A Efetivação das Normativas Nacionais e Internacionais de Vedação ao Trabalho das Crianças e do Trabalho Protegido aos Adolescentes Por Meio da Atuação dos Juizados Especiais da Infância e Adolescência do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região ? Campinas-SP

AutorEliana dos Santos Alves Nogueira, Gabriela Marcassa Thomaz de Aquino, João Batista Martins César
Páginas81-104
A EFETIVAÇÃO DAS NORMATIVAS NACIONAIS E INTERNACIONAIS DE VEDAÇÃO AO TRABALHO DAS CRIANÇAS | 81
A EFETIVAÇÃO DAS NORMATIVAS NACIONAIS E INTERNACIONAIS DE
VEDAÇÃO AO TRABALHO DAS CRIANÇAS E DO TRABALHO PROTEGIDO
AOS ADOLESCENTES POR MEIO DA ATUAÇÃO DOS JUIZADOS
ESPECIAIS DA INFÂNCIA E ADOLESCÊNCIA DO TRIBUNAL REGIONAL DO
TRABALHO DA 15ª REGIÃO — CAMPINAS-SP
Eliana dos Santos Alves Nogueira(1)
Gabriela Marcassa Thomaz de Aquino(2)
João Batista Martins César(3)
INTRODUÇÃO
Segundo o Plano Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil e Proteção
ao Adolescente Trabalhador (2019-2022), trabalho infantil é toda atividade econômica e/ou
atividade de sobrevivência, com ou sem fi nalidade de lucro, remunerada ou não, realizada
por crianças ou adolescentes em idade inferior a 16 anos, ressalvada a condição de aprendiz, a
partir dos 14 anos, independentemente de sua condição ocupacional.(4)
O plano ressalta ainda que toda a atividade realizada por adolescente trabalhador, que,
por sua natureza ou pelas circunstâncias em que é executada, possa prejudicar o seu desen-
volvimento físico, psicológico, social e moral, também se enquadra na defi nição de trabalho
infantil e é proibida às pessoas com idade inferior a 18 anos.
Em análise do marco simbólico-cultural do combate ao trabalho precoce, o plano mencio-
na que, até a década de 1980 a população brasileira iniciava a sua vida laboral precocemente,
(1) Juíza do Trabalho Titular da 2ª Vara do Trabalho de Franca. Coordenadora do Juizado Especial da Infância e
Adolescência de Franca/SP — JEIA. Membro do Fórum Municipal para Erradicação do Trabalho Infantil e Proteção
do Adolescente de Franca/SP. Membro do Comitê de Erradicação do Trabalho Infantil do TRT15. Gestora Regional
do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil e de Estímulo à Aprendizagem da Justiça do Trabalho (TST-CSJT).
Bacharel e Mestre em Direito do Trabalho pela Faculdade de Ciências Humanas e Sociais da Unesp — Franca/SP.
Doutora em Direito do Trabalho pela Università La Sapienza — Roma – Italia.
(2) Mestranda em Direito do Trabalho e Seguridade Social pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo
(FDUSP). Bacharel em Direito pela Faculdade de Ciências Humanas e Sociais da Universidade Estadual Paulista
(UNESP). Advogada.
(3) Desembargador do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região – Campinas, presidente do Comitê de Erra-
dicação do Trabalho Infantil do TRT-15 e gestor nacional do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil e de
Estímulo à Aprendizagem da Justiça do Trabalho (TST-CSJT), mestre em Direito pela Universidade Metodista de
Piracicaba, especialista pelo Instituto Europeu de Relações Industriais (Sevilha-Espanha) e professor na Faculdade
de Direito de Sorocaba.
(4) CONAETI. Plano Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil e Proteção ao Adolescente Trabalhador
(2019-2022). Disponível em: <https://www.mdh.gov.br/todas-as-noticias/2018/novembro/lancado-3o-plano-nacio-
nal-de-prevencao-e-erradicacao-do-trabalho-infantil/copy_of_PlanoNacionalversosite.pdf>. Acesso em: jul. 2019.
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impulsionada, sobretudo, pela pobreza. Relata que havia um consenso social de que o trabalho
era um fator positivo para as crianças e adolescentes.
Esse consenso social se refl etia, inclusive, nas legislações, visto que o próprio Estado
brasileiro via o trabalho como política pública moralizadora, que deveria ser destinada aos
menores(5) — abandonados e delinquentes —, segundo estipulado no Código de Menores, que
vigorou até a implementação do Estatuto da Criança e do Adolescente.
Com o passar dos anos, a mobilização em torno da questão do trabalho infantil garantiu
que houvesse um tratamento mais crítico do assunto, pautado, principalmente, pela nova pro-
teção, conferida às crianças e aos adolescentes, pela Constituição Federal com a doutrina da
proteção integral e prioridade absoluta, que foi, em anos posteriores, reforçada pelo Estatuto
da Criança e do Adolescente (ECA).
Apesar do avanço no tratamento desta questão, tendo o Brasil, inclusive, assumido com-
promissos internacionais de erradicação do trabalho precoce, pode-se dizer que a mentalidade
que vê no trabalho de crianças e adolescentes a solução para a criminalidade e para a pobreza
ainda continua disseminada na sociedade.
Exemplo dessa mentalidade foi a recente declaração do Presidente da República, Jair Bolso-
naro, na qual defendeu que o trabalho dignifi ca homem e mulher, independentemente da idade e
identifi cou que, na atualidade, existe muita proteção e concessão de direitos para a juventude.(6)
A declaração é grave tendo em vista que o Presidente, ao assumir o seu cargo, jurou
respeitar e cumprir a Constituição Federal, que identifi cou a criança e o adolescente como
destinatários de uma proteção tão ampla e completa, que foi denominada integral, com o dever
de prioridade sobre qualquer outra, de forma absoluta (art. 227, CF). as declarações, portanto,
vão de encontro ao documento que ele jurou cumprir e também a todo o sistema internacional
de proteção à infância e adolescência ao qual o Brasil está inserido.
Compreender, assim, toda essa sistemática legal, os números de trabalho infantil no Brasil
e no mundo, os riscos da inserção prematura no mercado de trabalho e as ações que vêm sendo
realizadas para efetivar os direitos das crianças e adolescentes é indispensável para não continuar
perpetuando a mentalidade, anterior aos anos 80, do caráter edifi cante do trabalho precoce.
1. PANORAMA DO TRABALHO INFANTIL NO BRASIL E NO MUNDO
No mundo, em 2016, de acordo com dados da Organização Internacional do Trabalho
(OIT), cerca de 152 milhões de crianças, entre 5 e 17 anos, trabalham em situação irregular,
ou seja, cerca de 11% da população infantil, sendo que, mais da metade, está envolvida com
trabalhos perigosos. (7)
O Brasil, com a adoção da bolsa-escola, em 1992, depois com a bolsa-família, em 2003,
tornou-se referência mundial de combate ao trabalho infantil. O quadro abaixo, elaborado
com base na PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios — IBGE), demonstra a
queda do número de crianças e adolescentes submetidos ao trabalho precoce:
(5) Expressão utilizada na época, pois, atualmente, os termos legais são criança ou adolescentes. “Menor”, hoje,
traz um ranço depreciativo destinado ao fi lho do pobre.
(6) FOLHA DE SÃO PAULO. Em live, Bolsonaro ignora reforma da Previdência e defende trabalho infantil. Disponível
em: <https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2019/07/em-live-bolsonaro-ignora-reforma-da-previdencia-e-defen-
de-trabalho-infantil.shtml>. Acesso em: jul. 2019.
(7) OIT. Trabalho infantil. Disponível em: <https://www.ilo.org/brasilia/temas/trabalho-infantil/lang--pt/index.
htm>. Acesso em: 8 jul. 2019.

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