Espécies de penas restritivas previstas no código penal

AutorJamil Chaim Alves
Ocupação do AutorDoutor e Mestre em Direito Penal pela PUC-SP
Páginas151-244
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ESPÉCIES DE PENAS
RESTRITIVAS PREVISTAS
5.1 PRESTAÇÃO DE SERVIÇO À COMUNIDADE OU A
ENTIDADES PÚBLICAS
5.1.1 Definição e regras gerais
A prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas é
considerada a mais importante sanção alternativa, apresentando gran-
des vantagens à sociedade e também ao condenado. É uma forma
ecaz de se conseguir a ressocialização do infrator, cumprindo-se a
nalidade preventiva especial positiva da pena. O trabalho, além de
elevar a autoestima, aspecto de inexcedível importância para recu-
peração do condenado, dá a este a oportunidade de compensar o mal
causado pelo crime fazendo algo benéco à comunidade.
Na observação de Claus Roxin, os serviços à comunidade, por se-
rem um trabalho construtivo e exigir um engajamento maior do con-
denado, são mais vantajosos que privação da liberdade e a multa, as
quais o autor apenas suporta passivamente1.
Outrossim, através da prestação de serviços à comunidade, o con-
denado passa a se sentir necessário às outras pessoas e convive, nas
entidades para as quais trabalha, com seres devotados ao próximo.
1 Dogmática penal y política criminal. p. 457.
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penas alternativasteoria e prática
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Por meio do convívio com pessoas que se doam a outras, as quais pre-
cisam de auxílio, permite-se a ocorrência de lenta impregnação de seus
valores e a transformação progressiva dos horizontes do apenado2.
A imposição de serviços comunitários é forma de punição humana
e produtiva, trazendo diversos benefícios à sociedade. Grupos, orga-
nizações ou indivíduos necessitados, que utilizem os serviços presta-
dos pelo infrator, são beneciados com a gratuidade do trabalho. E a
comunidade tem a possibilidade de se envolver no sistema de justiça
criminal e ajudar na reintegração do delinquente. Como pena, sus-
tenta Antonio Carlos da Ponte, a prestação de serviços à comunidade
“é reeducativa, visto que baseia-se na terapia laboral; é retributiva, já
que é exercida através do trabalho gratuito junto a comunidade lesada
pelo crime; e é intimidativa, na medida em que a punição mostra-se
certa e palpável a todos”3.
No direito pátrio, a prestação de serviços à comunidade encontra
previsão na Constituição Federal, no art. 5º, XLVI, d, que prevê a
pena de prestação social alternativa. Sobre esta disposição, leciona
Sérgio Salomão Shecaira: “A grande vantagem de sua enunciação
constitucional – com a proibição dos trabalhos forçados no inciso
subsequente – foi a de ter eliminado qualquer duvida sobre a cons-
titucionalidade do trabalho à comunidade. Dada sua gratuidade, que
é parte de sua substancia, poder-se-ia armar ser ele um ‘trabalho
forçado’. No entanto, este é vedado, enquanto o trabalho comunitá-
rio é consagrado”4.
Quanto à natureza jurídica da prestação de serviços comunitá-
rios, muitos entendem não se tratar de uma pena restritiva de direitos.
Alberto Silva Franco e Rui Stoco armam tratar-se, em essência, de
uma pena privativa de liberdade mitigada, realizada de forma des-
contínua no aspecto temporal. Nesse sentido, sustentam: “As penas
de prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas e de
limitação de m de semana, mais do que penas restritivas de direitos,
2 Dotti. Bases alternativas para o sistema de penas. p. 373.
3 Prestação de serviços à comunidade – análise crítica e conclusiva do art. 46 do
CP. Revista dos Tribunais. ano 84, v. 718, p. 337-341.
4 Prestação de serviços à comunidade: alternativa à pena privativa de liberdade.
p. 45.
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são penas que, de algum modo, limitam o direito de liberdade do
condenado, sem submetê-lo à prisão. No caso da prestação de servi-
ços à comunidade ou a entidades públicas, é ele obrigado a prestar
pessoalmente, durante certo número de horas semanais que se prolon-
gam por tempo predeterminado, tarefas gratuitas junto a determinadas
entidades, públicas ou particulares. Ao fazê-lo, é evidente que não
dispõe mais do tempo livre correspondente a essas horas semanais já
que, sob acompanhamento, vê-se na contingência, nesse espaço tem-
poral, de realizar, sem remuneração, algum tipo de trabalho”5.
Em sentido contrário, entende David Teixeira de Azevedo tratar-
se de autêntica restrição a direitos, discordando da corrente que
vê nela uma expressão da pena privativa de liberdade. Sustenta o
autor: “Na pena de privação, o direito de liberdade do agente en-
contra-se a princípio completamente tolhido, condição que se vai
atenuando, ou privação que se vai paulatinamente diminuindo à
medida do cumprimento da reprimenda e da sucessão dos estágios
dos regimes. (...) Já na pena restritiva de direitos, na modalidade
de prestação de serviços à comunidade ou limitação de m de se-
mana, a liberdade como direito de ir, vir e car do agente continua
com plena expressão, liberdade que não é suprimida, autodetermi-
nação espacial que permanece plena e íntegra. Ocorre aqui outro
fenômeno. A liberdade é em certa medida restringida, não priva-
da; o espectro de ação é reduzido, mas não supresso. Isto é com-
pletamente diferente da progressão de regime em que se transita
de um espaço de privação para um espaço de gozo de liberdade.
Na restritiva caminha-se de um espaço de gozo de liberdade para
um espaço de pontual privação”6. Filiamo-nos a este entendimen-
to, também adotado por Shecaira7.
No Código Penal, estabelece o art. 46, § 1º, que “a prestação de
serviços à comunidade ou a entidades públicas consiste na atribuição
de tarefas gratuitas ao condenado”. E, como preceitua o § 2º.,
5 Código Penal e sua interpretação: doutrina e jurisprudência. p. 285.
6 Atualidades no direito e processo penal. p. 170.
7 Prestação de serviços à comunidade: alternativa à pena privativa de liberdade.
p. 45.
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