Entre o meu e o teu, existe o nosso?: reflexões acerca da formação de condomínio no regime da separação convencional de bens
Autor | Jamile Saraty Malveira Graim |
Ocupação do Autor | Mestra em Direito Civil pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra. Pósgraduada em Proteção de Criança pelo Centro de Família da Universidade de Coimbra. Professora de pós-graduação. Colunista em O Liberal, Diretora do IBDFAM seção Pará. Advogada, CEO do Jamille Saraty Sociedade Individual de Advogado. |
Páginas | 143-160 |
ENTRE O MEU E O TEU, EXISTE O NOSSO?:
REFLEXÕES ACERCA DA FORMAÇÃO DE
CONDOMÍNIO NO REGIME DA SEPARAÇÃO
CONVENCIONAL DE BENS
Jamile Saraty Malveira Graim
Mestra em Direito Civil pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra. Pós-
graduada em Proteção de Criança pelo Centro de Família da Universidade de Coimbra.
Professora de pós-graduação. Colunista em O Liberal, Diretora do IBDFAM seção Pará.
Advogada, CEO do Jamille Saraty Sociedade Individual de Advogado.
Sumário: 1. Introdução – 2. Casamento e seus efeitos; 2.1 Conceito de casamento e o que ele repre-
senta para sociedade; 2.1.1 Natureza jurídica do casamento e autonomia privada; 2.1.2 Regime de
bens e efeitos patrimoniais do casamento; 2.1.3 Mancomunhão, sociedade de fato e condomínio
durante o casamento – 3. O regime da separação convencional de bens; 3.1 Regime da separação
de bens versus regime da separação obrigatória de bens; 3.2 Condomínio entre cônjuges casados
sob o regime da comunhão parcial de bens – 4. O direito na prática: o que decide o Superior Tribunal
de Justiça; 4.1 Do caso concreto analisado – 5. Considerações nais – 6. Referências.
1. INTRODUÇÃO
Não existe casamento sem regime de bens e, portanto, não deveria existir noivado
sem a conversa prévia sobre patrimônio e vida financeira do casal. Infelizmente não
é o que ocorre na grande maioria das vezes. Muitos casamentos ocorrem durante o
ímpeto da paixão e os enamorados acham totalmente embaraçoso dialogar sobre o
destino de seu patrimônio ao longo do casamento.
Assim, casam-se sem entender que união a de vidas transcende ao amor e fixa-se
na amizade, companheirismo e manutenção patrimonial. Além disso, temem iniciar
uma vida separados pelo dinheiro. Acham que dinheiro é algo sujo que atrapalha o
amor. Por isso, na maioria das vezes preferem misturar as contas, os bens, as forças.
Assim, o regime da separação convencional de bens, este famigerado instituto ain-
da é prenúncio da falência de um casamento que ainda nem começou. Por isso, é
pouquíssimo adotado, sendo utilizado apenas por grandes empresários, artistas ou
qualquer outra pessoa que tenha muito patrimônio.
Ora, quem já tem patrimônio almeja protegê-lo, ou ao menos deseja negociá-
-lo de forma livre, sem a interferência do cônjuge que chegou depois. Assim, vale a
máxima “o que é meu é meu, o que é seu, é seu”. Em resumo, este regime divide a
massa patrimonial do casal em dois, o patrimônio de cada um dos cônjuges se man-
tém bipartido em linhas paralelas que nunca se encontrarão – ou pelo menos não
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deveriam se encontrar. E caso haja divórcio, inexiste discussão de partilha de bens,
facilitando processo que já é tão dolorido.
Deve-se lembrar, para que se possa entender este texto, que o regime da separação
de bens tratada aqui é a convencional, ou seja, aquela escolhida de livre e espontânea
vontade pelas partes através de pacto antenupcial, e não o regime da separação obri-
gatória, que como o próprio nome já diz, é imposto pela lei tendo em vista algumas
circunstancias. Este último, localizado no artigo 1.641 do CC possui algumas exceções
que autorizam, ou a sua alteração ou a comunhão de bens entre o casal por força da
súmula 377 do STF. Em outras palavras, o “nosso” é totalmente possível da separação
obrigatória de bens, enquanto que na separação convencional é impossível.
Mas como Direito é vida e a vida nunca foi e nem será exata, existem momentos
em que este casal, mais programado, que decidiu separar seus bens, decide consciente
ou inconscientemente misturar seu patrimônio em negócios específicos, forman-
do uma massa comum. Então, como boa comunhão de vidas que o casamento e a
união estável são, existe um momento em que esse patrimônio sem querer pode vir
a misturar. Entre “amor me empresta aqui, amor estou te pagando ali, e amor, vamos
construir algo junto pelos nossos filhos”.
Algumas dúvidas logo são suscitadas: 1. É possível a mistura de patrimônio entre
os casados pelo regime da separação de bens?; 2. Existem direitos de meação sobre
aquilo que foi construído conjuntamente?; 3. Qual a competência para julgar a divisão
dos bens? 4. É obrigatório a dissolução da sociedade de fato com o fim da relação?
As hipóteses serão analisadas a partir de uma revisão bibliográfica atualizada
sobre o tema que será confrontada com entendimento do Superior Tribunal de Justiça,
através da análise do seguinte Acórdão STJ – REsp: 1.706.812/DF 2017/0281834-5,
Relator: Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Data de Julgamento: 03.09.2019, T3 –
Terceira Turma, Data de Publicação: DJe 06.09.2019.
Objetiva-se, assim analisar a função do regime de bens na união conjugal do
Brasil, sobretudo a separação convencional de bens e como ela pode prejudicar o
cônjuge que possui menor informação e dedica-se totalmente a família, a partir da
exposição de decisões proferidas pelo Superior Tribunal de Justiça, pretendo ao final
propor-se sugestão de solução jurídica cabível.
Em relação à metodologia, o presente artigo parte de uma pesquisa predomi-
nantemente teórica, embora aspectos empíricos também tenham relevo, essencial-
mente no tocante à análise de recentes decisões judiciais dos tribunais pátrios para
a melhor compreensão do tema. A abordagem qualitativa faz-se necessária para o
aprofundamento das noções básicas, essenciais para a compreensão não apenas
do problema de pesquisa como para o resultado. De natureza aplicada, a pesquisa
almeja que casais possam aplicar no seu cotidiano e o direito possa ser efetivado, de
fato, em sua finalidade. Para isso, o procedimento para pesquisa do presente artigo
deu-se através do levantamento bibliográfico e documental para a análise da lei e da
jurisprudência pertinente, demonstrando a situação atual do tema.
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