Apresentação à 3ª edição

AutorAugusto César Leite de Carvalho
Ocupação do AutorMinistro do TST e professor universitário
Páginas17-18
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APRESENTAÇÃO À 3ª EDIÇÃO
O transporte rodoviário tem características que o fazem integrado ao nosso cotidiano e às nossas
preocupações. Às vezes, só as percebemos quando o transporte é interrompido e o alimento não
chega às mesas, a economia se retrai, também a arrecadação tributária. O trabalhador, sem o ônibus
conduzido pelo outro trabalhador, também não vai ao trabalho. Não há desenvolvimento humano
sem um sistema de transporte com pessoas e infraestrutura que se ajustem à importância desse
segmento de nossa realidade.
No âmbito interno, o de dentro das empresas, os empresários não raro se sentem projetados
nas pessoas dos motoristas que eles foram um dia e, agora, transportam fragmentos de seu
patrimônio e pessoas ou cargas que estão, força de lei, sob sua responsabilidade. Há uma relação
de cumplicidade, nessa empresa que se decompõe em pedaços itinerantes, insuscetível de ser
inteiramente contaminada por interesses estranhos ou adversos aos dos transportadores e dos
motoristas, quase sempre se irradiando como interesses das famílias respectivas.
Os itens de segurança veicular presencial ou remota, o tempo e o local ofertado pelos
embarcadores, as políticas públicas relacionadas a investimentos em frotas e rodovias, as estratégias
articuladas pelas agências de risco, todo o entorno, enf‌i m, da atividade econômica de transporte
deve conformar-se ao modo original como fora ela concebida, com preeminência do homem que, em
ambas as pontas, faz possível a movimentação de pessoas e cargas pelas ruas, avenidas, estradas e
rodovias brasileiras. A experiência revela: as incursões legislativas que abandonam esse referencial
não se legitimam e perecem. Ou hão de perecer.
O livro “Motorista Prof‌i ssional”, agora em sua terceira edição, ocupa um espaço acadêmico e de
interlocução imprescindível. A tentativa de ajustar a ordem legal à realidade diferenciada de nossas
estradas e do transporte de passageiros, sem abrir mão da tutela jurídica do trabalhador e de seus
desdobramentos na qualidade de vida assim oferecida a ele e aos usuários de nossas vias de circula-
ção rodoviária, iniciou-se com as tratativas que resultaram na Lei n. 12.619/2012.
Sobreveio, porém, em 2015, a Lei n. 13.103, sancionada sem vetos após o inusitado bloqueio das
vias que permitiam o escoamento de toda a produção nacional, sob argumento variado – inclusive
o argumento verdadeiro de os gestores das rodovias não as terem preparado para os intervalos de
jornada assegurados na lei e o falso argumento de que essas mesmas rodovias permitiriam a prática,
abolida em outras partes do mundo, de permitir a remuneração dos motoristas na proporção da
distância percorrida (ou da velocidade imprimida) e da carga transportada (não importando as
condições das vias de rodagem).
Em suas seguidas edições, este livro revela como institutos engenhosamente concebidos – como
o tempo de espera, o tempo de reserva, o controle obrigatório de jornada e os intervalos diferenciados
– foram parcial ou inteiramente desvirtuados a partir da Lei n. 13.103/2015, interrompendo-se, assim,
um processo evolutivo de avanço na regulação do trabalho rodoviário que não merecia essa curva de
claro retrocesso.
Prenunciando o que estaria por vir em outras atividades produtivas, a Lei n. 13.103/2015 rompeu
a tradição que dignif‌i ca a trajetória do movimento sindical e convidou os sindicatos a serem parceiros
em negociações coletivas que sirvam à redução ou supressão de direitos historicamente conquistados
por todos os trabalhadores – mas, assim, subtraídos dos motoristas. O incentivo a jornadas de até doze
horas, com redução ou abolição de intervalos, computando-se como descanso o tempo de manobra

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