos merecem ser extraídos da decisão acima. Em primeiro lugar, o voto
do relator, seguido por maioria pelo Supremo Tribunal Federal, vencidos, na apreciação
do Recurso Extraordinário 1.010.606/RJ, os Ministros Luiz Edson Fachin, Luiz Fux e
Gilmar Mendes, af‌irmou a tese vencedora, no sentido da “inexistência no ordenamento
jurídico brasileiro de um direito genérico com essa conformação, seja expressa ou im-
plicitamente”, de modo que “o que existe são expressas e pontuais previsões em que se
admite, sob condições específ‌icas, o decurso do tempo como razão para a supressão de
dados ou informações”, como seria o caso das normas do artigo 43, parágrafo primeiro ,
68. LIMA, Cíntia Rosa Pereira de; MARTINS, Guilherme Magalhães. A f‌igura caleidoscópica do direito ao esquecimento
e a (in)utilidade de um tema em repercussão geral. Migalhas. São Paulo, 29 set. 2020. Acesso em: 17 fev. 2021.
Disponível em:
copica-do-direito-ao-esquecimento-e-a--in-utilidade-de-um-tema-em-repercussao-geral>.
EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 91EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 91 31/03/2021 16:10:0131/03/2021 16:10:01
GUILHERME MAGALHÃES MARTINS
92
e do artigo 7º , X do Marco Civil da Internet(Lei 12.965/14).
No entanto, na parte inicial do voto, o relator deixa claro que tal decisão, embora
abranja tanto a mídia tradicional quanto a Internet, ambas em conjunto, sem prejuízo
das especif‌icidades de cada linha do tema, certamente para evitar um tratamento frag-
mentado, não envolve os pedidos de desindexação, que, consoante a fundamentação,
não se confunde com o direito ao esquecimento. Portanto, hipóteses como a do famoso
caso Google Spain, julgado pelo Tribunal de Justiça da União Europeia em 2014, não
serão abrangidas, no Brasil, pela Tese 786.
Desindexar é marcar o URL (Uniform Resource Locator, o endereço de uma página
na web), para que ele não conste dos resultados de busca de buscadores normais. Isso
signif‌ica que quando o usuário digita o conteúdo buscado em um campo de busca, ainda
que o conteúdo esteja público, não será mostrado na lista dos resultados. Ao desinde-
xar o conteúdo de um mecanismo de busca normal, considerando que o acesso a novo
conteúdo pela Internet costuma ser intermediado pelos mecanismos de busca, diminui
signif‌icativamente o potencial de disseminação desse conteúdo, diminuindo o eventual
dano que a sua disseminação possa causar ao envolvido. 69
A Tese 786, portanto, não abrange as hipóteses de desindexação, que poderão ser
objeto de ponderação sem prevalência apriorística das liberdades comunicativas no caso
concreto. Tecnicamente, acertou o Supremo Tribunal Federal ao distinguir o esqueci-
mento, em sentido amplo, da desindexação.
Prevaleceram, de maneira preferencial, na visão majoritária do Supremo Tribunal Fe-
deral, os direitos à memória e à liberdade de informação e de expressão, tendo sido invocado
ainda no voto do relator o artigo 4º. II, a da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais, em
cujos termos não se aplica o tratamento de dados àquilo realizado para f‌ins exclusivamente
jornalísticos e artísticos. A liberdade é a regra, e as exceções devem ser expressas.
A tese espelha em grande parte a visão do professor Daniel Sarmento, para quem a
imposição do esquecimento tem sido um instrumento de manipulação da memória cole-
tiva de que se valem os regimes totalitários em favor de seus projetos de poder, em face da
cultura censória que, nas palavras do autor, viceja no Poder Judiciário, sendo “evidentes
os riscos de autoritarismo envolvidos na atribuição a agentes estatais – ainda que juízes
– do poder de def‌inirem o que pode e o que não pode ser lembrado pela sociedade”. 70
A posição preferencial das liberdades, originária da jurisprudência constitucional
norte-americana, prevaleceu na orientação da Tese 786, sendo que, conforme a visão
vencedora, a tutela dos direitos da personalidade deverá ocorrer a posteriori, através
do direito de resposta e da responsabilidade civil dos que exerceram abusivamente sua
expressão livre.
69. VIOLA, Mario; DONEDA, Danilo; CÓRDOVA, Yasodara; ITAGIBA, Gabriel. Entre privacidade e liberdade de
informação e expressão: existe um direito ao esquecimento no Brasil? In: TEPEDINO, Gustavo; TEIXEIRA, Ana
Carolina Brochado; ALMEIDA, Vitor. O Direito Civil entre o sujeito e a pessoa: estudos em homenagem ao professor
Stefano Rodotà. Belo Horizonte: Fórum, 2016. p. 366.
70. SARMENTO, Daniel. Liberdades comunicativas e “Direito ao esquecimento” na ordem constitucional brasileira.
Revista Brasileira de Direito Civil. Rio de Janeiro, v. 7, jan./mar.2016, p.192-193.
EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 92EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 92 31/03/2021 16:10:0131/03/2021 16:10:01
93
O DIREITO AO ESQUECIMENTO NA INTERNET
5. CONCLUSÃO
Por um lado, o direito ao esquecimento não possibilita aos indivíduos a reconstrução
da identidade na Internet, sob pena de se criar um revisionismo histórico ou a perda da
memória.71 Segundo uma célebre frase de Mário Quintana, “o passado não conhece seu
lugar; está sempre presente”.
Em qualquer caso, deve haver uma ponderação de interesses entre o direito ao es-
quecimento e a liberdade de imprensa, somente podendo ocorrer o seu reconhecimento
caso se trate de ofensa suf‌icientemente grave à pessoa humana, de modo a restringir a
disseminação de determinada informação. Trata-se, é verdade, de um direito excepcio-
nal, reconhecido em outros ordenamentos, mas que não pode ser banalizado, sobretudo
quando houver interesse público, histórico ou jornalístico, caso em que prevalecerão as
liberdades de informação e de expressão.
Mas a principal consequência do exercício do direito ao esquecimento, tendo em
vista o princípio da precaução, deve ser a imposição de obrigações de fazer e não fazer,
consagrando o “direito de não ser vítima de danos”, tendo em vista, após a ponderação
dos interesses envolvidos, a retirada do material ofensivo. A reparação de danos somente
ocorrerá excepcionalmente, caso se trate de ofensa consumada a situação jurídica exis-
tencial, não passível de remédio por meio da execução específ‌ica. 72
No entanto, a Tese aprovada no Tema 786 do Supremo Tribunal Federal certamente
trará novos contornos à matéria, por considerar que o direito ao esquecimento não possui
amparo constitucional, devendo eventuais violações, em casos concretos, ser analisadas
à luz da proteção da honra, da imagem, da privacidade e da personalidade em geral.
A Tese 786 vinculará todo o Judiciário brasileiro, embora, como visto, o artigo
926, parágrafo segundo do Código de Processo Civil, do ponto de vista da adequação
aos casos concretos que venham a surgir, poderá vir a modular sua efetividade, de modo
que o precedente não nasce precedente, mas se tornará precedente ao longo do tempo,
e sua vinculação se dará pela ratio decidendi.73 Que o futuro venha acompanhado de um
verdadeiro e real progresso, do ponto de vista da efetividade dos direitos fundamentais.
REFERÊNCIAS
AMBROSE, Meg Leta; AUSLOOS, Jef. The right to be forgotten across the pond. Journal of Information
Policy, v. 3, p. 1-23, 2013. Disponível em:
id=2032325##>. Acesso em: 15 jan. 2020.
