A teoria do inadimplemento eficiente (efficient breach theory) e o ordenamento jurídico brasileiro

AutorBernardo Salgado
Ocupação do AutorMestrando em Direito Civil pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro ? UERJ
Páginas241-265
A teoria do inadimplemento eficiente
(efficient breach theory) e o ordenamento
jurídico brasileiro
Bernardo Salgado1
Sumário: Introdução; – 1. Conceito; – 2. As críticas quanto às
premissas em que a teoria está apoiada; – 3. Interação da
efficient breach theory com o direito brasileiro; – 4. Conclusão.
Introdução
A importação de institutos jurídicos de ordenamentos estran-
geiros é tarefa delicada. Os institutos encontram sua racionalidade
no sistema em que se inserem e são forjados, em larga medida,
como produto da cultura de um determinado povo. Se já se revela
antiga a noção de que o Direito exprime, a um só tempo, a história
e a identidade de uma nação, é certo também que as peças que o
compõem têm de ser lidas sob o influxo dos valores e fundamentos
que marcam cada ordenamento.
O cuidado há de ser ainda maior quando o exame recai sobre a
viabilidade de transplantar noções características de sistemas ro-
manos-germânicos para ordenamentos de origem anglo-saxã, ou
vice-versa. A despeito da paulatina aproximação dos sistemas de
civil law e de commom law, as acentuadas diferenças impõem aná-
lise ainda mais parcimoniosa quando da tentativa de absorver insti-
tuto característico de família distinta.
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1 Mestrando em Direito Civil pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro
– UERJ. Pesquisador da Clínica de Responsabilidade Civil da UERJ. Membro do
Conselho Assessor da Revista Brasileira de Direito Civil. Advogado.
É o que começa a se passar, no Brasil, com o efficient breach, ins-
tituto de origem norte-americana que se apresenta como uma das
mais marcantes expressões da aplicação da escola da análise econô-
mica no campo do direito contratual. Traduzido pela recente litera-
tura brasileira como quebra ou inadimplemento eficiente do contrato,
o efficient breach já é há algum tempo debatido nos Estados Unidos,
e lá tem encontrado campo de aplicação jurisprudencial.
Em linhas gerais, que serão pormenorizadas nas seções seguin-
tes, a efficient breach theory arranca de valores inerentes à análise
econômica do direito para, a partir daí, sair em defesa da possibili-
dade de uma das partes inadimplir o contrato se o desfazimento do
vínculo lhe for economicamente eficiente e proveitoso, sem causar
prejuízos à contraparte. Este artigo se dedica, portanto, a analisar a
aplicabilidade do efficient no Brasil, e bem assim a medida em que
interage com regras, princípios e valores do ordenamento jurídico
brasileiro.
Para alcançar esse propósito, a apresentação estará estruturada
da seguinte forma: na primeira seção serão expostos a origem, o
conceito e as maneiras de manifestação do inadimplemento efi-
ciente; na segunda, serão elencadas as críticas que, mesmo dentro
do sistema norte-americano, têm sido endereçadas ao instituto, em
demonstração de que, no próprio sistema em que foi cunhado, não
parece haver entendimento uníssono quanto à possibilidade de
aplicação; e a terceira seção, por último, será presidida pelo propó-
sito de examinar a compatibilidade do efficient breach com regras
e princípios específicos do direito brasileiro.
1. Conceito
Pense-se na seguinte hipótese: o dono de uma pequena fábrica
de capas solares para carros celebra contrato em que vende 500
capas a uma concessionária pelo preço unitário de R$ 20,00. O
custo de produção que o vendedor suporta, por capa, é de R$
10,00, cifra que proporciona lucro total de R$ 5.000,00 na opera-
ção (500 x R$ 10,00 de lucro por cada produto).
No entanto, pouco após celebrar o contrato com a concessioná-
ria, o dono da fábrica recebe oferta de compra das mesmas 500
capas ao preço de R$ 50,00 cada, e não de R$ 20,00, totalizando R$
25.000,00 por todos os produtos.
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