O romance ubirajara e a atribuição de identidade aos indígenas

AutorDaize Fernanda Wagner/Edielson de Souza Silva
Ocupação do AutorProfessora no curso de Direito e no Programa de Pós-Graduação em Estudos de Fronteira da Universidade Federal do Amapá (UNIFAP)/Professor da Universidade Estadual do Amapá (UEAP)
Páginas6-26
6 • Sociedade, Direito & Justiça - Volume 7
O ROMANCE UBIRA JARA E A ATRIBUIÇÃO
DE IDENTIDADE AOS INDÍGENAS1
Daize Fernanda Wagner 2
Edielson de Souza Silva3
Resumo: A Literatura possibilita o pensar e o repensar o Direito, fo-
mentando sua discussão crítica. Nessa direção aponta o Movimento
Direito e Literatura. Por um lado, a Literatura tem a capacidade de
traduzir o espírito e os valores de uma época e, por outro, o Direito
é reexo dela. A trilogia indianista de José de Alencar remete a uma
percepção idealizada dos indígenas, muito característica do roman-
tismo nacionalista do século XIX. A partir da obra Ubirajara, publi-
cada em 1874, pretende-se problematizar a atribuição de identidade
aos indígenas pelos não-índios. Pretende-se também discutir como
tal atribuição repercute ainda hoje no (não) reconhecimento e efe-
tividade do direito à diferença, que foi consagrado aos indígenas na
trabalho se insere na vertente jurídico-sociológica. É pesquisa teó-
rica, que analisa conteúdos de textos legislativos, jurisprudenciais e
doutrinários sobre o tema.
Palavras-chave: Direito e Literatura. Ubirajara. Identidade étnica.
Reconhecimento. Indígenas.
O presente texto foi apresentado, numa primeira versão, no Grupo de
Trabalho O Direito através da literatura, durante o IX Colóquio Interna-
cional de Direito e Literatura, ocorrido em novembro de 2020.
2 Professora no curso de Direito e no Programa de Pós-Graduação em Es-
tudos de Fronteira da Universidade Federal do Amapá (UNIFAP). Dou-
tora em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Em
estágio pós-doutoral no Programa de Pós-Graduação em Ciência Política
da UFMG, sob supervisão do Prof. Leonardo Avritzer. Líder do grupo de
pesquisa UNIFAP/CNPQ Direitos Humanos, Justiça e Cidadania. E-mail:
daizefernandawagner@gmail.com.
Professor da Universidade Estadual do Amapá (UEAP). Mestre em Es-
tudos de Fronteira pela UNIFAP. Licenciado em Letras pela UNIFAP. Es-
pecialista em Metodologia do Ensino da Língua Inglesa pelo Instituto Bra-
sileiro de Pós-Graduação e Extensão. E-mail: edielson.ssilva@gmail.com.
Daize Fernanda Wagner & Edielson de Souza Silva • 7
Abstract: Literature makes it possible to think and rethink Law, en-
couraging its critical discussion. e Law and Literature Movement
points in this direction. On the one hand, Literature has the ability
to translate the spirit and values of an era and, on the other, Law is
its reection. José de Alencar’s indianist trilogy refers to an idealized
perception of the indigenous people, very characteristic of 19th cen-
tury romanticism nationalist. Based on the book Ubirajara published
in 1874, it is intended to problematize the attribution of identity to
indigenous people by non-indians. It is also intended to discuss how
this attribution has repercussions even today on the (non) recognition
and eectiveness of the right to dierence to the indigenous people.
e qualitative approach was the methodology used, based on bibli-
ographical and documentary research.
Keywords: Law and Literature Movement. Ubirajara. Ethnical Iden-
tity. Recognition. Indigenous.
1. INTRODUÇÃO
A Literatura possibilita o pensar e o repensar o Direito, fo-
mentando sua discussão crítica. Nessa direção aponta a corrente
Direito e Literatura. Tendo em consideração o perl idílico de Ubi-
rajara, personagem central da obra de mesmo nome de José de Alen-
car, que traduz uma percepção idealizada do indígena, o presente
trabalho problematiza essa atribuição de identidade aos indígenas,
que persiste ainda hoje.
(CF/88) rompeu com a política assimilacionista e integracionis-
ta dos indígenas, que era imposta pela legislação que a antecedeu,
a exemplo do Estatuto do Índio (Lei n. 6.001/1973). Esta lei esta-
va fundada na compreensão de que a cultura forja as identidades.
Em decorrência disso, os indígenas estariam fadados a deixarem de
existir enquanto tais, perdendo sua identidade pelo contato com a
sociedade não indígena. Havia a expectativa de que os indígenas se-
riam extintos em sua diversidade e se tornariam todos, simplesmen-
te, brasileiros.
de 1973, deixava isso evidente, ao estabelecer uma gradação entre os

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