Compliance em seguro e proteção do consumidor

AutorAngelica Lucia Carlini
Páginas187-206
COMPLIANCE EM SEGURO
E PROTEÇÃO DO CONSUMIDOR
Angelica Lucia Carlini
Pós-Doutorado em Direito Constitucional pela PUC do Rio Grande do Sul. Doutora em
Direito Político e Econômico. Doutora em Educação. Mestre em Direito Civil. Mestre em
História Contemporânea. Graduada em Direito. Advogada. Professora Colaboradora do
Programa de Mestrado e Doutorado em Administração da Universidade Paulista – UNIP.
Coordenadora da área de Direito em São Paulo da Escola de Negócios e Seguros – ENS.
Docente do MBA em Gestão Jurídica e Inovação da Escola de Negócios e Seguros – ENS.
Vice-Presidente do Instituto Brasileiro de Direito Contratual – IBDCONT e Membro
do Conselho Cientíco do Comitê Iberolatino-americano da Associação Internacional
de Direito de Seguro – CILA.
Sumário: 1. Introdução – 2. Fundamentos técnico e jurídicos dos contratos de seguro – 3. Compliance
e regulação da superintendência de seguros privados – 4. Compliance e proteção do consumidor
– 5. Conclusão – 6. Referências.
1. INTRODUÇÃO
A língua portuguesa é uma das mais ricas e praticadas no mundo. Estima-se que
seja a sexta mais falada em todo o planeta. Mas, no Brasil, lamentavelmente, nem
sempre ela é tratada com o respeito e carinho que merece. Prova incontestável dessa
af‌irmação é a facilidade com que termos anglo-saxões são adotados na vida empre-
sarial e mesmo nas conversas informais, quando é comum encontrarmos quem está
fazendo um job ou quem application um currículo para vaga de trabalho.
Com a palavra compliance ocorreu o mesmo. Utilizada inicialmente apenas no
ambiente empresarial acabou por se tornar a expressão mais corriqueira para def‌inir
os setores que atuam na organização e implementação de programas de integridade
ou de conformidade com a legalidade, como são def‌inidos. Várias empresas do setor
privado e público adotam a expressão integridade ou conformidade, mas, é preciso
reconhecer, mesmo que com uma nota de pesar, que a expressão compliance conti-
nua sendo a mais utilizada e, praticamente foi adotada pela língua portuguesa como
mais um anglicismo.
Compliance e suas práticas tornaram-se tema de relevância na vida empresarial
e pública em diferentes setores econômicos e administrativos a partir de episódios
graves ocorridos, como os escândalos f‌inanceiros que envolveram as empresas Enron,
WorldCom e a Tyco, no início dos anos 2000. No Brasil, episódios como das Fazen-
das Reunidas Boi Gordo, Loja Daslu e Parmalat também provocaram forte impacto
econômico e, principalmente, desnudaram a fragilidade dos sistemas de adequação
legal das empresas, evidenciando de forma inequívoca que era preciso adotar medidas
EBOOK COMPLICE RELACAO DE CONSUMO.indb 187EBOOK COMPLICE RELACAO DE CONSUMO.indb 187 14/12/2021 15:08:5614/12/2021 15:08:56
ANGELICA LUCIA CARLINI
188
mais objetivas para mensurar o quanto cada organização empresarial priorizava o
atendimento à legislação e às normas de regulação próprias de seu setor.
Os stakeholders (rendo-me aos anglicismos) exigiam maior transparência, lega-
lidade e ética por parte das empresas e entre eles estão compreendidos todos aqueles
que fazem parte do grupo de interesse que gravita em torno da organização, pessoas
ou grupos que possam ser afetados pelas práticas da empresa e, principalmente, pela
forma como ela administra seus negócios e atividade-f‌im.
Entre os principais grupos de interesse estão os investidores, empregados, pres-
tadores de serviços, fornecedores, o poder público e toda a sociedade. A vida das
empresas, sua solvência e sustentabilidade afetam um grande número de pessoas
e outras organizações, públicas e privadas, que com ela se relacionam ou, que dela
dependem para pagamento de salários e tributos.
A Constituição Federal brasileira ao atribuir valor social a iniciativa privada
no artigo 1º, inciso IV, certamente projetou entre os múltiplos componentes desse
elemento – valor social – a integridade, conformidade às normas e aos princípios
éticos porque são esses os fatores que constroem relevância social para a organização
empresarial, porque lhe outorgam credibilidade, boa reputação e perenidade.
No setor de seguros privados no Brasil e no mundo estar em compliance é uma
exigência que se avulta dado ao modelo de negócio que as seguradoras e ressegu-
radoras desenvolvem. Trabalham com a captação de recursos e dados de terceiros,
organizam fundos mutuais e os administram; e, decidem o pagamento dos valores
de indenizações a partir da análise do risco materializado que, no linguajar técnico
de seguro, é denominado como regulação de sinistro.
Organizar, administrar e utilizar recursos de terceiros para pagamento de inde-
nizações ao próprio segurado ou, a vítimas ou benef‌iciários, é atividade que exige
rigoroso cumprimento das disposições legais e das normas de regulação, por meio de
programas que implementem nas seguradoras a cultura de conformidade ou integri-
dade, que inclui aspectos sensíveis como monitoramento das práticas e implantação
de canais de denúncia para acompanhamento de eventuais desvios das normas.
Este trabalho tem por objetivo oferecer um cenário atualizado das práticas de
compliance no setor de seguros nacional com especial foco na proteção do consumidor.
Muito a propósito analisa aspectos da Resolução 382, de 2020, do Conselho Nacional
de Seguros Privados – CNSP, que dispõe sobre os princípios a serem observados nas
práticas de conduta adotadas por sociedades seguradoras, sociedades de capitaliza-
ção, entidades de previdência complementar e intermediários, no relacionamento
com clientes; e, os principais enfoques da Circular da Superintendência de Seguros
Privados – SUSEP 612, de 2020, que dispõe sobre a política, os procedimentos e os
controles internos destinados especif‌icamente à prevenção e combate aos crimes de
“lavagem” ou ocultação de bens, direitos e valores, ou aos crimes que com eles possam
relacionar-se, bem como à prevenção e coibição do f‌inanciamento do terrorismo.
EBOOK COMPLICE RELACAO DE CONSUMO.indb 188EBOOK COMPLICE RELACAO DE CONSUMO.indb 188 14/12/2021 15:08:5614/12/2021 15:08:56

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT