O tempo da justiça na crítica do progresso de Walter Benjamin
Autor | Vinicius Lima da Silva |
Páginas | 375-393 |
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O TEMPO DA JUSTIÇA NA CRÍTICA DO PROGRESSO DE
WALTER BENJAMIN
Vinicius Lima da Silva1
Resumo: O presente trabalho tem por tema o conceito de justiça. Seu
desenvolvimento compreenderá, fundamentalmente, uma articulação da
indicação de Jacques Derrida da impossível definição da justiça; da
proposição de Walter Benjamin da estrutura religiosa do capitalismo e de
sua crítica do progresso e, por fim, do conceito de fetichismo,
desenvolvido por Karl Marx no âmbito de sua crítica da economia
política. Trata-se de apresentar uma agenda de pesquisa na qual o
conceito de justiça é abordado a partir da noção benjaminiana de tempo
de agora, cuja emergência coincide com a interrupção do tempo vazio e
automático próprio à marcha catastrófica do progresso.
Palavras-chave: Justiça; Capitalismo; Progresso; Fetichismo.
Introdução
Talvez não seja exagero dizer que Jacques Derrida, ao afirmar em
A força de lei a impossibilidade de definir o que é a justiça, resgatara-nos
de um beco sem saída. Se considerarmos que a enunciação de um juízo
sobre a justiça pressupõe a assunção de uma ordem estável específica
(RANGEL, 2013, p. 348), temos que a interrogação dessa é bloqueada
pela própria problemática atinente à natureza da justiça. Nesse sentido,
parto da premissa de que a inserção do debate sobre o conceito de justiça
no âmbito de uma investigação quanto à ordem social pode fornecer um
1 Doutorando em Teoria e Filosofia do Direito pelo PPGD-UERJ. Membro do Laboratório
de Estudos Interdisciplinares Crítica e Capitalismo (LEICC-UERJ).
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modo de abordagem capaz de não recair em uma validação a pr iori de
uma forma de sociabilidade2 como parâmetro da justeza.
Por essa razão, serão retomadas aqui as análises de Walter
Benjamin e Karl Marx sobre o capitalismo. Do primeiro a proposição
quanto à estrutura religiosa do capitalismo; sua análise da relação entre
caráter e destino; seus conceitos de violência mítica e divina, tempo de
agora e de sua crítica do progresso; do segundo, sua teoria do fetichismo,
mediada pela leitura de Isaak Rubin. Na abordagem aqui pretendida,
interessa realçar que algo encantado – um espectro estruturante não
transparente – permanece alojado no interior do processo de
secularizaçã o característico da modernidade. A noção da permanência de
uma dimensão religiosa no racional tem afinidades com a descrição
marxiana do caráter fetichista das formas sociais capitalistas. Veremos
que o capitalismo estrutura-se a partir de uma norma de valida ção social,
o valor, que ao escapar do controle consciente da sociedade a essa se
apresenta como injunções naturais, necessárias. É nessa dimensão
determinante do valor que se encontra uma chave para a compreensão do
caráter “cego” e potencialmente destrutivo do progresso capitalista.
De modo articulado, pretendo fundamentar a separação ou
diferenciação entre direito e justiça , presente tanto em Derrida quanto em
Benjamim. Em seguida, e por fim, busco delinear uma abordagem da
justiça como pur a negatividade, que se afirma como exigência de
permanente abertura à ordem social. Assim, a justiça é compreendida
como um movimento, que na vigência da sociabilidade capitalista é
orientado à inter rupção da marcha catastrófica do progresso e efetivado
como decisão ou agir histórico que, como tal, tem a forma de uma
redenção da humanida de oprimida.
2 Por exemplo, em P ara uma teoria da justiça , John Rawls deduz os princípios de justiça
e, por conseguinte, a própria noção de justiça, como momentos a priori em relação ao que
ele denomina “estrutura básica da sociedade”. Assim, estes princípios, como objetos de
um consenso original, definem os termos fundamentais da associação constitutiva da
sociedade. Trata-se, portanto, de abstrair epistemologicamente a especificidade de uma
ordem social historicamente determinada, o que ele realiza, especialmente, por meio dos
conceitos de posição origina l e véu da ignorância.
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