O Modelo de Justiça Multiportas no Brasil

AutorTrícia Navarro Xavier Cabral
Páginas193-198
CAPÍTULO 17
O Modelo de Justiça Multiportas no Brasil
Trícia Navarro Xavier Cabral(1)
(1) Pós-Doutoranda em Direito Processual pela USP. Doutora em Direito Processual pela UERJ. Mestre em Direito pela UFES. Juíza Estadual no
Espírito Santo. Membro da Comissão Acadêmica do FONAMEC. Membro efetivo do IBDP.
(2) ZANETI JR., Hermes; CABRAL, Trícia Navarro Xavier. Justiça multiportas: mediação, conciliação, arbitragem e outros meios de solução adequa-
da de confl itos. (Coleção grandes temas do novo CPC – v. 9). Salvador: JusPODIVM, 2017.
(3) Cf.: GRINOVER, Ada Pellegrini. Ensaio sobre a processualidade: fundamentos para uma nova teoria geral do processo. Brasília: Gazeta Jurídica,
2016. p. 18-20.
1. INTRODUÇÃO
O Brasil tem passado por interessante mudança para-
digmática no que se refere à forma de tratamento dos con-
flitos sociais. A perspectiva de se resolver as controvérsias
exclusivamente pela via do Poder Judiciário está, aos pou-
cos, cedendo espaço para agregar outras ferramentas bem
mais apropriadas.
O cenário atual se deve, primordialmente, ao empenho
do Poder Legislativo, que tem sido responsável pela cria-
ção de um verdadeiro microssistema de meios adequados
de resolução de conflitos.
Esse aparato legal deu um contorno contemporâneo ao
acesso à justiça, disponibilizando amplas formas de ingres-
sar no Poder Judiciário, e diferentes maneiras de se sair
dele, com o uso da técnica que melhor atender às particu-
laridades do conflito. Trata-se do modelo de Justiça Multi-
portas(2), que permite que os litígios sejam resolvidos por
mecanismos que não se resumem à sentença adjudicada.
Portanto, o conceito contemporâneo de jurisdição
abrange a justiça estatal, a justiça arbitral e a justiça con-
ciliativa, uma vez que todas elas constituem formas legíti-
mas de pacificação social(3).
2. A ADMINISTRAÇÃO DA JUSTIÇA
Não é de hoje que se busca a solução para a chamada
crise da justiça. Diversos ordenamentos jurídicos tentam,
ao longo dos anos, encontrar soluções viáveis para desa-
fogar o Judiciário, bem como para reduzir ou acabar com
as causas da insatisfação popular.
Custo, lentidão e complexidade dos processos judiciais
são as maiores reclamações dos jurisdicionados. E o cená-
rio do Poder Judiciário brasileiro é desanimador. Temos
hoje cerca de 76,7 milhões de processos em tramitação, e
um crescimento do estoque acumulado de 31,2% nos últi-
mos 07 anos, conforme diagnóstico formulado na edição
de 2017 do relatório Justiça em Números do Conselho
Nacional de Justiça (CNJ).
Esse número excessivo de demandas não é um fenô-
meno exclusivo do Brasil, mas aqui pode-se atribuir ao
problema algumas causas sociais, políticas e jurídicas.
A Constituição Federal de 1988 assegura, em seu
art. 5º, XXXV, o amplo acesso à justiça, permite a pos-
tulação de tutela jurisdicional, preventiva ou reparatória,
versando sobre direitos individuais ou coletivos, e ainda
prevê no inciso LXXIV do mesmo dispositivo a assistência
judiciária integral e gratuita aos que comprovarem insufi-
ciência de recursos. Esses fatores – especialmente o rela-
tivo ao custo do processo – fizeram com que os conflitos
antes reprimidos pela sociedade passassem a ser judiciali-
zados com maior frequência.
Em seguida, a Lei n. 9.099/95 trouxe grandes novida-
des aos litigantes, permitindo – nas hipóteses em que a lei
especifica – o direito de ação sem a presença de advogado,
de forma gratuita e com um procedimento mais simples.
Os Juizados Especiais tiveram o mérito de propiciar ao
cidadão uma Justiça mais informal, atraindo, assim, a ju-
dicialização das controvérsias.
Outro importante fator de facilitação do acesso à jus-
tiça foi a estruturação da Defensoria Pública, proporcio-
nando a concretização da assistência jurídica aos cidadãos
mais necessitados, tanto no âmbito extrajudicial quanto
na esfera judicial. Acresça-se a isso a elevada qualificação
dos Defensores Públicos, que vem permitindo uma defesa
de direitos de modo formal e materialmente efetivo.
No campo social, houve relevante alteração no com-
portamento de consumo do brasileiro, bem como o cresci-
mento dos conflitos de massa, cuja proteção já havia sido

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