Penas restritivas de direitos

AutorJamil Chaim Alves
Ocupação do AutorDoutor e Mestre em Direito Penal pela PUC-SP
Páginas51-149
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PENAS RESTRITIVAS
DE DIREITOS
4.1 CONCEITO E NATUREZA JURÍDICA
As penas restritivas de direitos podem ser denidas como sanções,
devidamente previstas em lei, impostas pelo Estado ao autor de in-
fração penal, consistentes na limitação ao exercício de determinados
direitos e geralmente aplicadas em substituição às penas privativas de
liberdade, possibilitando a ressocialização do condenado.
Uma das grandes vantagens das penas restritivas de direitos é a
possibilidade de o condenado permanecer na comunidade, realizando
suas atividades laborativas regulares1. Segundo Alberto Silva Franco
e Rui Stoco, “o que se visa atingir é a posição que o agente desfruta na
comunidade, não a constrição, direta e imediata, de sua liberdade de
ir e vir”2. Nesse sentido, aduz Sérgio Salomão Shecaira que “as penas
restritivas de direitos molestam o exercício do direito de liberdade,
sem, contudo, retirar o homem do convívio social. Eis aí a diferença
da pena prisional”3.
Além desses benefícios, pode-se apontar também que, com a apli-
cação mais efetiva da restrição de direitos, o Estado não tem de supor-
tar o elevado custo da criação e manutenção de presídios, bem como
da permanência dos condenados no sistema carcerário. Ademais,
1 Fragoso. Alternativas da pena privativa de liberdade. Revista de direito penal, n.
29, p. 5-17.
2 Código penal e sua interpretação: doutrina e jurisprudência. p. 285.
3 Prestação de serviços à comunidade: alternativa à pena privativa de liberdade.
p. 45.
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penas alternativasteoria e prática
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a diminuição do número de detentos por cela, tornando as prisões me-
nos superlotadas, é benéca também para os reclusos, caracterizando
um importante passo para sua ressocialização. Arma José Antonio
Paganella Boschi que as penas restritivas de direitos, assim, podem
ser uma saída ao agonizante e caótico sistema penitenciário de todo o
mundo, embora se saiba que elas isoladamente não asseguram a solu-
ção de todos os problemas4.
As penas restritivas de direitos são tratadas na Seção II do Título
V da Parte Geral do Código Penal, havendo também regras especí-
cas na legislação especial.
No Código Penal, sob a rubrica “penas restritivas de direitos”, são
previstas, no art. 43, cinco modalidades: prestação pecuniária, perda de
bens e valores, prestação de serviços à comunidade ou a entidades pú-
blicas, interdição temporária de direitos e limitação de m de semana.
Vários autores criticam esta nomenclatura, entendendo que nem
todas essas espécies constituem verdadeiras restrições a direitos.
Somente a interdição temporária de direitos (arts. 43, V e 47, do Có-
digo Penal) se enquadraria, de fato, nessa categoria. O mesmo não se
poderia dizer da prestação de serviços à comunidade e da limitação
de m de semana, que atingem o status libertatis do condenado, cer-
ceando, ainda por período parcial, seu direito de ir e vir. Também não
envolveriam restrição de direitos a prestação pecuniária e a perda de
bens e valores, sanções de natureza pecuniária que implicam perda
de um direito. Assim, na opinião de Damásio de Jesus, melhor seria
que se tivesse atribuído a essas sanções o nomen iuris “penas alter-
nativas”5. Conforme Boschi, se já era possível, em 1984, contundente
crítica ao legislador por ter alinhado à pena de interdição de direitos
(que é uma pena restritiva de direitos por excelência) duas outras es-
pécies (a prestação de serviços à comunidade e a de limitação de m
de semana) que, rigorosamente, de penas restritivas de direitos não se
tratam, porque atingem, embora com menor intensidade que as penas
privativas, o status libertatis do condenado, essa crítica pode e deve
ser renovada e ampliada em face da inclusão, pela Lei 9.714/1998, de
4 Das penas e seus critérios de aplicação. p. 309.
5 Código penal anotado. p. 174.
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duas outras penas (prestação pecuniária e perda de bens e valores –
incs. I e II do art. 43) que também não restringem direitos, pois o que
fazem é provocar a perda deles. E pontua: “Não fosse a declaração da
lei de que a prestação pecuniária e a perda de bens e valores consti-
tuem modalidades de penas restritivas de direito ninguém, por certo,
daria ouvidos a quem zesse armação nesse sentido!”6.
Diante disso, pondera Bitencourt, teria sido mais feliz a classica-
ção geral das penas em privativas de liberdade (reclusão e detenção),
restritivas de liberdade (prisão domiciliar, limitação de m de semana
e prestação de serviços à comunidade), restritivas de direitos (com-
preendendo somente as efetivas interdições ou proibições) e pecuniá-
rias (multa, prestações pecuniárias e perda de bens e valores)7.
Quanto à natureza jurídica, as penas restritivas de direitos são
substitutivas e autônomas (art. 44 do Código Penal). Tais conceitos
podem, em princípio, parecer contraditórios. Como apontam Franco
e Stoco, “a ideia de autonomia, de independência, não parece acomo-
dar-se à de substituição, que faz pressupor a existência de uma pena
que é posta, em lugar de outra anteriormente existente, e, portanto,
põe em destaque uma relação de dependência entre essas penas”8.
Contudo, as expressões são perfeitamente conciliáveis.
São substitutivas porque, como o nome já diz, substituem a pena
privativa de liberdade. O juiz, na sentença condenatória, xa a pena
de prisão e, presentes os requisitos legais, procede à sua permuta pela
restritiva de direitos.
Atualmente, todavia, a ideia de que as penas restritivas de direi-
tos são substitutivas não é absoluta, havendo na legislação brasileira
– cada vez com mais frequência – hipóteses em que tais penas são
cominadas diretamente.
Exceção à substitutividade pode ser encontrada no Código de
Defesa do Consumidor, que prevê a possibilidade de cumulação de
pena restritiva de direitos e privativa de liberdade (art. 78).
6 Das penas e seus critérios de aplicação. p. 309.
7 Penas alternativas: análise político-criminal das alterações da Lei n. 9714/98.
p. 94.
8 Código penal e sua interpretação: doutrina e jurisprudência. p. 287.
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