ASCENSÃO, José de Oliveira. Direito da Internet e da sociedade da informação. Rio de Janeiro: Forense, 2001.
BARBOSA, Fernanda Nunes. Internet e consumo: o paradigma da solidariedade e seus ref‌lexos na respon-
sabilidade do provedor de pesquisa. RT, São Paulo: Revista dos Tribunais, v. 924, p. 535-561, out. 2012.
71. COSTA, André Brandão Nery. Op. cit. p. 205-206.
72. Nesse sentido, o Enunciado 576 do Conselho da Justiça Federal, aprovado na VI Jornada de Direito Civil: “O
direito ao esquecimento pode ser assegurado por tutela judicial inibitória”.
73. FROTA, Pablo Malheiros da Cunha. Precedente vinculativo e persuasivo e a ratio decidendi. Consultor Jurídico.
São Paulo, 13 fev. 2021, p.04. Acessível em: .conjur.com.br/2021-fev-13/diario-classe-precedente-
-vinculativo-persuasivo-ratio-decidendi>. Acesso em: 17 fev. 2021.
EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 93EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 93 31/03/2021 16:10:0131/03/2021 16:10:01
GUILHERME MAGALHÃES MARTINS
94
BAUMAN, Zygmunt. Vida para o consumo: a transformação das pessoas em mercadoria. Tradução de
Carlos Alberto Medeiros. Rio de Janeiro: Zahar, 2008.
BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Tradução de Carlos Nelson Coutinho. São Paulo: Campus, 1992.
BOTELHO, Catarina Santos. “Novo ou velho direito”, O Direito ao esquecimento e o princípio da pro-
porcionalidade no constitucionalismo global. Ab Instantia. v. 7, 2017.
BRANCO, Sergio. Memória e esquecimento na Internet. Porto Alegre: Arquipélago, 2017.
BUCAR, Daniel. Controle temporal de dados: o direito ao esquecimento. Civilística, Revista Eletrônica
de Direito Civil, ano 2, n. 3, 2003. Disponível em: .civilistica.com>. Acesso em: 15 jan. 2020.
CANOTILHO, José Joaquim Gomes; MACHADO, Jónatas E. M.; GAIO JÚNIOR, Antônio Pereira. Bio-
graf‌ia não autorizada versus liberdade de expressão. 3. ed. Curitiba: Juruá, 2017.
CASTELLS, Manuel. A sociedade em rede. Tradução de Roneide Venancio Meyer. São Paulo: Paz e Terra,
2010.
CORDEIRO, A. Barreto Menezes. Direito da Proteção de Dados: À Luz do RGPD e da Lei 58/2019.
Coimbra: Almedina 2016
COSTA, André Brandão Nery. Direito ao esquecimento na Internet: a scarlet letter digital. In: SCHREIBER,
Anderson (Coord.). Direito e mídia. São Paulo: Atlas, 2013.
DONEDA, Danilo. Considerações iniciais sobre os bancos de dados informatizados e o direito à priva-
cidade. In: TEPEDINO, Gustavo (Coord.). Problemas de direito civil-constitucional. Rio de Janeiro:
Renovar, 2000.
DONEDA, Danilo. Da privacidade à proteção dos dados pessoais. Rio de Janeiro: Renovar, 2006.
FLEISCHER, Peter. Foggy thinking about the right to oblivion. Disponível em:
blogspot.com.br/2011/03/foggy-thinking-about-right-to-oblivion.html>. Acesso em: 15 jan. 2020.
FROTA, Pablo Malheiros da Cunha. Precedente vinculativo e persuasivo e a ratio decidendi. Consultor
Jurídico. São Paulo, 13 fev. 2021, p.04. Acessível em: https://www.conjur.com.br/2021-fev-13/dia-
rio-classe-precedente-vinculativo-persuasivo-ratio-decidendi. Acesso em: 17.02.2021.
