O ônus da pro va no pro cesso do trabalho no contexto da lei 13.467/2017 (reforma trabalhista)

AutorJoão Humberto Cesário
Páginas103-118
O ÔNUS DA PROVA NO PROCESSO DO TRABALHO
NO CONTEXTO DA LEI13.467/2017
(REFORMA TRABALHISTA)
João Humberto Cesário
Juiz do Trabalho no TRT da 23ª Região. Doutorando em Função Social do Direito pela
Faculdade Autônoma de Direito de São Paulo. Mestre em Direito Agroambiental pela
Universidade Federal de Mato Grosso. Autor de livros jurídicos. Coordenador Acadê-
mico da Pós-graduação em Direito e Processo do Trabalho da Escola Superior da Ma-
gistratura Trabalhista de Mato Grosso nos biênios 2011 a 2013 e 2013 a 2015. Membro
do Comitê Executivo do Fórum de Assuntos Fundiários do Conselho Nacional de Justiça
de 2013 a 2014. Professor das disciplinas Teoria Geral do Processo, Direito Processual
Civil, Direito Processual do Trabalho e Direito Ambiental do Trabalho. Tem atuado ulti-
mamente como professor visitante na Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento
de Magistrados do Trabalho (ENAMAT) e nas Escolas Judiciais dos TRTs da 3ª, 5ª, 6ª,
7ª, 9ª, 14ª, 15ª, 18ª e 23ª Regiões. Endereços eletrônicos: prof.jhcesario@gmail.com
(e-mail), www.facebook.com/prof.joaohumbertocesario (Facebook), www.facebook.
com/prof.joaohumbertocesarioII (Facebook) e @joaohumbertocesario (Instagram).
Sumário: 1. Breve itinerário legislativo do ônus da prova – 2. Signicado: ônus subjetivo e ônus
objetivo – 3. Distribuição estática do ônus da prova – 4. Distribuição dinâmica: o princípio da
aptidão para a prova e a inversão do ônus probatório no Processo do Trabalho: 4.1. A alegação
da parte que a princípio responde estaticamente pelo ônus de provar deverá ser verossímil
ou ela deverá ser tida por hipossuciente; 4.2. A prova daquele que detém estaticamente o
ônus probatório deve ser de difícil produção, ao passo que a prova da parte contrária deve
ser veiculação mais simples; 4.3. Da inversão não pode resultar uma prova impossível ou
excessivamente difícil para a parte (probatio diabolica) – 5. Momento processual da reparti-
ção do ônus da prova – 6. A produção de provas no caso de inversão do encargo probatório
e o adiamento da audiência: possibilidade de harmonização dos princípios do contraditório
e da razoável duração do processo – 7. Sínteses conclusivas – 8. Referências bibliográcas.
1. BREVE ITINERÁRIO LEGISLATIVO DO ÔNUS DA PROVA
O artigo 818 da Consolidação das Leis do Trabalho, na sua redação original,
ditava que a prova das alegações incumbia à parte que as f‌izesse.
Diante da sua laconicidade, tal preceito na prática não passava de letra morta,
razão pela qual ainda ao tempo do Código de Processo Civil de 1973 os juslaboralis-
tas passaram a aplicar o artigo 333 da lei em questão no Processo do Trabalho, para
compreenderem, em síntese, que ao autor incumbia a prova do fato constitutivo do
seu direito, ao passo que ao réu se impunha comprovar a existência de fato impedi-
tivo, modif‌icativo ou extintivo do direito do autor.
O tempo passou e também o artigo 333 do CPC/1973 se tornou obsoleto, prin-
cipalmente em função das indagações jurídicas advindas da naturalização forense
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das técnicas de distribuição dinâmica do ônus da prova, razão pela qual o Código de
Processo Civil de 2015 passou a tratar da matéria de modo mais minucioso, fazen-
do-o no seu artigo 373, para deixar claro, entre outras disposições, que nos casos
previstos em lei ou diante de peculiaridades da causa relacionadas à impossibilidade
ou à excessiva dif‌iculdade de cumprir o encargo ou à maior facilidade de obtenção da
prova do fato contrário, o juiz pode atribuir o ônus da prova de modo diverso daquele
estaticamente previsto na legislação, desde que o faça por decisão fundamentada,
caso em que deverá dar à parte a oportunidade de se desincumbir do ônus que lhe
foi atribuído1.
Finalmente, rendendo-se à superioridade técnica da disposição processual civil,
a Lei 13.467/2017 modif‌icou a redação do artigo 818 da CLT, para de modo quase
idêntico ao artigo 373 do CPC/2015, ditar que:
Art. 818. O ônus da prova incumbe:
I ao reclamante, quanto ao fato constitutivo de seu direito;
II ao reclamado, quanto à existência de fato impeditivo, modicativo ou extintivo do direito do
reclamante.
§ 1º Nos casos previstos em lei ou diante de peculiaridades da causa relacionadas à impossibilidade
ou à excessiva diculdade de cumprir o encargo nos termos deste artigo ou à maior facilidade de
obtenção da prova do fato contrário, poderá o juízo atribuir o ônus da prova de modo diverso,
desde que o faça por decisão fundamentada, caso em que deverá dar à parte a oportunidade de
se desincumbir do ônus que lhe foi atribuído.
§ 2º A decisão referida no § 1º deste artigo deverá ser proferida antes da abertura da instrução e,
a requerimento da parte, implicará o adiamento da audiência e possibilitará provar os fatos por
qualquer meio em direito admitido.
§ 3º A decisão referida no § 1º deste artigo não pode gerar situação em que a desincumbência do
encargo pela parte seja impossível ou excessivamente difícil.
Percebe-se, de tudo o quanto foi dito até aqui, que a rigor a nova redação do artigo
818 da CLT não carrega consigo nenhuma grande novidade legislativa em relação
ao ônus da prova. Mesmo assim, compreendemos que a reforma trabalhista coloca
à nossa frente uma excelente oportunidade de pôr em debate uma série de questões
que ainda não estão suf‌icientemente claras sobre o assunto. É o que faremos a seguir.
2. SIGNIFICADO: ÔNUS SUBJETIVO E ÔNUS OBJETIVO
No campo jurídico, a primeira noção a se dominar no que diz respeito à pala-
vra ônus, é a do seu signif‌icado de encargo e não propriamente de dever. Assim, do
1. Importa notar, por relevante, que o Enunciado nº 37 do Fórum Permanente de Processualistas do Trabalho,
antes mesmo de a Reforma Trabalhista trazer consigo qualquer novidade sobre o tema, já dizia o seguinte: É
aplicável ao processo do trabalho a distribuição dinâmica do ônus da prova, prevista no artigo 373, § 1º, do CPC,
f‌ixada pelo juiz em decisão fundamentada, com posterior oportunidade à parte afetada de produzir a prova.

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