Direito à convivência familiar e a proibição do tratamento asilar

AutorGustavo Pinheiro
Ocupação do AutorMestrado em Direito pela Universidade Federal do Ceará (2006). Assessor Jurídico da Presidência do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará
Páginas443-461
O direito à convivência familiar e
a proibição do tratamento asilar
Gustavo Pinheiro*
1. Introdução
Agora é expressamente constitucional. Com efeito, a Convenção Inter-
nacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência constitui tratado de
direitos humanos, incorporado ao ordenamento jurídico pátrio na forma de
emenda constitucional, nos termos do art. 5º, § 3º, da Constituição Fe-
deral1.
Isso quer dizer que a referida Convenção está hierarquicamente no mes-
mo patamar da Carta Magna, uma vez aprovada em cada Casa do Congresso
Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos mem-
bros.
O aludido documento também embasa a Lei nº 13.146, de 6 de julho de
também chamada Estatuto da Pessoa com Deficiência.
Quem lê os mencionados diplomas tem certeza de que, do ponto de
vista normativo, a pessoa com deficiência, seja ela qual for, está efetivamen-
te amparada. Entretanto, convém questionar se essas normas protetivas vão
realmente, na prática, entrar em vigor. A depender de políticas públicas,
atitudes e investimentos das esferas de poder e da participação ativa — e
colaborativa — da sociedade, aplicação da Convenção e do Estatuto ainda
são preceitos à espera de concretização.
Assim, parece adequado, de início, uma maciça divulgação das diretrizes
normativas para as pessoas com deficiência. De fato, essas normas são pou-
co conhecidas, ainda recentes, merecendo elogios todas as iniciativas que
visem divulgá-las e debatê-las.
* Mestrado em Direito pela Universidade Federal do Ceará (2006). Assessor Jurí-
dico da Presidência do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará.
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Depois de amplamente divulgados — convenção e estatuto — devem
ser aplicados cotidianamente, e isso somente será possível através da luta.
Como afirma Rudolf von Ihering: o fim que visa o direito é a paz, e o
caminho para atingi-lo é a luta, não basta, porém, perquirir sobre o fim do
direito, é necessário também conhecer o meio para alcançá-lo, e o meio é a
a luta2.
Este artigo do presente livro pretende, portanto, dentro de uma pers-
pectiva de luta e resistência3, esclarecer e pontuar aspectos dos direitos das
pessoas com deficiência “mental”, considerada esta como aquela ligada aos
transtornos mentais4.
Essa opção expressa pelas pessoas que experimentam o sofrimento psí-
quico deve-se ao nosso longo percurso de estudos sobre o tema. De fato, é
possível afirmar que tudo o que foi construído doutrinária e jurispruden-
cialmente para o portador de transtorno mental (linguagem da Lei da Refor-
ma Psiquiátrica) ou para o usuário (termo utilizado pelos Princípios para a
Proteção de Pessoas Acometidas de Transtorno Mental e a Melhoria da As-
sistência à Saúde Mental da ONU), pode e deve ser utilizado para o exame
dos direitos da “pessoa com deficiência mental”, constituindo-se todas es-
sas regras citadas verdadeiro bloco de constitucionalidade erguido em favor
de aludidas pessoas.
Destarte, a Constituição Federal, a Lei da Reforma Psiquiátrica (Lei nº
10.2016/2001), os Princípios para a Proteção de Pessoas Acometidas de
Transtorno Mental e a Melhoria da Assistência à Saúde Mental da ONU, a
Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e o
Estatuto da Pessoa com Deficiência, constituem, atualmente, uma podero-
sa fonte de direitos a ser observada pela sociedade e pelo Estado, que devem
conhecê-la e aplicá-la, transformando vigência em eficácia, para que o país
finalmente colha os frutos de uma saúde mental constitucional, aquela for-
jada no princípio da dignidade da pessoa humana e no Estado Democrático
de Direito.
2. Medos e Preconceitos
Seria hipocrisia dizer que o fenômeno do transtorno mental (agora defi-
ciência mental) é algo de fácil compreensão. Equivocaram-se aqueles que
relegaram a doença mental a um mito5, pois ela é uma firme realidade que
se deve observar com critério, para que não sobrevenham problemas maio-
res.
Por um lado, é inverídico que o deficiente mental seja sempre perigoso
e imprevisível, mas, sob outra perspectiva, é inegável que o estado psicó-
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