HEYLLIARD, Charlotte. Le droit à l´oubli sur l´Internet. Disponível em: .lepetitjuriste.fr/
wp-content/uploads/2013/01/MEMOIRE-Charlotte-Heylliard2.pdf.>. Acesso em: 15 jan. 2020.
KOOPS, Bert-Jaap. Forgetting footprints, shunning shadows. A critical analysis of the “Right to be For-
gotten” in Big Data practice. 8:3 SCRIPTed 229(2011) http://scripted.org/?p=43. In:
ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=1986719>. Acesso em: 08 jun. 2020.
LA AEPD abre un procedimiento sancionador a Google por su política de privacidad. Disponível em:
evista_prensa/revista_prensa/2013/notas_prensa/common/
junio/130620_NP_PS_GOOGLE.pdf>. Acesso em: 15 jan. 2020.
LAGONE, Laura. The right to be forgotten: a comparative analysis. Disponível em:
abstract=2229361>. Acesso em: 15 jan. 2020.
LEONARDI, Marcel. Responsabilidade civil pela violação do sigilo e privacidade na Internet. In: SILVA,
Regina Beatriz Tavares da; SANTOS, Manoel J. Pereira dos (Coord.). Responsabilidade civil na Internet
e nos demais meios de comunicação. São Paulo: Saraiva, 2007.
LÉVY, Pierre. A inteligência coletiva. Tradução de Luiz Paulo Rouanet. São Paulo: Loyola, 2007.
LIMA, Cíntia Rosa Pereira de; MARTINS, Guilherme Magalhães. A f‌igura caleidoscópica do direito ao
esquecimento e a (in)utilidade de um tema em repercussão geral. Migalhas. São Paulo, 29 set. 2020.
Acesso em: 17.02.2021. Disponível em:
EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 94EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 94 31/03/2021 16:10:0231/03/2021 16:10:02
95
O DIREITO AO ESQUECIMENTO NA INTERNET
cao-de-dados/334044/a-f‌igura-caleidoscopica-do-direito-ao-esquecimento-e-a--in-utilidade-de-
-um-tema-em-repercussao-geral>.
LÓPEZ, Marina Sancho. Derecho al olvido y Big Data dos realidades convergentes. Valencia: Tirant lo
Blanch, 2020 (e-book).
MARTINS, Guilherme Magalhães. Responsabilidade civil por acidente de consumo na Internet. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2008.
MARTINS, Guilherme Magalhães. Risco, solidariedade e responsabilidade civil. In: MARTINS, Guilherme
Magalhães. (Coord.). Temas de responsabilidade civil. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2012.
MARTINS, Guilherme Magalhães; LONGHI, João Victor Rozatti. A tutela do consumidor nas redes sociais
virtuais: responsabilidade civil por acidentes de consumo na sociedade da informação. Revista de
Direito do Consumidor, São Paulo, v. 78, abr./jun. 2011.
MARTINS, Guilherme Magalhães; GUIMARÃES, João Alexandre. Direito ao esquecimento no STF: a
dignidade da pessoa humana em risco. Consultor Jurídico. São Paulo, 10 de feveriro de 2021, p.03.
Disponível em: .com.br/2021-fev-10/martins-guimaraes-direito-esquecimen-
to-stf?imprimir=1>. Acesso em: 12.02.2021.
MAYER-SCHÖNBERGER, Viktor. Delete: the virtue of forgetting in the digital age. New Jersey: Princeton
University Press, 2009.
MENDES, Laura Schertel. Decisão histórica do STF reconhece direito fundamental à proteção de dados
pessoais. Jota. Disponível em: ect_to=//www.jota.info/opi-
niao-e-analise/artigos/decisao-historica-do-stf-reconhece-direito-fundamental-a-protecao-de-da-
dos-pessoais-10052020>. Acesso em: 11.02.2021.
MORAES, Maria Celina Bodin. Danos à pessoa humana: uma leitura civil-constitucional dos danos morais.
