Reorganização do marco legal do setor elétrico: aspectos principiológicos das consultas públicas MME nº 32 e 33/2017

AutorMaria João C. P. Rolim e Alice de Siqueira Khouri
Ocupação do AutorResearcher do Centre for Energy/Graduada em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas)
Páginas504-538
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REORGANIZAÇ‹O DO MARCO LEGAL DO SETOR ELÉTRICO: ASPECTOS...
1. INTRODUÇÃO
Em julho de  o Ministério de Minas e Energia MME no exercício de
sua competência legal instaurou as Consultas P’blicas CP n  e n 
que tratam respectivamente dos Princípios para Reorganização do Setor
Elétrico Brasileiro e da Proposta de medidas legais que viabilizem o futuro
do setor elétrico com sustentabilidade a longo prazo
Apesar de terem intuitos especíicos e trazerem como anexos docu
mentos diferentes para subsidiar as contribuições populares as duas
consultas p’blicas surgem em um cenário comum em que se discute a
necessidade de promover ajustes no regramento do setor elétrico
A exposição de motivos das referidas consultas deixa clara a intenção
ministerial de propor alterações no arcabouço normativo regulatório e
assim reequilibrar a relação entre a intervenção estatal e o l ivre desem
penho da atividade econômica de forma a garantir esta ’ltima Ponto que
se evidencia no extrato do Relatório de Princípios disponibilizado no âmbito
da CP n 
Como a oferta de energia elétrica requer planejamento e investi
mentos intensivos e de longo prazo é preciso que os agentes sejam
estimulados a fazêlo de forma competitiva tendo como arcabouço
uma regulação transparente confiável e previsível que deina regras
e condições que viabilizem a atratividade e permitam a remuneração
desses investimentos através da formação de preços em mercado ou
de tarifação quando for o caso Uma intervenção governamental
poderá se justiicar somente quando houver reconhecida falta
de resposta do mercado na segurança energética ou na incor-
poração dos custos sociais que eventualmente não estejam sendo
percebidos ou preciicados ou por reconhecida eou comprovada
incapacidade ou desinteresse de agentes de mercado Relatório de
Princípios CP n 
Da leitura completa das informações disponibilizadas pelo MME e em
consonância com a legislação a participação nas Consultas P’blicas instau
radas pelo MME será aberta a todo e qualquer interessado segundo aviso
publicado no Diário Oicial da União DOU e na página eletrônica do MME
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Em cumprimento ao princípio da publicidade o aviso conterá o assunto
forma de recebimento e período das contribuições bem como outras infor
mações necessárias para a participação efetiva da população As contribui
ções foram recebidas dentro do período estabelecido e icarão disponíveis
no site do MME também em observância à transparência e publicidade
exigidas constitucionalmente e a análise destas contribuições encontrase
até a presente data pendente de publicação
A discussão acerca do equilíbrio entre a livre iniciativa e o grau de
intervenção estatal requerido no setor serve de pano de fundo comum às
referidas consultas p’blicas De modo mais abrangente avaliase também
a relação entre democracia  que pressupõe a participação pública inclusive
em positivados princípios constitucionais  e a chamada Constituição Econô-
mica abordada em tópico a seguir Ressaltase de partida que referida dire
triz constitucional já existente no ordenamento jurídico brasileiro inclui
princípios estratégicos que ainda que não tivessem sido especiicamente
mencionados na CP n  têm força normativa no arcabouço regu
latório que se pretende reorganizar
De modo inverso o que se coloca é que existem princípios constitu
cionais que se aplicam ao ordenamento jurídico em questão ainda que
não especiicamente elencados na CP n  que tem como o bjetivo
que a sociedade conheça e contribua com os princípios que o MME
deve utilizar no processo de aperfeiçoamento das normas sob sua
responsabilidade que estão consolidados no Relatório Princípios
para Reorganização do Setor Elétrico Brasileiro elaborado a partir
de contribuições de várias áreas do Ministério de Minas e Energia de
instituições setoriais
É importante esclarecer que o Estado que se proclame democrático  e
de Direito sobretudo  pressupõe necessariamente uma interface entre a
Administração P’blica e a sociedade civil de forma mais próxima e parti
cipativa Dentre os diversos doutrinadores que tratam da referida relação
destacamos pela sua clareza e simplicidade a clássica deinição de Bobbio
que é apresentada aos estudantes de direito logo no início do curso de
Outubro de 
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graduação segundo a qual democracia é um conjunto de regras processuais
no que diz respeito à formação das decisões coletivas prevendo e facilitando
a participação mais ampla possível dos interessados BOBB)O  p 
Assim em ambiente democrático em qualquer análise que se pretenda
discutir a relação entre a sociedade e o limite ou grau de intervenção estatal
essencial que se considere que a participação popular deve assumir papel
ativo na tomada de decisões administrativas pois é dela que emana o verda
deiro interesse p’blico que deve ser a ’nica e precípua razão do agir admi
nistrativo
Nessa linha a Constituição Federal brasileira traz princípios basilares
que têm relexo direto na legislação infraconstitucional De modo afeto à
questão que aqui se discute destacamos o comando Constitucional basilar
em que se elege a livre iniciativa como princípio fundamental de nosso
ordenamento jurídico equilibrado contudo com o controle estatal sobre o
poder econômico bem como a supremacia da propriedade privada limitada
e ponderada contudo pela exigência constitucional de sua função social
Positivados na Constituição tais princípios regem as relações entre
Estado e sociedade e devem ser reletidos nas disposições infraconstitu
cionais mantendose assim a necessária coerência entre o texto infracons
titucional e a própria Constituição
Mais adstrito à esfera econômica mas em conformidade com os prin
cípios fundamentais já mencionados como não poderia deixar de ser a
CF dedica título especíico para elencar os princípios gerais aplicáveis
às atividades econômicas Referido regramento e principiologia aplicável
às relações econômicas denominase constituição econômica Acerca
do conceito e sua importância em linha com o aqui exposto vejase por
exemplo Prosser
This is where the concept of the economic constitution becomes impor
tant both as an analytical device to provide clearer focus, and as a
source of normative principles of how regulation should seek to
achieve constitutional legitimacy Thinking in terms of an economic
constitution has one particularly valuable result that the descriptive
Título V)) da CF   artigos  a 

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