As novas fronteiras do inadimplemento: critérios para um exame funcional da distinção entre mora e inadimplemento absoluto

AutorGuilherme de Mello Franco Faoro
Ocupação do AutorMestre em Direito Civil pela UERJ. Membro do Conselho Assessor da Revista Brasileira de Direito Civil ? RBDCivil. Advogado
Páginas3-27
As novas fronteiras do inadimplemento:
critérios para um exame funcional da distinção
entre mora e inadimplemento absoluto
Guilherme de Mello Franco Faoro1
Sumário: Introdução; – 1. O direito das obrigações na
atualidade; – 2. Breve análise estrutural da mora do devedor; –
3. Distinção funcional entre a mora do devedor e o
inadimplemento absoluto; – 3.1. A funcionalização do direito à
resolução; 4. Investigação finalística do art. 395, parágrafo
único do Código Civil e formulação de critérios para uma
aferição objetiva da (in)utilidade da prestação; – 4.1. A
necessidade de critérios interpretativos objetivos da utilidaed;
– 4.2. Elementos objetivos e subjetivos da relação negocial; –
4.3. O grau de ofensa à economia do contrato e o
adimplemento substancial; 4.4. Alguns critérios (standards)
valorativos da utilidade; – 4.5. A legítima expectativa do credor
e outros indícios interpretativos fornecidos pela legislação
internacional; – 5. Conclusão.
Introdução
O direito das obrigações é tido como um dos ramos mais tradi-
cionais e conservadores do direito civil. A fama não é à toa: a con-
cepção estática e formalista da relação entre credor e devedor, ads-
trita e sujeita à satisfação pura e simples da prestação devida, sem
maiores considerações a uma perspectiva funcionalizada e dinâmi-
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1 Mestre em Direito Civil pela UERJ. Membro do Conselho Assessor da
Revista Brasileira de Direito Civil – RBDCivil. Advogado.
ca do adimplemento, ainda é uma realidade em diversas salas de
aula, manuais de direito civil e, o que pode ser mais grave, decisões
judiciais.
Inobstante este “ranço”, fato é que o direito obrigacional pas-
sou por mudanças substanciais nas últimas décadas, as quais foram
absorvidas pela cultura jurídica nacional, notadamente no que toca
a um de seus principais pilares, o inadimplemento. O inadimple-
mento das obrigações, como se sabe, é tema dos mais caros ao di-
reito civil, seja pela sua enorme importância prática no cenário fo-
rense e econômico, seja pelos desafios que a sua sistematização traz
ao intérprete. E é sobre os atuais contornos do inadimplemento e
as fronteiras entre seus tipos – absoluto e relativo – que o presente
artigo visa, singelamente, contribuir.
Necessário, primeiramente, tecer algumas considerações adi-
cionais sobre as transformações contemporâneas do direito obriga-
cional e fornecer uma breve análise estrutural da mora do devedor,
para situar o debate que se seguirá. Em seguida, proceder-se-á a
elaboração de uma distinção, funcionalizada à manutenção da uti-
lidade da prestação ao credor, entre a mora do devedor e o inadim-
plemento absoluto, abordando também aspectos do direito à reso-
lução contratual que daí advém. Por fim, será realizada uma inves-
tigação finalística do art. 395, parágrafo único, do Código Civil,
esboçando critérios para uma aferição objetiva da perda da utilida-
de da prestação ao credor.
1. O direito das obrigações na atualidade
Na já clássica lição de Clóvis do Couto e Silva, a relação obriga-
cional é um processo que envolve ambos os polos, lhes atribui di-
reitos e deveres recíprocos, com vistas à promoção de uma finali-
dade principal: o adimplemento.2
Nessa perspectiva funcionalizada, na qual a relação obrigacional
assume uma vocação de mecanismo satisfativo do interesse de am-
bas as partes – notadamente do credor, mas também do devedor –,
4
2 “O adimplemento atrai e polariza a obrigação. É o seu fim” (SILVA, Clóvis
do Couto e. A obrigação como processo. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2006, p.
17).

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