Regulação não cooperativa: o modelo regulatório administrativo em ambiente de crise federativa

AutorFabricio Dantas Leite
Páginas81-99
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REGULAÇÃO NÃO COOPERATIVA: O MODELO
REGULATÓRIO ADMINISTRATIVO EM
AMBIENTE DE CRISE FEDERATIVA
Fabricio Dantas Leite1
SUMÁRIO: 1. Introdução: do modelo norte-americano ao caos centralizador
brasileiro – 2. A constante tensão institucional entre regulação e políticas pú-
blicas no Estado brasileiro policêntrico – 3. A crise de identidade da regulação
no Brasil: descentralização na forma, centralização na essência. 4. Conclusões.
1. INTRODUÇÃO: DO MODELO NORTE-AMERICA-
NO AO CAOS CENTRALIZADOR BRASILEIRO
A experiência regulatória administrativa descentraliza-
da no Brasil, embora tenha apresentado um tímido desen-
volvimento na década de 19302, somente sobrelevou as bar-
1.
Doutorando em andamento em Direito Econômico e Financeiro pela Universidade
de São Paulo. Pós-Graduação lato sensu (MBP) em Petróleo e Gás na Coppe/UFRJ
(2009). Graduado em Direito pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Professor
da FGV/EBAPE, Procurador do Estado do Rio de Janeiro, Assessor Especial do Secre-
tário de Fazenda e Sócio Sênior de Vinhas e Redenschi Advogados. Membro da Ordem
dos Advogados do Brasil Seccional do Rio de Janeiro e Membro da Ordem dos Advoga-
dos do Brasil Seccional São Paulo. Representante da Fazenda junto ao Conselho de
Contribuintes do Estado do Rio de Janeiro. Membro efetivo do Instituto dos Advogados
Brasileiros e membro permanente da Comissão de Direito Financeiro e Tributário.
2. A doutrina norte-americana das public utilities, com o poder regulamentar de
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FEDERALISMO (S) EM JUÍZO
reiras teóricas do duradouro estamento jurídico-conceitual
construído em torno de um domínio do poder central, em
meados da década de 1990.
Ambos os fenômenos, tanto a centralização de poder
com conceitos jurídicos estanques e tendentes a dar suporte
ao modelo de Estado Unitário, quanto o árduo processo de
aceitação teórica do modelo de agências reguladoras, com au-
tonomia técnica e pluralidade decisória, foram, à sua manei-
ra, tradução do sistema político-econômico de cada momento
histórico e, mais precisamente, da história de formação da
própria federação brasileira.
Uma comparação entre a genealogia federativa do Esta-
do norte-americano, cujo desenvolvimento da regulação es-
tatal por agências independentes remonta ao início do século
passado, e genealogia patrimonial do Estado brasileiro, que
incentivou, efetivamente, a existência da regulação indepen-
dente somente no final do século passado, evidencia que o es-
tágio de sofisticação entre os sistemas norte-americano e bra-
sileiro sofre distância proporcional aos anos que os separam.
Enquanto nos Estados Unidos, logo após a independência
americana, a primeira reação à influência colonial inglesa foi a
aversão aos mecanismos da Coroa, em especial, ao controle rigo-
roso da economia, no Brasil, o caminho foi inverso. Mesmo após
a independência, “a antiga antinomia Metrópole-Colônia per-
sistia, com novos quadros, na nova antinomia Estado-Nação”.
3
Isto se reflete na regulação estatal. Nos Estados Unidos,
a teoria da regulação independente se estabelece, de forma
certas atividades econômicas nas mãos de entidades descentralizadas e especiali-
dades – Commissions –, muito por conta da formação dos técnicos do antigo Depar-
tamento Administrativo do Serviço Público – DASP, influenciou a chamada escola
renovadora Administração Pública brasileira, dando contornos às regras regulató-
rias que iriam povoar o sistema regulatório da época, em especial, o Código de
Águas de 1934 e, inclusive, dispositivos da própria Constituição de 1934. Para um
maior aprofundamento do tema, sugerimos, por todos: TÁCITO, Caio. “Presença
norte-americana no direito administrativo brasileiro”. Revista de Direito Adminis-
trativo. Rio de Janeiro: Fórum, Vol. 129, jul/set. 1977, pp. 21-33.
3. FAORO, Raymundo. Os donos do poder. Formação do patronato político brasileiro.
5.ed., São Paulo: Globo, 2012, p. 196.

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