Compliance e proteção do consumidor na indústria de aliments: normas da anvisa

AutorSimone Magalhães
Páginas283-313
COMPLIANCE E PROTEÇÃO DO CONSUMIDOR
NA INDÚSTRIA DE ALIMENTOS:
NORMAS DA ANVISA
Simone Magalhães
Mestra em Direito Constitucional pelo Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP).
Diretora da Comissão Permanente de Acesso à Justiça do Instituto Brasileiro de Política
e Direito do Consumidor (BRASILCON). Professora, consultora e advogada especiali-
zada em Direito do Consumidor. Contato: simonemagalhaes.advocacia@gmail.com
Sumário: 1. Introdução – 2. Principais informações que devem constar na rotulagem de alimentos e
necessidade de implementação de programas de compliance consumerista como medida preventiva
e mitigadora de danos – 3. Inadequação das informações nos rótulos dos produtos alimentícios,
aumento dos índices de sobrepeso, obesidade e doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) – 4.
Crescimento da participação dos produtos alimentícios ultraprocessados no mercado e alguns
impactos da sua ingestão excessiva na saúde das pessoas – 5. Direito do consumidor à adequada
e clara informação nos rótulos dos alimentos – 6. Agência nacional de vigilância sanitária em seu
papel regulador da rotulagem nutricional de alimentos – 7. Sugestões de modelos de nova rotulagem
nutricional frontal apresentados à Anvisa; 7.1 Padrão defendido por representantes da sociedade
civil; 7.2 Padrão defendido por representantes da indústria de alimentos; 7.3 Considerações gerais às
propostas de modelos de rotulagem nutricional frontal – 8. Pontos importantes sobre as novas regras
da rotulagem nutricional dos alimentos aprovadas pela Anvisa – 9. Conclusão – 10. Referências.
1. INTRODUÇÃO
Poucas pessoas conhecem a existência de requisitos e padrões para a cons-
trução da rotulagem1 de alimentos embalados, não se dando conta de que todas as
informações que estão ali disponíveis ao consumidor partem de densos e necessá-
rios processos de regulação promovidos, principalmente, pela Agência Nacional de
Vigilância Sanitária (ANVISA)2, além de regramentos do Ministério da Agricultura,
Pecuária e Abastecimento (MAPA) que também impactam, direta ou indiretamente,
a sua constituição.
Como as informações inseridas nos rótulos dos alimentos estabelecem o prin-
cipal veículo de comunicação entre fabricante e consumidor, estes fornecedores se
1. ANVISA, RDC 259/02. 2.1. Rotulagem: É toda inscrição, legenda, imagem ou toda matéria descritiva ou
gráf‌ica, escrita, impressa, estampada, gravada, gravada em relevo ou litografada ou colada sobre a embalagem
do alimento.
2. A ANVISA foi criada pela Lei 9.782, de 26 de janeiro de 1999, cujo artigo 3º dispõe: “Fica criada a Agência
Nacional de Vigilância Sanitária – ANVISA, autarquia sob regime especial, vinculada ao Ministério da Saúde,
com sede e foro no Distrito Federal, prazo de duração indeterminado e atuação em todo território nacional.
Parágrafo único. A natureza de autarquia especial conferida à Agência é caracterizada pela independência
administrativa, estabilidade de seus dirigentes e autonomia f‌inanceira” [BRASIL. Lei 9.782, de 26 de janeiro
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deparam com uma obrigação crucial: observar estritamente as diretrizes traçadas pelo
Código de Proteção e Defesa do Consumidor (CDC)3 – em especial pelos princípios
da boa-fé objetiva4, transparência5 e informação6 – e pelos variados regramentos que
tratam especif‌icamente do assunto rotulagem de alimentos.
Verif‌ica-se a clara existência de um dever legal imputado ao fabricante, no sen-
tido de que a sua atuação deve primar pela prevenção7, com o intuito de não colocar
em risco a saúde ou a segurança8 do consumidor.
Os métodos produtivos são complexos, incidindo muitas obrigações legais sobre
fabricação e forma de disponibilização dos produtos no mercado de consumo. Caso
não sejam observadas as normas aplicáveis, ao fornecedor poderão ser imputadas
responsabilizações específ‌icas.
Por isso mesmo, edif‌icar e executar um criterioso programa de compliance que
contemple a lisura das informações na rotulagem dos alimentos é essencial para se
evitar equívocos ou omissões que causem danos aos consumidores e/ou à imagem da
própria empresa. Nesse sentido, os fornecedores que não pautarem seus procedimen-
tos na satisfação de condutas íntegras, estão sujeitos à aplicação de variadas sanções
administrativas, civis ou penais, a depender do tipo de ação ou omissão empregadas.
Ao se falar em compliance consumerista não se pode se distanciar das previsões
traçadas pela Política Nacional de Relações de Consumo que, dentre outros pontos
importantes, ressalta a vulnerabilidade9 do consumidor como um dos seus princípios
fundamentais, af‌inal, o CDC existe pela necessidade de se proteger este ser vulne-
rável, cuja condição f‌ica ainda mais acentuada quando se trata de alimentos e suas
reações no organismo humano.
Assim, no ambiente corporativo deve ser sempre estimulada e implementada
uma cultura interna de tutela da pessoa consumidora, bem como do crucial papel
do fornecedor como sujeito responsável pela fabricação de produtos alimentícios
que, além de alimentar, nutrir e satisfazer necessidades, tem também uma alta po-
tencialidade nociva quando não são f‌ielmente cumpridos padrões sanitários, de boas
práticas ou de informação ao consumidor.
Nesse sentido, considerando o Código de Defesa do Consumidor como um robusto
manual de condutas que traça as diretrizes gerais da atuação dos fornecedores, o com-
pliance consumerista se mostra como uma ferramenta altamente ef‌icaz para reduzir de
maneira signif‌icativa a possibilidade de instauração de litígios de consumo, ao mesmo
tempo em que contribui para a consolidação da credibilidade da empresa no mercado.
4. CDC, art. 4º, III.
5. CDC, art. 4º, caput.
6. CDC, art. 4º, IV.
7. CDC, art. 6º, VI.
8. CDC, art. 8º.
9. CDC, art. 4º, I.
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