Algumas considerações sobre o legado de imóvel

AutorMaria Teresa Moreira Lima
Páginas411-437
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ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE O LEGADO DE
IMÓVEL
Maria Teresa Moreira Lima
Resumo: A distinção entre herança e legado compõe um estatuto
próprio para cada uma das espécies, submetendo herdeiro e legatário a
diferentes regimes jurídicos. O legado de coisa imóvel suscita
relevantes questões no que diz respeito à aquisição da posse e dos
frutos, à responsabilidade pelas obrigações propter rem e ônus reais
incidentes sobre bem e a respeito dos acréscimos ocorridos depois do
testamento. Com o propósito de rever e compor soluções, as
considerações feitas no presente trabalho destacam as peculiaridades
da aquisição do legado, da submissão dos sucessores ao passivo do
autor da herança, da incidência dos acessórios no legado de coisa certa
e examinam a extensão dos acréscimos sob a ótica do art. 1922 do CC.
Palavras-chave: Sucessão mortis causa. Herança. Legado. Legado de
imóvel.
Sumário: 1. Herança e legado. 2. Aquisição de legado de coisa certa.
3. Legado de imóvel: acessórios e particularidades. 4. A extensão das
aquisições posteriores ao testamento. 5. A (ir)responsabilidade pelas
dívidas do falecido no legado de imóvel. 6. Notas conclusivas.
Referências.
1. Herança e Legado
A sucessão mortis causa -se a título universal e a título
particular. Na sucessão universal, ou a título universal, o patrimônio
do falecido é transferido em sua unidade, ou em parte dela, levando
em consideração o complexo das relações patrimoniais, ligadas entre
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si por um vínculo unitário e independente da singularidade dos vários
elementos que as compõem. No momento em que a universalidade
deixa de ser respeitada, sendo seus elementos constitutivos destacados
e transferidos particularmente, configura-se a sucessão singular, ou a
título singular1. A herança reporta-se ao patrimônio como unidade
enquanto o legado tem por referência coisas ou direitos particulares.
No passado, enquanto o sistema era o da sucessão pessoal, ser
herdeiro significava, acima de tudo, substituir o falecido na qualidade
de chefe da família, continuar a potestade, as tradições e o culto
familiar. A respeito do direito romano, Bonfante destaca que a
sucessão universal era consequência da aquisição de uma potestade e
de um título pessoal, ou seja, da aquisição de um estado ou de um
título, que é o título de herdeiro, que vem a ser uma “vera condizione
subbiettiva ou de capacità per l´aquisito universale del patrimônio di
persona defunta”2.
Nessas circunstâncias, se deixada uma quota de patrimônio a
outrem destituído do título de herdeiro, era designado legatário. O
momento do aparecimento dos legados no direito romano é
controvertido3.
No direito moderno a qualidade de herdeiro perdeu o
significado original e a sucessão mortis causa reduziu-se a uma
questão meramente patrimonial, destinada a disciplinar a transmissão
dos bens de alguém que morreu para seus sucessores, qualificados
como herdeiros ou legatários, a depender se são convocados na
universalidade do patrimônio ou em bens determinados. Qualificação
legal, não pode ser alterada pelo de cuius.
O caráter imperativo da distinção entre herdeiro e legatário
está expresso na legislação de determinados países, por exemplo, no
1 LIMA, Maria Teresa Moreira. O usufruto do cônjuge viúvo. 1988. Tese (Habilitação à Livre
Docência) - Congregação da Faculdade de Direito, Universidade do Estado do Rio de Janeiro ,
Rio de janeiro, 1988. p. 62.
2 BONFANTE, Pietro. Instituzioni de diritto romano. 3. ed. Milão: Francesco Vallardi, 1903. p.
465.
3 Os legados são considerados instituições antiguíssima e praticadas antes de Lei da XII Tábuas
por MAYR, Roberto Von. Historia del der echo romano. Tradução para o espanhol de
Wenceslao Roces. Barcelona: Laber, 1926. p. 225.

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