Rio de Janeiro: Renovar, 2003.
MORAES, Maria Celina Bodin; KONDER, Carlos Nelson. Dilemas de direito civil-constitucional. Rio de
Janeiro: Renovar, 2012.
OST, François. O tempo do direito. Tradução de Élcio Fernandes. Bauru: EDUSC, 2005.
PARISIER, Eli. O f‌iltro invisível: o que a Internet está escondendo de você. Tradução de Diego Alfaro. Rio
de Janeiro: Jorge Zahar, 2012.
PROPOSTA de Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo à proteção das pessoas
singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais e à livre circulação desses dados (re-
gulamento geral sobre a proteção de dados). Disponível em:
LexUriServ.do?uri=COM:2012:0011:FIN:PT:PDF>. Acesso em: 15 jan. 2020.
REDING, Vivian. Speech/12/26, The EU Data Protection Reform 2012: Making Europe the Standard
Setter For Modern Data Protection Rules in the Digital Age (speech before Innovation Conference
Digital, Life, Design, Munich, jan 22 2012). Disponível em: -
se_SPEECH-12-26_en.htm>.
RODOTÀ, Stefano. Tecnologie e diritti. Bologna: Il Mulino, 1995.
RODOTÀ, Stefano. Dai ricordi ai dati l’oblio è un diritto? La Repubblica.it. Disponível em:
repubblica.it/repubblica/2012/01/30/dai-ricordi-ai-dati-oblio>. Acesso em: 15 jan. 2020.
RODOTÀ, Stefano. A vida na sociedade da vigilância. Organização de Maria Celina Bodin de Moraes.
Tradução de Danilo Doneda e Luciana Cabral Doneda. Rio de Janeiro: Renovar, 2008.
ROSEN, Jeffrey. Symposium issue: the right to be forgotten. Stanford Law Review Online, v. 64, p. 88-92,
fev. 2012.
EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 95EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 95 31/03/2021 16:10:0231/03/2021 16:10:02
GUILHERME MAGALHÃES MARTINS
96
ROUTIER, Richard. Traçabilité ou anonymat des conexions? In: PEDROT, Philippe (Org.). Traçabilité
et responsabilité. Paris: Economica, 2003.
SARLET, Ingo Wolfgang; FERREIRA NETO, Arthur. O direito ao “esquecimento” na sociedade da infor-
mação. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2019.
SARMENTO, Daniel. Liberdades comunicativas e “Direito ao esquecimento” na ordem constitucional
brasileira. Revista Brasileira de Direito Civil. Rio de Janeiro, v. 7, jan./mar.2016.
SCHREIBER, Anderson. Direitos da personalidade. São Paulo: Atlas, 2011.
SERRALBO, Javier Aranda. Right to oblivion; a way to get to know ourselves and share the knowledge.
London, 2012 (e-book).
SILVA, Roberto Baptista Dias da; PASSOS, Ana Beatriz Guimarães. Entre lembrança e olvido: uma análise
das decisões do STJ sobre direito ao esquecimento. Revista Jurídica da Presidência. Brasília, v. 16, n.
109, jun./set. 2014.
VARNER, Eric R. Mutilation and transformation: damnation memoriae and Roman imperial portraiture.
Brill Leiden: Boston, 2004.
VIOLA, Mario; DONEDA, Danilo; CÓRDOVA, Yasodara; ITAGIBA, Gabriel. Entre privacidade e liberdade
de informação e expressão: existe um direito ao esquecimento no Brasil? In: TEPEDINO, Gustavo;
TEIXEIRA, Ana Carolina Brochado; ALMEIDA, Vitor. O Direito Civil entre o sujeito e a pessoa: estudos
em homenagem ao professor Stefano Rodotà. Belo Horizonte: Fórum, 2016.
EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 96EBOOK DIREITO DIGITAL 4ED.indb 96 31/03/2021 16:10:0231/03/2021 16:10:02

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT