Falso Testemunho ou Falsa Perícia (art. 342)

AutorFrancisco Dirceu Barros
Ocupação do AutorProcurador-Geral de Justiça
Páginas2197-2214
Tratado Doutrinário de Direito Penal
2197
Art. 342
1. Conceito do Delito de Falso Testemunho
ou Falsa Perícia Art. 342
O delito consiste no fato de o sujeito ativo fazer
a rmação falsa, ou negar ou calar a verdade como
testemunha, perito, contador, tradutor ou intérprete
em processo judicial ou administrativo, inquérito po-
licial ou em Juízo arbitral.
Reputamos sensato reproduzir os ensinamentos
de Cleber Masson:
Os núcleos do tipo são três: “fazer a rmação falsa”,
“negar a verdade” e “calar a verdade”. Fazer a rma-
ção falsa (“falsidade positiva”) consiste em mentir,
narrando à autoridade a ocorrência de fato inverídico.
Se a a rmação falsa contém em seu bojo um crime
contra a honra, ao agente serão imputados dois cri-
mes, quais sejam, falso testemunho e calúnia, difa-
mação ou injúria. Negar a verdade (“falsidade negati-
va”) é recusar-se a con rmar a veracidade de um fato
ou não reconhecê-lo como verdadeiro. Por sua vez,
na modalidade calar a verdade, também conhecida
como reticência, a testemunha ou perito permanece
em silêncio no tocante à veracidade de determinado
fato. Na modalidade “negar a verdade” a testemunha
ou perito contraria a verdade, mesmo sem efetuar
qualquer informação. No núcleo “calar a verdade”,
a testemunha ou perito recusa-se a responder às
perguntas que lhe foram endereçadas. Cuida-se de
tipo misto alternativo, crime de ação múltipla ou de
conteúdo variado: há um único crime quando a teste-
munha ou o perito pratica mais de uma conduta típica
no tocante ao mesmo objeto material. Também há um
único crime quando a testemunha ou perito faz a r-
mação falsa, nega ou cala a verdade reiteradamente,
em fases sucessivas da mesma atividade estatal de
persecução penal.6230
6230 MASSON. Cleber. Código Penal Comentado. Forense. São
Paulo: Método. 2014.
1.1. Forma Majorada
O delito será quali cado, se praticado mediante
suborno ou se cometido com o  m de obter prova
destinada a produzir efeito em processo penal, ou
em processo civil no qual for parte entidade da
Administração Pública Direta ou Indireta.
Sobre o sentido da expressão processo penal,
Nucci,6231 mudando de posição anteriormente  rmada,
leciona:
A rmávamos, anteriormente, que essa expressão
abrangeria, igualmente, o inquérito policial e o pro-
cesso judicial, pois, em ambos, estar-se-ia produzin-
do prova para valer no contexto criminal. Revemos
esse posicionamento, pois equivocado. Não está
correta, com a devida vênia, a doutrina que apregoa
estar o inquérito policial abrangido nesta  gura com
pena particularmente aumentada que, antes da Lei
nº 10.268/2001, era quali cadora – (Delmanto, Códi-
go Penal comentado, p. 620; Damásio, Código Penal
anotado, p. 971).
2. Análise Didática do Tipo Penal
Delmanto6232 a rma que três são os comporta-
mentos incriminados:
a)fazerarmaçãofalsa: trata-se de conduta comis-
siva, na qual o agente a rma inverdade;
b) negar a verdade: nesta hipótese, o sujeito ativo
nega o que sabe;
c) calar a verdade: nesta última modalidade, o
agente silencia, omite o que sabe (é a chamada
reticência).
6231 NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado. 5.
ed., São Paulo: RT, p. 1.094.
6232 Op. cit.
Capítulo 5
Falso Testemunho ou Falsa Perícia (Art. 342)
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Francisco Dirceu Barros
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Art. 342
A Lei nº 10.268, de 28 de agosto de 2001, incluiu
entre os sujeitos ativos a gura do contador. Segundo
De Plácido e Silva,6233
Na linguagem forense, diz-se contador para o
serventuário da Justiça que tem a incumbência de
fazer todas as contas dos processos, sejam referen-
tes às custas ou mesmo aquelas que se dizem arit-
méticas, e feitas para as liquidações das sentenças.
Magalhães Noronha6234 arma que tradutor é
quem verte para o idioma nacional texto de língua
estrangeira. Intérprete é a pessoa, por meio da qual,
duas outras entendem-se e comunicam-se. Ambos
são peritos também, mas a lei distinguiu-os porque,
ao contrário do experto, eles não elaboram prova.
Facilmente compreensível é que a falsidade, por eles
cometida, molesta e sacrica os interesses da admi-
nistração da Justiça tanto quanto o falso testemunho.
Quanto a questão referente à falsidade da qua-
licação do depoente, Cleber Masson defende que
a falsidade atinente à qualicação da testemunha
pode caracterizar o delito em estudo, se destina-
da a inuenciar na credibilidade a ser emprestada
às suas palavras. De fato, a exata qualicação da
testemunha é formalidade essencial deste meio de
prova, como se extrai do art. 203 do CPP, e cons-
titui-se em elemento a ser sopesado na valoração
do depoimento. Existem opiniões em contrário, no
sentido de que a falsidade envolvendo a qualicação
da testemunha não caracteriza este crime. Faz-se
o seguinte raciocínio: como a falsidade deve rela-
cionar-se a fatos, e não aos dados pessoais do de-
poente, somente pode ser reconhecido o delito de
falsa identidade (CP, art. 307). 6235
Quando a natureza da falsidade Nucci esclarece
que há duas posições:
a) falso é o que, objetivamente, não corresponde à
realidade;
b) falso é o que, subjetivamente, não corresponde
à realidade, ou seja, aquilo que não guarda sin-
tonia com o que o agente efetivamente captou e
compreendeu. Parece-nos melhor a segunda po-
6233 Vocabulário jurídico. Rio de Janeiro: Forense, v. 1, 1993,
p. 423.
6234 Op. cit.
6235 MASSON. Cleber. Código Penal Comentado. Forense. São
Paulo: Método. 2014.
sição. Anal, a verdade, para o sujeito que presta
um depoimento ou elabora um parecer, é apenas
uma representação ideológica que se desenha
na mente de alguém, que passa a acreditar na
existência de algo. Portanto, ainda que algo seja
“verdade” absoluta para alguém, pode ser, na
realidade, uma falsidade, isto é, algo contrário à
realidade. 6236
2.1. Teorias sobre a Falsidade
Duas teorias existem acerca da falsidade: a ob-
jetiva e a subjetiva.
1ª) De acordo com a teoria objetiva, existirá o falso
testemunho quando o relatado não corresponder
ao fato real.
2ª) De acordo com a teoria subjetiva, haverá falsi-
dade na contradição entre o que a testemunha
presenciou e conhece e aquilo que relatou.
Para a subjetiva, o falso será o que não corres-
ponde ao que o agente efetivamente percebeu; é a
teoria entre nós adotada por Hungria e Magalhães
Noronha.6237 Assim, pode haver o crime quando o
agente, falsamente, arma ter presenciado fato ver-
dadeiro, mas que, na verdade, não viu.
É dominante a teoria subjetiva: o falso testemu-
nho revela-se na diferença entre o que o sujeito diz
(nega ou cala) e o que sabe.6238
INDAGAÇÃO PRÁTICA
Se você entendeu bem a importância das teorias
supracitadas, responda agora esta questão elabo-
rada com base no contexto forense prático: pode
haver falso testemunho sobre fato verdadeiro?
Obs.: Se você encontrou diculdades para
responder à questão, veja o item “O FALSO
SOBRE VERDADEIRO”, nos casos criminais su-
perinteressantes.
2.2. A Retratação
O fato deixa de ser punível se, “antes da senten-
ça no processo no qual ocorreu o ilícito, o agente se
6236 Nesse sentido: Nucci, Guilherme de Souza. Código Penal
Comentado. 14ª edição, 2017, São Paulo: Forense.
6237 Comentários ao Código Penal. v. IX, 1959, p. 476, e Direito
Penal. v. IV, 1995, p. 369.
6238 Nesse sentido: RT 498:293, 510:435, 536:308, 581:311 e
522:322; RF 272:294 e 274:285; RJTJSP 26:470.
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