Violência Obstétrica e o Racismo Institucional

AutorGabriela Santos do Rosario Ribeiro
Páginas349-392
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VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA E O RACISMO INSTITUCIONAL
Gabriela Santos do Rosario Ribeiro
Resumo: O presente trabalho tem por objetivo fazer abordagem em
torno da violência obstétrica. Inicialmente apresenta-se um
panorama geral e análise histórica acerca dos direitos humanos
protetivos das mulheres, bem como aspectos definidores da
violência obstétrica e as condutas inadequadas praticadas por
profissionais da saúde. A desigualdade racial presente no campo da
saúde onde as mulheres negras são as maiores vítimas desse tipo de
violência. Observações foram feitas e assim se investigou o
panorama legal brasileiro no que tange a violência obstétrica e
destacando países da América do Sul que já possuem legislação
sobre o tema em vigor. Além disso apresentam-se noções gerais em
relação aos direitos previstos nos textos constitucionais e do instituto
da responsabilidade civil analisando seus elementos primordiais para
que nasça o dever de reparar. Dessa maneira foram apontadas
condutas que violam as normas e legislações vigentes relacionadas
ao direito da gestante que por sua vez podem ser reivindicadas em
esfera cível. E por fim, ressaltar a necessidade do poder público
intervir na aplicação de medidas capazes de expandir a questão da
humanização na assistência ao parto.
Palavras-chave: Direitos humanos das Mulheres. Violência
obstétrica. Violência de gênero. Racismo institucional.
Humanização do parto.
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INTRODUÇÃO
A violência obstétrica trata-se de atos violentos cometidos
fisicamente ou psicologicamente no contexto do pré-natal, parto,
puerpério e até mesmo no aborto, que cause dor, dano ou sofrimento
desnecessário, praticada sem o consentimento explícito da mulher
ou em desrespeito à sua autonomia. Atualmente o nascimento ocorre
de forma cada vez mais medicalizada, com inúmeras intervenções
cirúrgicas em que as mulheres são coagidas a aceitar ou que são
feitas sem o seu consentimento. Essas intervenções podem ser
cesarianas dispensáveis, episiotomias, corte do períneo, abuso de
medicamentos, exames de toque a todo instante. Outra maneira em
que essa violência pode ser expressa é em forma de xingamentos,
frases ditas de forma ofensiva, abusos sexuais e recusa de
atendimento, entre outras práticas que podem ser tipificadas como
violência obstétrica.
No decorrer dos anos, foi possível perceber que são práticas
comuns, mas silenciosas, que atingem cada vez mais mulheres
brasileiras. Por se tratar de uma violência velada e naturalizada,
muitas mulheres entendiam como uma espécie de cuidado o que, na
verdade, constitui um descuidado. A Organização Mundial da Saúde
alerta que o “boom” de cirurgias desnecessárias está prejudicando a
saúde das mulheres e preconiza que o melhor parto é aquele que
possui o melhor desfecho, ou seja, aquele que seja respeitoso com a
mulher e seu protagonismo e que tenha base em evidências
científicas atuais.
De acordo com o Ministério da Saúde, a violência obstétrica
atinge uma em cada quatro mulheres no país, outras pesquisas
apontam que 75% dos casos ocorrem em hospitais da rede pública
de saúde e 17% na rede privada. Vale salientar nessa observação que,
segundo estudo feito pela Fiocruz, 28,8% das mulheres assistidas
pelo Sistema Único de Saúde (SUS) são brancas enquanto 49,9% são
negras. Em relação a mortalidade materna no SUS, em 2014, foram
351
registradas 63.408 mortes. Delas, 42% eram mulheres brancas e 53%
negras, isso mostra a gravidade do quadro. Esses dados, além de
traçarem o perfil das maiores vítimas dessa violência, denunciam
uma prática institucional excludente denominada de Racismo
Institucional, em que se verifica que as mulheres negras, com
condições socioeconômicas desfavoráveis, recebem uma qualidade
de atenção diferenciada, o que gera uma desigualdade do tratamento
para os grupos socialmente mais desfavorecidos no âmbito
hospitalar.
As consequências irreparáveis deixadas pela escravidão no
Brasil, as dificuldades sociais e a imagem das mulheres negras como
mulheres fortes por sua trajetória histórica vulnerável justificam, em
grande parte, o elevado sofrimento do corpo feminino negro. Nessa
lógica, o direito à saúde e especificamente o atendimento digno no
momento do parto acaba sendo prejudicado devido à forte ideologia
de que a cidadania para esse grupo social é algo impalpável. Logo,
entender como o racismo institucional se apresenta nas maternidades
do Brasil é de elevada importância para que se responda a seguinte
questão: quais são as possíveis causas que levam as mulheres negras
a provarem de forma mais intensa os impactos da violência
obstétrica? Para tanto, será necessário estudo histórico da saúde da
mulher negra no Brasil principalmente no que toca aos partos
realizados após a escravidão.
O presente estudo vem contribuir para o enriquecimento do
debate acerca desse tipo de violência e para o conhecimento das
desigualdades que mulheres negras e periféricas passam em
maternidades e hospitais.
O caminho metodológico utilizado na pesquisa desenvolver-
se à pelo método dedutivo, por meio do qual será investigada as
causas para a prática de violência obstétrica às mulheres negras e a
quem é dada a responsabilidade por cometê-la. A pesquisa a ser
realizada neste trabalho pode ser classificada como exploratória.
Para isso, será feito um levantamento bibliográfico histórico sobre

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