Ambientes Saudáveis de Trabalho

AutorJosé Augusto Rodrigues Pinto
Ocupação do AutorDesembargador Federal do Trabalho da 5ª Região (aposentado) Professor Adjunto IV da Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia. Titular da Academia de Letras Jurídicas da Bahia e titular e presidente honorário da Academia Nacional de Direito do Trabalho.
Páginas180-186

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1. A lembrança, um bálsamo da saudade

A lembrança é, sem dúvida, o melhor bálsamo da saudade deixada pelos amigos irremediavelmente perdidos para a morte. Ela conserva uma suave sensação de presença ao nosso lado.

De amigos da estirpe de Arnaldo Süssekind não há modo melhor de conservar a sensação da presença do que lhe dedicando uma obra jurídica que perenize seu vulto de amante da Justiça e lutador do Direito em sua nobre vertente de proteção social da dignidade de quem trabalha. Por isso, acorremos com emocionada presteza à convocação, certamente justificada pela profunda amizade que nos ligou em vida, para colaborar neste livro que o homenageia pelos dois traços mais marcantes de sua personali-dade: a inteligência e o caráter.

Süssekind foi um grande e incansável construtor do Direito do Trabalho, no Brasil, sempre atento à tríade vocacional de criar, inovar e maximizar os instrumentos de engrandecimento da dignidade do homem nas três grandes áreas de relações que disciplina - individual, coletiva, internacional - as quais dominou com invulgar maestria. Isso pesou decisivamente na escolha do tema desta dissertação, devido exatamente ao denso conteúdo humanístico instigador do exercício da energia criadora, inovadora e cinzeladora da normatização jurídica do bem-estar do trabalhador. Sem dúvida, Süssekind gostaria muito de ouvir falar disso.

2. Premissas do tema

A contribuição dos ambientes saudáveis de trabalho para o êxito da empresa e a realização social do trabalhador tem sido objeto de permanente preocupação de organismos mundiais e de intelectuais da melhor cepa que se debruçam no estudo das relações humanas dentro da relação de trabalho. Sua meta comum é conceber e propor medidas para elevar a relação de trabalho a níveis de excelência que a coloquem à altura da necessidade e da conveniência de fazer do labor um predicado dos direitos fundamentais à saúde e ao bem-estar.

Essa intensa atividade já colocou um rico acervo de elaboração teórica, aplicação prática e análise de resultados à disposição de juristas, sociólogos, médicos e psicólogos, profissionais diretamente comprometidos com a natureza multidisciplinar do tema. Nele se encontram informações exaustivas de como podem os múltiplos ambientes nos quais passamos nossa vida, desde que saudáveis, permitir a alquimia de tornar realidade definitiva a utopia da sociedade perfeita.

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Por isso, não pretendo aqui inovar a matéria com vistosas proposições, pour épater le bourgeois, como dizem os franceses. Menos ainda promover um inócuo desfile de repetições do que já foi dito por outros, como fazem os papagaios. Prefiro, com a franciscana pobreza das reflexões singelas, servir-me da experiência que me deu uma longa vivência com o assunto para adiantar a conclusão de que essa alquimia já é do completo domínio humano. Sua plena realização depende somente da boa compreensão e da junção destas três premissas:

  1. "A riqueza de uma empresa depende da saúde dos trabalhadores" (Drª Maria Neira, Diretora do Deptº de Saúde Pública e Ambiente da OMS).

  2. Os gastos empresariais com a formação de ambientes saudáveis de trabalho não constituem despesa, e sim investimento.

  3. O Estado tem o dever de proporcionar por todos os meios legais e administrativos disponíveis a criação e manutenção de ambientes saudáveis de trabalho.

3. Conceito de ambiente

Ambiente é o que cerca ou envolve os seres vivos e as coisas, dizem-nos os dicionários. Como o homem é um ser vivo que não vagueia sozinho num espaço etéreo, logo se viu cercado ou envolvido pela natureza na própria origem de sua espécie. A natureza foi, portanto, o primeiro ambiente que ele conheceu. A necessidade de sobreviver, por sua vez, lhe deu as primeiras lições de como se esquivar da hostilidade desse ambiente e aproveitar-se das bondades por ele oferecidas.

Aderindo ao gregarismo, único meio de resistir às agressões de seu primitivo ambiente, achegou-se aos seus semelhantes e passou a ser cercado ou envolvido por um ambiente novo, o do convívio condicionado pela sociedade, organismo que ele mesmo criou para reger a convivência.

Inserindo na sociedade a instituição da família, um modelo de micro-organismo social de seu uso privativo, passou a ser cercado ou envolvido pelo ambiente dos seres em que se multiplicou ou que a ele se agregaram.

Precisando invocar divindades que o proteges-sem do medo instintivo do desconhecido, logo se viu cercado ou envolvido por mais um ambiente, o do misticismo e da penitência.

Por último - para não cansar com a infinitude de desdobramentos possíveis - tendo sido compelido a trabalhar para subsistir, terminou cercado ou envolvido pelo ambiente de trabalho e seu amálgama de fatores humano e material.

Em suma, exatamente no outro extremo da ideação e do desejo de gozar da liberdade pura, que o primórdio de seu pequeno mundo individual lhe sugeria, o homem é um ser cercado ou envolvido, por todos os lados, pela pressão de múltiplos ambientes que, adore ou deteste, adstringem cada passo do seu livre-arbítrio. Curvado a esse determinismo, só lhe resta uma alternativa: ou tenta ser feliz, tornando saudáveis os ambientes de que depende, ou mergulha no desvario sob a coação de suas forças descontroladas.

Eis aí, sem tirar nem pôr, o significado de "ambiente", em toda a miríade de variações possíveis. Eis também a razão da premência de adjetivá-lo com o qualificativo de "saudável" para não ser asfixiado pelo potencial de malignidade de sua essência.

4. Interação e interinfluência dos ambientes

É...

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