A não aplicabilidade extensiva do regime da separação obrigatória de bens aos maiores de 70 anos na união estável

AutorFernanda Carvalho Leão Barretto e Luciana Brasileiro
Ocupação do AutorMestra em Família na Sociedade Contemporânea pela Universidade Católica do Salvador (UCSAL). Professora. Presidenta do Instituto Brasileiro de Direito de Família ? IBDFam/BA, Presidenta da Comissão de Direito e Arte do IBDFAM. Advogada. / Doutora e Mestre em direito privado pela UFPE. Professora. Pesquisadora do Grupo de Pesquisa ...
Páginas235-252
A NÃO APLICABILIDADE EXTENSIVA DO REGIME
DA SEPARAÇÃO OBRIGATÓRIA DE BENS AOS
MAIORES DE 70 ANOS NA UNIÃO ESTÁVEL
Fernanda Carvalho Leão Barretto
Mestra em Família na Sociedade Contemporânea pela Universidade Católica do
Salvador (UCSAL). Professora. Presidenta do Instituto Brasileiro de Direito de Famí-
lia – IBDFam/BA, Presidenta da Comissão de Direito e Arte do IBDFAM. Advogada.
Luciana Brasileiro
Doutora e Mestre em direito privado pela UFPE. Professora. Pesquisadora do Grupo de
Pesquisa Constitucionalização das Relações Privadas da UFPE, Conselheira cientíca
do IBDFAM/PE, Vice-Presidenta da Comissão de Direito e Arte do IBDFAM. Advogada.
“Dentro de mim, está a Outra – isto é, a pessoa que sou vista de fora – que é velha:
e essa Outra sou eu”
(Simone de Beauvoir, A Velhice)
Sumário: 1. Introdução – 2. O regime da separação obrigatória de bens e os motivos para sua existência
aos maiores de 70 anos – 3. Efeitos do regime da separação obrigatória de bens – 4. Precedentes do
Superior Tribunal de Justiça – 5. Não aplicação de regra restritiva de direito – 6. Notas conclusivas,
pela inconstitucionalidade da regra e não extensão à união estável – 7. Referências.
1. INTRODUÇÃO
O planejamento patrimonial é etapa fundamental para um relacionamento, no
franco cumprimento da manifestação de vontade das partes de viverem em comunhão
de vida, assumindo, reciprocamente, obrigações mútuas.
Tanto para o casamento, quanto para a união estável, famílias típicas previstas
expressamente na Constituição Federal, a escolha do Regime de Bens é mandatória,
uma vez que a lei prevê que no silêncio das partes aplicar-se-ão as regras do regime
da comunhão parcial de bens.
Apenas em casos expressos na lei, notadamente o art. 1.641 do Código Civil, o
regime legal será o da separação obrigatória de bens, ou ainda naquelas circunstân-
cias em que o casal, sendo casado, opta por viver em sociedade empresária, situação
que conduz a escolha de regimes específ‌icos de bens, a teor do que dispõe o art. 977
do mesmo Código.
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O regime de bens é de livre pactuação, salvo os casos suso mencionados, podendo as
partes, para além de elegerem regime diverso do legal, também utilizar regras de mais de
um regime para personalizar aquele que melhor atende às necessidades do núcleo familiar.
A ausência de diálogo sobre patrimônio é uma realidade na cultura brasileira,
que por seguir a orientação romano germânica, e ainda marcada por uma sociedade
predominantemente patriarcal, fez com que a mulher assumisse papéis na estrutura
conjugal diversos do homem. Era dele a atribuição de gerir o patrimônio familiar e
dela, a função doméstica. Então, uma interlocução para a escolha de um regime de
bens requer uma mudança cultural, que parece estar despontando em uma sociedade
que vem compreendendo a importância do diálogo e do planejamento patrimonial
na edif‌icação de uma família pautada em relações mais orgânicas.
O casamento e a união estável, apesar de terem à sua disposição os mesmos
modelos de regimes de bens, são famílias com contornos próprios, com caracterís-
ticas que afastam a lógica de que teriam necessariamente idênticos efeitos jurídicos.
Uma das regras que se aplica ao casamento, por exemplo, é aquela que impõe
o regime da separação obrigatória de bens para as pessoas que não observarem as
causas suspensivas previstas no art. 1.523 do Código Civil. Tal imposição o caminho
adotado pelo legislador para autorizar o casamento, f‌ixando, no entanto, um regime
próprio para gerir o patrimônio familiar.
O art. 1.723, § 2º do CCB também autoriza o reconhecimento da união estável,
ainda que diante de causas suspensivas, mas não traz qualquer ressalva relacionada a
patrimônio, repetindo a regra da comunhão parcial como regime legal, no art. 1.725.
Já em relação à idade núbil, a regra não se observa para a união estável, que exige
capacidade civil, não contemplando a hipótese de suprimento judicial.
Por f‌im, as pessoas maiores de 70 anos, que podem casar ou viver em união
estável, têm contra si aplicada a presunção de incapacidade para realizar a escolha
do regime de bens para o casamento, sendo-lhe imposta a separação obrigatória, o
que se revela uma regra, no mínimo, duvidosa, haja vista que a lei não impõe limite
máximo de idade para a capacidade civil.
Importante então analisar se esta regra restritiva de direitos se aplica também
à união estável, uma vez que a liberdade de formar família sofre impacto direto, na
hipótese de se concluir pela negativa da extensão da regra, já que as pessoas maiores
de 70 anos, neste caso, poderão escolher se querem ver aplicada contra si a regra que
impõe um regime de bens, ou se preferem escolher aquele que melhor lhes convém.
2. O REGIME DA SEPARAÇÃO OBRIGATÓRIA DE BENS E OS MOTIVOS PARA
SUA EXISTÊNCIA AOS MAIORES DE 70 ANOS
Conforme leciona Paulo Lobo,1 o regime da separação obrigatória de bens tem
a natureza jurídica de um ônus legal, de um gravame ou encargo imposto a determi-
1. LÔBO, Paulo. Famílias. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 298.
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