Dos contratos em espécie

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dos contrAtos em espécie
O legislador coloca na Teoria Geral as regras aplicáveis a todos os contratos.
Contratos em espécie são os contratos típicos (que não se confundem com contratos
nominados – o contrato de hospedagem, por exemplo, é um contrato nominado, mas não
é típico, porque não há normas legais especícas a ele destinadas).
9.1. COMPRA E VEN DA ARTS. 481 A 532 DO CC
9.1.1. Conceito
De acordo com o art. 481 do Código Civil, a compra e venda é o contrato em que o
vendedor compromete-se a transferir ao comprador a propriedade de um bem móvel ou
imóvel mediante o pagamento de certo preço em dinheiro.
Em razão de o vendedor se comprometer a transferir a propriedade, podemos armar
que a compra e venda é um contrato translativo. Isso se torna importante porque sabemos
que a forma usual de transferência da propriedade imóvel se dá com o registro do título trans-
lativo no Registro de Imóveis, e, assim, verica-se ser a compra e venda um exemplo disso.
Não podemos esquecer que o contrato de compra e venda, por si só, gera apenas direito
obrigacional, já que no Brasil a obrigação não gera ecácia real.
No sistema brasileiro, a propriedade é transferida pela tradição, no caso de bem móvel,
e pelo registro do título translativo, no caso de bem imóvel.
Só podem ser objeto de compra e venda bens corpóreos, pois os bens incorpóreos
são objeto de cessão.
9.1.2. Elementos essenciais
São elementos essenciais à compra e venda:
A) Partes: que são os sujeitos da compra e venda (comprador e vendedor). Não po-
demos esquecer que, segundo o art. 104 do Código Civil, as partes em qualquer relação
contratual devem ser capazes, ou seja, devem possuir capacidade geral e especial (que é
aquela especíca para a celebração de tal ato, e também é chamada de legitimação).
A capacidade geral refere-se às hipóteses descritas nos arts. e do Código Civil.
Já a capacidade especial, ou legitimação, pode ser exemplicada em razão da ne-
cessidade de pessoas casadas, segundo o art. 1.647 do Código Civil, necessitar de vênia
conjugal (autorização que o marido ou a esposa precisam dar ao consorte para a prática de
determinados atos) para vender bens imóveis. Porém, a vênia é dispensada se os cônjuges
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ELEMENTOS DE DIREITO CIVIL • Christiano Cassettari
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casaram-se pelo regime da separação absoluta. Cumpre lembrar, também, que o art. 1.657
do Código Civil autoriza quem casa no regime da participação nal nos aquestos a con-
vencionar no pacto antenupcial a possibilidade de celebrar contrato de compra e venda de
bens imóveis, desde que particulares.
Assim sendo, pergunta-se: o que é separação absoluta? Sabemos que o regime da
separação de bens pode ser convencional, que é aquele estabelecido pelas partes em pacto
antenupcial, ou legal, também chamado de obrigatório, que é o imposto pela lei nas hipóteses
descritas no art. 1.641 do Código Civil. Dessa forma, resta imperioso saber qual separação
é absoluta: a convencional ou a legal?
A separação convencional pode ser absoluta se no pacto antenupcial houver previsão
expressa de que nenhum bem se comunica, ou relativa, se houver alguma exceção de bens
comunicáveis.
Com relação à separação obrigatória, ou legal, a Súmula 377 do STF permite a comu-
nicação de bens adquiridos pelo esforço comum nessa modalidade de separação. Por este
motivo surge a dúvida: seria a separação obrigatória absoluta ou relativa?
Como a citada súmula possui origem no art. 259 do Código Civil de 1916, que não
encontra correspondente no atual Código Civil, a sua vigência é questionável. Para Francisco
José Cahali, a súmula foi revogada. Já para Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka, a
súmula continua vigendo.
Se a posição de que a súmula foi revogada prevalecer, teremos que a separação obriga-
tória é absoluta. Porém, se o posicionamento de que a súmula ainda está vigendo, teremos
que a separação obrigatória é relativa.
O STJ vem entendendo que a Súmula 377 do STF ainda está em vigor (que transforma
a separação obrigatória em relativa), conforme decisão proferida no Resp 1.199.790-MG
(2010/0118288-3), rel. Min. Vasco Della Giustina (convocado do TJRS), v.u., j. em 14-
12-2010.
A ausência de vênia gera a invalidade do negócio jurídico. Porém, o Código Civil
de 1916 estabelecia que na sua ausência, em qualquer hipótese, inclusive na da separação
absoluta, o negócio era nulo, mas o atual Código de 2002 determina ser o negócio anulável.
Por essa razão, pergunta-se: o que prevalece?
Como a questão da ausência de vênia está no plano da validade do negócio jurídico,
deveremos vericar quando o negócio foi celebrado, pois, com relação à validade, a lei
vigente no momento da celebração do negócio jurídico é que determina a sanção. Por esse
motivo, se o negócio sem vênia conjugal foi celebrado à época do Có digo Civil de 1916,
será nulo, e, se celebrado na vigência do Código Civil de 2002, anulável.
B) Coisa: a coisa objeto de compra e venda deve ser lícita, possível, determinada ou
determinável. Se a coisa é certa, signica que é determinada. Se incerta, é determinável,
tem existência potencial.
A coisa deve ser, ainda, alienável (estar no comércio). Como exemplo de coisa inaliená-
vel, podemos citar o bem gravado com cláusula de inalienabilidade (que pode ser quebrada
judicialmente, ou seja, é relativa), bem público (pode ser de uso comum do povo, de uso
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especial – com destinação especíca ou afetado – e dominical – sem destinação especíca ou
desafetado). Como relação aos bens dominicais, eles podem ser objeto de compra e venda,
conforme autoriza o art. 101 do Código Civil. É também exemplo de bens inalienáveis o
bem de família voluntário, aquele previsto nos arts. 1.711 e seguintes do Código Civil (o
bem de família legal, previsto na Lei n. 8.009/90, é alienável).
C) Preço: os arts. 486 e 487 do Código Civil permitem a cotação do preço em moeda
estrangeira, em ouro (cláusula ouro) ou em bolsa, se houver posterior conversão para a moeda
nacional. Em caso de contrato de exportação, permite-se xar o preço em moeda estrangeira.
Essas regras não colidem com as que se encontram nos arts. 315 e 318 do Código
Civil. Este último artigo estabelece serem nulas as convenções de pagamento em ouro ou
moeda estrangeira, pois o art. 315 determina que as dívidas em dinheiro, em decorrência
do princípio do nominalismo, devem ser pagas em moeda nacional corrente.
Com isso verica-se que o preço na compra e venda pode ser xado em ouro (cláusula
ouro) ou em moeda estrangeira, mas, na hora de realizar o pagamento, deve ser feito em
moeda corrente.
O art. 488 do citado diploma legal apresenta a solução para o caso de não haver con-
venção sobre o preço no contrato, determinando que seja adotado: tabelamento ocial;
preço habitual do vendedor e termo médio xado pelo juiz.
Tais soluções devem ser aplicadas na ordem acima descrita. O tabelamento ocial não
pode ser afastado pelo contrato, porque se trata de questão de ordem pública.
O preço não pode ser xado por apenas uma das partes. A chamada “cláusula pague
o que quiser” faz com que o contrato seja nulo, conforme o art. 489 do Código Civil.
A xação do preço, porém, pode ser deixada ao arbítrio de um terceiro de conança
das partes. É o que se chama de preço de avaliação.
D) Vontade: o contrato de compra e venda deve ser isento de vícios.
9.1.3. Natureza jurídica do contrato de compra e venda
Bilateral ou sinalagmático: estabelece direitos e deveres para ambas as partes (reci-
procidade ).
Preço: o credor é o vendedor e o devedor é o comprador.
Coisa: o credor é o comprador e o devedor é o vendedor.
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