Acesso à Justiça e Pacificação Social: Repensando a Cláusula Constitucional da Inafastabilidade da Jurisdição nos Domínios dos Direitos Sociais Trabalhistas

AutorDouglas Alencar Rodrigues e Rogério Neiva Pinheiro
Páginas88-94
CAPÍTULO 7
Acesso à Justiça e Pacificação Social: Repensando a
Cláusula Constitucional da Inafastabilidade da Jurisdição
nos Domínios dos Direitos Sociais Trabalhistas
Douglas Alencar Rodrigues(1)
Rogério Neiva Pinheiro(2)
(1) Ministro do Tribunal Superior do Trabalho, Mestre em Direito das Relações Sociais pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC).
Especialista em Direito Constitucional pela Universidade de Brasília (UnB). Professor dos cursos de graduação e pós-graduação do Centro de
Ensino Superior de Brasília – IESB. Presidente da Academia Brasiliense de Direito do Trabalho – ABRADT. Vice-Presidente do Instituto Goiano de
Direito do Trabalho. Autor do Livro Direitos Fundamentais Socias e Efetividade – As ações Civis Públicas na Justiça do Trabalho. (LTr, 2017) e de
artigos em revistas especializadas.
(2) Juiz do Trabalho da 10ª Região. Juiz Auxiliar da Vice-Presidência do TST. Membro da Comissão Nacional de Promoção à Conciliação do Con-
selho Superior da Justiça do Trabalho. Membro do Comitê Gestor do Movimento da Conciliação do Conselho Nacional de Justiça.
(3) A regra fundamental proteção legal idêntica a todos os cidadãos – equal protection – tem origem na experiência constitucional norte-america-
na, a partir da 14ª Emenda (1868), editada com o seguinte teor: “All persons born or naturalized in the United States, and subject to the jurisdiction
thereof, are citizens of the United States and of the State wherein they reside. No State shall make or enforce any law which shall abridge the privileges or
immunities of citizens of the United States; nor shall any State deprive any person of life, liberty, or property, without due process of law; nor deny to any
person within its jurisdiction the equal protection of the laws.”
(4) O direito de acesso à justiça pode ser encarado como “requisito fundamental – o mais básico dos direitos humanos – de um sistema jurídico moderno e
igualitário, que pretenda garantir, e não apenas proclamar, os direitos de todos”. (CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à justiça. Trad. Ellen
Gracie Northfl eet. Porto Alegre: Fabris, 1988. p. 11-12).
(5) CF de 1988, “Art. 5º (...) XXXV – a Lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”.
1. INTRODUÇÃO
Com a proclamação da Declaração Universal dos Direi-
tos Humanos (DUDH), pela Assembleia Geral das Nações
Unidas, realizada na cidade de Paris em 10 de dezembro
de 1948 (Resolução n. 217 A (III) da Assembleia Geral),
a garantia de amplo acesso à Justiça passou a figurar em
praticamente todos os catálogos de direitos humanos ins-
critos nos Textos Constitucionais editados desde então.
A par de reafirmar o valor central da dignidade huma-
na (art. I), repudiando discriminações de quaisquer es-
pécies ou origens (art. II, 1 e 2), a histórica proclamação
de direitos reafirmou a noção essencial de que todos são
iguais perante a lei, todos merecedores de igual proteção
legal (art. VII)(3), inclusive com remédios efetivos perante
os tribunais para a reparação de atos que violem direitos
fundamentais (art. VIII)(4).
No Brasil, como reflexo de uma tradição cultural que
considera o Estado o estuário natural de todas as deman-
das, consolidou-se a noção de que todos os conflitos,
independentemente de sua natureza, deveriam ser resol-
vidos perante o Poder Judiciário(5). Por essa razão, o le-
gislador ordinário jamais poderia consagrar vias diversas,
ainda que mais adequadas, simplesmente concorrenciais
ou alternativas para a resolução dos conflitos, afastando a
intervenção do Poder Judiciário. O próprio insucesso na
adoção da via arbitral para as disputas coletivas, que foi
expressamente prevista na Constituição (art. 114, § 1º),
confirma que essa opção cultural tem resistido ao tempo e
às próprias transformações da ordem jurídica.
Com o advento da Carta Política de 1988, editada em
momento particularmente sensível da história institu-
cional brasileira, assistiu-se a um fenômeno singular de
explosão absurda de litigiosidade. Dados estatísticos co-
lhidos junto ao Conselho Nacional de Justiça revelam que
foram endereçadas ao Poder Judiciário, no ano de 1988,
cerca de 800 mil ações, número que atingiu, no ano de
2017, a inimaginável cifra de 29,4 milhões de novas ações.
Diferentemente da experiência de outros povos civili-
zados, em que o acesso ao Poder Judiciário encontra obs-
táculos diversos, inclusive em razão dos elevados custos
envolvidos, a explosão de demandas no Brasil é explicada
por causas múltiplas, que envolvem, entre outros fatores,
(i) a própria configuração da Constituição cidadã de 1988,
na qual foram inscritas diversas promessas fundamentais
ligadas a direitos sociais de cunho prestacional (saúde,

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