Das questões e processos incidentes

AutorJoão Carvalho de Matos
Páginas395-467
PRÁTICA E TEORIA DO DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL 395
Capítulo XI
DAS QUESTÕES E PROCESSOS INCIDENTES
Considerações
No processo, a defesa de um acusado poderá ocorrer de várias maneiras,
enfrentando diretamente o mérito, ou socorrendo-se de defesas incidentes ou
indiretas, dependendo do caso. É importante ressaltar que a questão prejudi-
cial não deve ser confundida com a questão preliminar, por não se tratar de
direito substantivo poderá sempre ser solucionada no próprio processo. Por
outro lado, a prejudicial diz respeito ao mérito da ação – é um direito substan-
tivo e autônomo –, devendo ser resolvida geralmente em outro juízo.
Como bem leciona o prof. Hélio Tornaghi (in: Curso de Processo
Penal. v. I, São Paulo: Saraiva, 1989, p. 133):
“As questões incidentais são, portanto, controvérsias que
surgem em meio ao processo acerca de assunto estranho ao mérito,
e que são resolvidas incidentalmente, incidenter tantum, isto é, sem
que a decisão faça coisa julgada e somente para o fim de passar
adiante. Tais razões se chamam, pelas razões expostas, incidentes
ou questões incidentes.”
Questões prejudiciais
Segundo o magistério de Fernando da Costa Tourinho Filho (in:
Curso de Processo Penal anotado, vol. I., São Paulo: Saraiva, 3. ed. p. 246):
JOÃO CARVALHO DE MATOS
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“O vocábulo prejudicial é formado pelas palavras latinas prae
+ judicare, do verbo judico (as, avi, atum, are). Logo, questão
prejudicial é a que reclama uma decisão prévia. Assim exemplificando:
“Se por acaso Mévio estiver sendo processado por furto e
alegar haver proposto, na esfera civil, ação visando à declaração de
que a pretensa res furtiva era de sua propriedade, deve o juiz penal
sobrestar o andamento da ação penal para aguardar a solução a ser
dada pelo juízo cível. Ou, ainda que ele evoque o julgamento dessa
questão de natureza cível, nos termos do art. 93 ela é uma verda-
deira questão prejudicial, portanto, deve ser julgada previamente. Só
haverá o furto se a cosa for alheia. Não se furta coisa própria.”
Logo, é preciso, por primeiro, dar solução ao problema da
propriedade da coisa pretensamente subtraída, para que o juiz possa
julgar a causa penal. Isso é prejudicialidade.”
Prejudicial é uma questão que influi na existência ou não do crime.
Toda questão prejudicial é também uma questão incidental, mas nem toda
incidental é uma prejudicial; aquela é gênero do qual esta é espécie.
– Assim, as exceções, os impedimentos e o conflito de jurisdição
são incidentais, mas não prejudiciais, pois ocorreram como incidentes no
processo; não influem na existência ou não do crime.
– Já a argüição de falsidade documental, que possa influenciar ou não
na existência do crime, como a ação de anulação do casamento no cível,
constitui prejudicial no delito de bigamia.
Conforme Magalhães de Noronha, citado por Paulo Lúcio Nogueira,
“A questão prejudicial é um impedimento, um empecilho ao
desenvolvimento normal e regular do processo penal, pois, se a
finalidade do mesmo é a aplicação da lei ao caso concreto e se a
apuração deste depende da solução de uma questão jurídica, se-
gue-se que esta é um obstáculo ao exercício da ação penal.”
As questões prejudiciais suspendem o processo ou julgamento de
um crime até que seja resolvida a questão prévia. São, portanto, um
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impedimento ao desenvolvimento normal e regular do processo-crime.
Exemplo: o acusado de apropriação indébita alega, em sua defesa, que
tramita no juízo cível uma ação de prestação de contas sobre a importân-
cia de que se teria apropriado. Assim, primeiro a questão deve ser
resolvida no juízo cível, uma vez que tem influência quanto à existência
ou inexistência do crime.
Uma das características da questão prejudicial é que o fato a ser
decidido seja anterior à infração penal que deu origem ao processo-crime.
Nos crimes de concorrência desleal ou contra o privilégio de invenção
determina-se a suspensão do processo-crime até a decisão no juízo cível.
Vê-se, pois, que tais questões quando surgem deverão ser analisada à parte
dos autos principais, num procedimento outro que ficara apensado ao
processo principal.
Além dos exemplos já citados, escreve o prof. Hélio Tornaghi:
“Tício, acusado de bigamia, alega em sua defesa a nulidade de
um dos casamentos. A questão de saber se existe realmente crime
de bigamia depende da questão acerca da validez dos casamentos.
Se um deles for julgado nulo, estará prejulgada a controvérsia sobre
a bigamia. Por esta razão, a questão (civil) comumente à validez do
casamento chama-se prejudicial, e a (penal) relativa à bigamia, prejudici al.”
(Curso de Processo Penal, vol. I, p. 133. Saraiva: São Paulo, 1989).
Podemos, portanto, concluir que nas questões prejudiciais e prévias,
em processo criminal – para apurar-se a existência de um crime – há, às
vezes, necessidade de esclarecer questões estranhas ao juízo criminal, mas
que influem para a própria caracterização do delito.
Eduardo Espíndola Filho, citando Garcia Valdez, autor de Derecho
Procesal Criminal (1940), procura desfazer a freqüente confusão entre
uma e outra espécie de questão, para o que concorre bastante o fato de,
muitas vezes, as questões prejudiciais deverem ser resolvidas previamente,
isto é, antes de solucionada a questão de fundo. Enumera estes traços
característicos distintivos:

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