Irretratabilidade e inexecução das promessas de compra e venda: notas sobre a Lei 13.786/2018 (Lei dos Distratos Imobiliários)

AutorRoberta Mauro Medina Maia
Ocupação do AutorMestre e Doutora em Direito Civil pela UERJ. Professora dos cursos de Graduação e Pos-Graduação da PUC-Rio
Páginas545-573
Irretratabilidade e inexecução das promessas de
compra e venda: notas sobre a Lei 13.786/2018
(Lei dos Distratos Imobiliários)
Roberta Mauro Medina Maia1
O Brasil não é para principiantes.
Tom Jobim
Sumário: Introdução; – 1. A irretratabilidade como
característica essencial do tipo contratual descrito pelo
Dec.-Lei 58/37 e pelo art. 1.417 do CC2002; – 2. A
irretratabilidade posta à prova: a jurisprudência do STJ e a crise
no setor imobiliário; – 3. A irretratabilidade das promessas de
compra e venda diante das hipóteses de distrato e resolução
previstas na Lei 13.786/2018 (Lei dos Distratos Imobiliários);
– 4. Resolução por onerosidade excessiva e promessas de
compra e venda; – 5. Conclusão.
Introdução
Poucas figuras contratuais são tão utilizadas no país quanto a
promessa de compra e venda, cujo regramento foi primeiro deta-
lhado pelo Dec.-Lei 58/37. Naquela época, a principal preocupa-
ção legislativa era assegurar ao promitente comprador o direito à
adjudicação compulsória do imóvel quando a promessa de compra
e venda fosse irretratável, permitindo, assim, a execução específica
do contrato mesmo quando o promitente vendedor se recusasse a
lhe outorgar a escritura definitiva de compra e venda.
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1 Mestre e Doutora em Direito Civil pela UERJ. Professora dos cursos de
Graduação e Pos-Graduação da PUC-Rio.
Era a irretratabilidade do negócio, portanto, a justificativa para
que esta nova manifestação volitiva por parte do promitente ven-
dedor fosse suprida pelo Poder Judiciário, garantindo-se, desse
modo, a transferência do direito de propriedade ao promitente
comprador. Tal providência fez-se necessária porque, quando do
advento do referido Decreto-Lei, era comum que, em virtude da
valorização do metro quadrado dos imóveis prometidos à venda, os
promitentes vendedores desistissem do negócio preliminar, arcan-
do com as perdas e danos, no intuito de alienar o mesmo imóvel por
quantia mais elevada que a originalmente obtida.
Com a crise econômica que assolou o país a partir de 2014, a
irretratabilidade foi posta à prova em razão do polo oposto: com a
depreciação do metro quadrado após a celebração das promessas
de compra e venda, diversos adquirentes de unidades autônomas
fruto de incorporação imobiliária pleitearam o desfazimento do ne-
gócio não por força da ausência de condições de adimpli-lo, mas
sim por não julgá-lo mais conveniente.
O presente artigo destina-se, por isso, a avaliar se a irretratabi-
lidade é amarra tão apertada quanto propõe a lei ou tão frouxa
quanto parecem sugerir algumas decisões judiciais. Para tanto, o
próximo tópico destina-se a expor esta característica atribuída pelo
legislador às promessas de compra e venda como traço típico indis-
pensável à sua qualificação. Posteriormente, será melhor exposta a
aplicação – por vezes equivocada – de conceitos básicos da teoria
geral dos contratos às promessas de compra e venda pelos Tribu-
nais, sendo esta a causa principal do advento da Lei dos Distratos
Imobiliários (Lei 13.786/2018).
Feitas estas considerações preliminares, será então possível ave-
riguar se a nova legislação flexibilizou de algum modo a irretratabili-
dade do referido contrato, ampliando as hipóteses de desfazimento
do ajuste preliminar. Por fim, o último tópico será destinado à avalia-
ção da possibilidade de se enquadrar os casos de oscilação do metro
quadrado de imóveis no conceito de onerosidade excessiva.
1. A irretratabilidade como característica essencial do tipo contra-
tual descrito pelo Dec.-Lei 58/37 e pelo art. 1.417 do CC2002
Definido por Darcy Bessone como o contrato por meio do qual
as partes se comprometem a celebrar, mais tarde, o contrato de
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