Dano moral por inadimplemento contratual

AutorTayná Bastos de Souza
Ocupação do AutorMestre em Direito Civil pela UERJ. Advogada
Páginas369-389
Dano moral por inadimplemento
contratual
Tayná Bastos de Souza1
Sumário: Introdução; – 1. A rejeição do critério do “mero
aborrecimento”: a doutrina objetiva do dano moral; – 2. Os
contratos geradores de danos morais in re ipsa e a insuficiência
do conceito; – 3. A natureza jurídica do dano moral por
inadimplemento contratual; – 4. Conclusão.
Introdução
Recentemente foi noticiado que, dentre as vinte maiores cau-
sas ensejadoras de danos morais no Brasil, encontram-se a recusa
do plano de saúde à cobertura de tratamento médico hospitalar, o
corte de energia elétrica e a prática de overbooking.2
Se, no passado, o reconhecimento de danos extrapatrimoniais
oriundos de vínculos contratuais parecia inadmissível,3 atualmente
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1 Mestre em Direito Civil pela UERJ. Advogada.
2 Disponível em: https://oglobo.globo.com/economia/danos-morais-confira-
as-20-causas-que-mais-geram-indenizacoes-no-pais-22431064. Acesso em:
14.05.2018.
3 Segundo Gisela Sampaio da Cruz Guedes: “Tradicionalmente, no Direito
Brasileiro, a jurisprudência assente no STJ sempre foi no sentido de que o ina-
dimplemento contratual não dava ensejo ao “dano moral” (leia-se: dano extrapa-
trimonial). Esta era também a posição da doutrina clássica: o inadimplemento
não gera “dano moral”, porque não agride a dignidade humana, sendo antes ape-
nas um aborrecimento normal, do dia a dia, com o qual o credor deve saber
conviver porque faz parte das relações humanas”. (GUEDES, Gisela Sampaio da
Cruz. Os desafios do dano extrapatrimonial no direito brasileiro. In: MORAES,
Carlos Eduardo Guerra de; RIBEIRO, Ricardo Lodi (Coord.); MONTEIRO FI-
a procedência destas demandas tornou-se corrente, a ponto de se-
rem reputadas como as maiores percussoras da chamada “indústria
do dano moral”.
Se a existência de tal indústria é, até certo ponto, discutível,4
fato é que a doutrina tem caminhado no sentido de reconhecer a
existência de lesões extrapatrimoniais decorrentes de infrações
contratuais. No entanto, o que se observa é que a análise destes
casos tem se baseado, na maioria das vezes, em um raciocínio biná-
rio de regra-exceção.5
Não são poucas as decisões que destacam que, a princípio, o
descumprimento do dever contratual não teria o condão de ensejar
danos extrapatrimoniais, configurando-se mero aborrecimento da
parte, evidenciando, assim, a relevância dos sentimentos pessoais
da vítima na aferição do dano moral.6
Por outro lado, é usual o reconhecimento do dano moral decor-
rente de relações envolvendo partes que não possuem a consciên-
cia necessária a experimentar o sentimento de frustração ou abor-
recimento, como é o caso dos nascituros e das pessoas jurídicas.7
Além disso, é frequente a alusão a hipóteses de infrações con-
tratuais ensejadoras de danos morais “in re ipsa”, isto é, situações
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LHO, Carlos Edison do Rego; GUEDES, Gisela Sampaio da Cruz; MEIRELES,
Rose Melo Vencelau (Org.). Direito civil. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 2015,
p. 246).
4 Conforme esclarece Anderson Schreiber: “Apesar disso, não há dúvida de
que ações judiciais infundadas são propostas e m núm ero cada vez maio r, às vez es
por razões puramente mercenárias. Mesmo que tal número não seja nem de
longe suficiente para autorizar a invocação alarmante de uma ‘indústria do dano
moral’, isso não torna descabida a preocupação em evitar um aumento de deman-
das indenizatórias frívolas, baseadas em aborrecimentos e inconvenientes coti-
dianos”. (SCHREIBER, Anderson. Reparação não pecuniária dos danos. Direito
Civil e Constituição. 1 ed. São Paulo: Atlas, 2013, p. 210).
5 MONTEIRO FILHO, Carlos Edison do Rego. Responsabilidade contratual
e extracontratual: contrastes e convergências no direito civil contemporâneo. 1
ed., Rio de Janeiro: Processo, 2016, p. 152.
6 GUEDES, Gisela Sampaio da Cruz. Os desafios do dano extrapatrimonial
no direito brasileiro, cit., p. 228.
7 OLIVA, Milena Donato. Dano Moral e Inadimplemento Contratual nas Re-
lações de Consumo. Revista de Direito do Consumidor, vol. 93, maio 2014, p.
15.

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