Natureza Jurídica do Processo

AutorManoel Antonio Teixeira Filho
Páginas182-186

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Na sequência dos séculos, inúmeras teorias foram elaboradas com a finalidade de definir (e justificar) a natureza jurídica do processo; podemos indicar, como as mais expressivas, as que identificavam o processo como: 1. um contrato; 2. um quase-contrato;
3. uma relação jurídica; 4. uma situação jurídica.

1. Um contrato

A teoria do processo como contrato foi amplamente difundida nos séculos XVIII e XIX, máxime em França, embora ela fosse, na verdade, produto da concepção romanística do processo, que era visto como um contrato por força do qual os litigantes se obrigavam, em presença do pretor, a acatar a decisão que fosse proferida pelo árbitro. Os romanos tinham, pois, uma visão essencialmente privatista do processo. A esse contrato firmado pelas partes denominavam litis contestatio.

A razão de essa doutrina de raízes romanas haver-se propagado na França parece ser de foro sociopolítico, pois aí se encontrava acesa a ideia de Rousseau, lançada em seu Contrato Social, de que os cidadãos, ao se sujeitarem às condições por eles mesmos avençadas, não estavam obrigados a obedecer a quem quer que fosse se não que apenas à própria vontade concertada. Daí o processo ser concebido, pela doutrina francesa do período, como um contrato, no qual não se permitia qualquer interveniência do Estado.

2. Um quase-contrato

Atribui-se a Arnault Guényvau, jurista francês que viveu no século XIX, a elaboração da teoria do processo como quase-contrato.

Segundo ele, se o processo não poderia ser considerado um contrato, um negócio jurídico bilateral de direito privado, nem se tratava de um delito, só poderia ser, por exclusão daquelas categorias, um quase-contrato.

3. Uma relação jurídica

A teoria do processo como relação jurídica já se encontrava embrionariamente localizada em certos textos antigos do direito comum italiano, em que se afirmava que o processo era integrado por três sujeitos: juiz, autor e réu (iudicium est actum trium personarum: iudicis, actoris et rei).

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A teoria em tela, entretanto, adquire maturidade científica em livro publicado por Bülow, no ano de 1868, sob o título de Teoria das Exceções Dilatórias e dos Pressupostos Processuais. Bülow — esclareça-se — não criou a teoria do processo como uma relação jurídica entre o juiz, o autor e o réu, tendo, sim, com notável talento, sistematizado cientificamente essa relação triangular, chegando mesmo a demonstrar que essa relação se estabelece em dois níveis: material, representado pela res in iudicio deducta, e processual, esta como continente de que aquela é conteúdo.

Bülow também sustentou que a relação jurídica processual é distinta da material: a) pelos seus sujeitos (autor, réu e juiz); b) pelo seu objeto (a prestação jurisdicional); c) pelos seus pressupostos (os pressupostos processuais).

4. Uma situação jurídica

Discordando da doutrina de Bülow, Goldschmidt edificou a teoria do processo como situação jurídica.

Goldschmidt comparou o processo à guerra, em que o vencedor usufrui de situações vantajosas em decorrência exclusivamente da vitória obtida, não se indagando se ele possuía, ou não, um direito anterior. Sublinha, em razão disso, que quando o direito assume uma atitude dinâmica, por intermédio do processo, verifica-se uma transformação estrutural, de tal maneira que o que era tido, de um ângulo estático, como um direito subjetivo, converte-se agora em simples possibilidades (voltadas à realização de atos necessários ao reconhecimento do direito), expectativas (tendentes ao reconhecimento...

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